7 de maio de 2011

Arroz e a concentração de terras na Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul

Por Darci Bergmann

Lavoura de arroz: Foto Darci Bergmann


A safra de arroz 2010//2011 no Rio Grande do Sul foi recorde. No entanto os produtores reclamam que os preços do produto não cobrem os custos de produção. Os silos guardam produto de safras anteriores e isto faz com que os beneficiadores forcem a baixa no preço pago aos produtores.
É a lei da oferta e da procura.  
A situação atual reflete um problema recorrente. O setor produtivo do arroz conseguiu ganhos em produtividade e também aumentou a área plantada. O consumo de arroz não aumentou nessa  proporção.
A maior produção por hectare é sempre um objetivo de quem produz. Isto deve se dar de forma equilibrada no que se refere ao binômio custo/benefício. A tecnologia atualmente disponível permite esses ganhos em produtividade. Esse fator deveria ser levado em conta para definir a área plantada com arroz. Observou-se um acréscimo de área na maioria dos municípios produtores e aí está a matemática do preço baixo.

Redução de área já foi proposta em outros tempos.
 Jovani Streck, que já foi presidente da Associação dos Arrozeiros de São Borja, chegou a propor em certa ocasião a redução da área de plantio como forma de conseguir melhores preços  no arroz. Estava certo. Mas nenhum produtor quer reduzir a área de plantio, pois sempre tem a expectativa de que na próxima safra os preços podem reagir. Essa ânsia por ganhos incertos só tende a piorar as coisas. Para os produtores e para o meio ambiente. Para os primeiros porque preços aviltados reduzem a margem de lucro e nessa condição trabalham apenas para sustentar a cadeia de insumos e aumentar a renda dos beneficiadores de arroz, os donos de engenho.
Para o meio ambiente as coisas também pioram. Tem produtor que teima em plantar até nas áreas de proteção permanente, bem próximo das barrancas dos rios. Algo inútil, porque se destrói sem nenhum lucro. A degradação ambiental já tem  cobrado preços altos dos produtores devido às enchentes. Sem contar que na lavoura de arroz ainda se usam agrotóxicos que já deveriam estar na lista dos proibidos, há muito tempo – caso do Clomazone - mais conhecido por Gamit.

Expansão do latifúndio
Os preços baixos do arroz aumentam os lucros dos beneficiadores. Alguns donos de engenho estão se tornando grandes proprietários de terra em São Borja e região. E há uma razão elementar para isso. O excesso de oferta de arroz faz o preço baixar ao produtor, mas pouca diferença se nota nas prateleiras dos supermercados. Na cadeia produtiva do arroz quem leva a melhor é quem beneficia o produto. Em alguns casos ainda, os engenhos aliam o fornecimento de insumos – adubos, sementes e agrotóxicos – e assim o produtor fica dependente de quem lhe financia. Preços baixos, lucro zero e contas para pagar tem  sido causa de perda de patrimônio. Muitos proprietários tiveram que vender parte de suas terras por conta dessa dependência. Em outras palavras: perdem terra de plantio. Não por causa do Código Florestal como alegam alguns.

Os fazendeiros tradicionais de São Borja estão em vias de extinção
Agora, os grandes proprietários de terras não são mais os tradicionais estancieiros.  A cada ano, novas empresas do agronegócio aqui se estabelecem e adquirem terras de quem um dia já foi produtor. Não lhes cabe culpa por isso. Até porque apenas aplicam melhor os ensinamentos da lei de oferta e procura, o que a maioria dos produtores ainda não pratica.
Está aí algo para ser pensado. Como explicar que as mazelas do campo se devem às leis ambientais? O discurso de que ambientalistas e produtores rurais tem  posições antagônicas não é sustentável. Na verdade, os ambientalistas até querem o melhor para os produtores, quando pretendem assegurar as condições de sobrevivência de toda a sociedade. Um solo preservado e produtivo, a proteção dos mananciais de água e preços justos a quem produz alimentos e matérias primas indispensáveis é o que os ambientalistas mais querem. Mas dentro do chamado agronegócio  brasileiro nem todos pensam assim. Parte desse setor quer - e está  conseguindo - concentrar  ainda mais as terras nas mãos de poucos, às custas justamente de quem também é produtor. Estranhamente, proprietários de terras, vítimas da falta de uma política agrícola mais coerente, relutam em manter as áreas de preservação permanente e de reserva legal. Muitos deles já perderam terras para os atravessadores do agronegócio - estes sim os grandes beneficiários da ”modernização” do Código Florestal.   
O que foi dito em relação ao arroz, também pode ser o caso de outras culturas em outras regiões do País. A expansão da monocultura de cana-de-açúcar tem suscitado preocupações em muitos municípios. Poucas empresas transformam totalmente o cenário de produção, extinguindo até a produção de alimentos tradicionais e expulsando o agricultor tradicional para os centros urbanos.
Não seria o caso de uma ampla discussão do modelo de agricultura vigente, antes de reformar o Código Florestal? Talvez um dia se chegue ao bom senso.
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Mais sobre o tema:
Orientação é para que arrozeiros reduzam área de lavoura

 Objetivo é diminuir a oferta na época de comercialização e evitar prejuízos diversos
           As lideranças do movimento dos arrozeiros em São Borja estão orientando os colegas a reduzirem área quando do plantio da próxima lavoura, a partir de setembro. Entre os objetivos, estão a menor oferta do produto no momento da colheita, com vistas a um melhor preço; evitar aquelas áreas com arrendamento mais caro (embora isso deva ocorrer ao natural); entre outros. De acordo com Jovani Streck, um dos líderes do movimento dos orizicultores, a grande maioria tem se mostrado receptível à idéia, até porque, segundo observa, 95% dos produtores estão descapitalizados e, em decorrência disso, já não terão recursos para plantio de área maior.
            No entanto, segundo Jovani Streck, terão maior resultado aqueles produtores que efetuarem de forma consciente a redução da área, uma vez que vão poder cuidar melhor da lavoura, não irão ultrapassar a capacidade de irrigação, e além disso, terão produtividade e qualidade maiores. Jovani observa que devido ao fato de a grande maioria estar sem recursos, devido ao endividamento, a tecnologia na próxima lavoura será muito pouca, e que por si só a idéia de redução já é uma vantagem. A coordenação do movimento orizícola tem se mostrada preocupada com o futuro de boa parte dos produtores, uma vez que, embora todas as mobilizações realizadas, as reivindicações não têm sido atendidas.
            De acordo com Jovani Streck, é grande o desânimo junto à maioria dos orizicultores, devido ao fato das dificuldades porque passa a classe no momento e também porque não se tem perspectiva de melhora  em curto prazo.
            Jovani observa que em anos anteriores todos pensavam de forma positiva, na esperança de serem atendidos pleitos como preços, recursos, etc. Agora, a situação é diferente e muitos talvez até não consigam recursos para plantar, uma vez que foram alijados das linhas oficiais de crédito e boa parte já não dispõe de crédito junto a fornecedores, por não ter dinheiro. A situação é grave e deve ser fator predominante para que a lavoura de arroz seja reduzida em pelo menos 8 mil hectares a menor do que a última, quando foram plantados cerca de 35mil hectares no município.
 FONTE: Folha de São Borja – 26/07/2000 
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Safra de arroz 2000/2001 
A redução de área é inevitável


*Jovani Streck
*Produtor rural e dirigente
Do Sindicato Rural
            Para a próxima safra, é consenso de que haverá redução da área de arroz. Primeiro por que o produtor está consciente de que esse é o caminho para que a lucratividade da lavoura arrozeira retorne. Se persistir a mesma área, certamente a oferta será maior que a demanda e, conseqüentemente, os preços serão menores. Além disso, o arrozeiro sabe que dentro de uma área, sempre existem aquelas que são deficitárias por diversos fatores com infestações de arroz vermelho, muitas vezes, fazendo plantio de parte da área fora de época e com problemas na irrigação.
            É preciso que o produtor cada vez mais tenha em mente que o que regula os preços é a velha lei da oferta e da procura e dessa maneira, procure reduzir gradativamente a área cultivada com arroz. Se cada produtor plantar área de 20 a 30 % menor, com certeza, obterá maior rendimento, com menos custo e com lucro, por que a produção global será menor, logo a procura puxará os preços a patamares mais compensadores, o que, sem dúvida, tornaria, em parte, a atividade orizícola viável.
            Outro fator que ganha espaços no momento atual da orizicultura é a opção pela diversificação da propriedade, obedecendo ao zoneamento agroclimático, para ocupar as áreas livres pelo arroz. É necessário ter outros produtos para preencher as lacunas do arroz durante a entressafra e quando o produto estiver com preços aviltados. Caso contrário, o produtor estará sem capital no primeiro caso para tocar a atividade ou terá que vender com prejuízo, no segundo para atender compromissos.
            Os subsídios governamentais também são fundamentais para a recuperação do setor, a exemplo da Comunidade Européia, Estados Unidos e países do próprio Mercosul, do qual o Brasil faz parte. É preciso que os governos estadual e federal percebam que as lavouras irrigadas do sul devem ser incentivadas, pois são as únicas lavouras seguras, capazes de manter uma média histórica de 4.500.000 a 5.500.000 de toneladas de arroz por safra, sendo que somente o RS supre 85% do arroz irrigado consumido no país.
            Contudo, enquanto persistir a entrada livre de arroz do Mercosul no Brasil, sem quotas e sem preços iguais ao custo da produção interna, em plena colheita do arroz gaúcho, a orizicultura não terá futuro. A concorrência desleal do produto vindo de países do Mercosul é comprovadamente danosa para o produtor nacional que não consegue competir com todos esses obstáculos e, ainda, com os subsídios na origem e, muitas vezes, com arroz oriundo de terceiros países, como foi comprovado pela presença de fungos existentes somente em países asiáticos, encontrados em lotes exportados pela Argentina nesse ano.
            Além da redução de área gradativa e dos incentivos governamentais, torna-se urgente encontrar mecanismos para escoar os estoques que se encontram em armazéns oficiais por conta de compras no mercado de opções, seja através de exportações ou de doação para os mais de 30.000.000 de brasileiros que passam fome em todos os cantos do País.
                  O setor, principalmente na Fronteira Oeste, continua mobilizado em torno desses pontos  e trabalhando para vencer outros como o problema do endividamento e o sucateamento do maquinário. E concluímos que mesmo diante de tantos empecilhos o produtor, ainda, continua plantando porque tem essa vocação no sangue e tem orgulho de produzir alimentos, gerando tributos e empregos para a nação.
              Por isso, senhores governantes, pensem melhor e façam algo para salvar o setor produtivo, enquanto ainda temos coragem de continuar na atividade.

Fonte: Folha de São Borja, Pág. 2 , edição de 18/11/200

           






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