17 de outubro de 2014

Falta chuva e ainda sobra preconceito

Por Darci Bergmann



     A seca prolongada no Sudeste do Brasil revela um cenário desolador. Rios, açudes e poços secando, onde antes havia fartura de água. As plantações  e as florestas desidratadas agora são um combustível para os incêndios que aumentam ainda mais o teor de gás carbônico na atmosfera. Se nos campos é assim, nas vilas e cidades a tragédia climática muda o cotidiano das pessoas. Agora é possível perceber o quanto dependemos da natureza em equilíbrio e o quanto precisamos evitar os desperdícios de recursos naturais. Estávamos acostumados a abrir as torneiras e vermos água jorrando muito além do necessário para o banho diário. Ou lavando calçadas e carros com centenas ou milhares de litros esbanjados numa dessas operações. Nunca nos perguntamos de onde vem a nossa água.   Talvez a maioria pensa que ela vem das represas. Não, ela vem de muito longe. Vem lá da fazenda ou do pequeno sítio, onde tem vertente e dali se forma um córrego. Depois, outros córregos vão se juntando e formam os rios. As represas apenas são depósitos de água. E até o solo armazena água e a devolve para nosso uso através dos poços de captação. As cidades dependem dos campos e das florestas. Desde o alimento até o líquido mais precioso – a água.
     E a nossa crise de água tem a ver com preconceito? Tem sim. Aqui no Brasil, fomos ensinados a ver os sertões e as matas como sinônimos de atraso.  Nas periferias das cidades ou lá nos rincões ermos, qualquer reserva de mato é vista como área improdutiva e sujeita a invasões. Córregos e riachos urbanos são logo degradados com lixo e as suas margens ocupadas por habitações. Temos preconceito contra as matas ciliares, que protegem as encostas e as margens dos rios. As cidades se expandem e sempre mais pessoas aparecem para ocupar espaços verdes em prejuízo dos mananciais de água. Para alguns, a espécie humana tem preferência sobre as demais. Esta ideologia de crescimento populacional sem limites pode ser o colapso da civilização. As mudanças climáticas já dão sinais claros da fragilidade humana. Até um minúsculo vírus, como o ebola, faz tremer de medo o mais valente dos seres humanos. Nosso preconceito em relação à Mata Atlântica ajudou a destruí-la na maior parte e o que dela resta agora é alvo de queimadas criminosas ou não. E mesmo nas romarias, pedindo chuvas aos nossos santos, alguns incautos lançam rojões que iniciam incêndios na vegetação esturricada das proximidades.
    A crise de água já é uma realidade planetária. O momento é de profunda reflexão sobre o nosso estilo de vida e a busca de soluções deve nortear todas as pessoas, sejam elas autoridades ou não. Cada um deve fazer a sua parte. É inaceitável que candidatos a cargos públicos se aproveitem das mazelas climáticas e busquem culpados porque as chuvas não caem. A nossa civilização precisa ser repensada. Até porque falta chuva e ainda sobra preconceito.


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