Aroeira-anacauita (Schinus molle) |
Depois de uma longa estiagem ocorreu uma chuva na quinta-feira. No outro dia, sexta-feira santa, fomos fazer uma caminhada para reflexão sobre a vida e a relação dos seres humanos com a natureza. Desde manhã, nas primeiras horas do dia, em um ritual que se repete a cada ano, muitas pessoas da cidade entram em contato com natureza. Pois nesse dia, na tradição cristã, colher marcela é garantir um abençoado chá medicinal que é usado ao longo do ano até a próxima colheita.
É salutar a saída ao campo, no entanto, nem todas as pessoas, em suas ações, percebem que a relação do humano com a natureza também é algo sagrado. Algumas delas, movidas pela crença da colheita da marcela, na sexta-feira santa, deixam lixo industrializado no ambiente natural, o que não deixa de ser uma contradição.Mas também existem os bons exemplos.
Este grupo, liderado pelo patriarca Mika, anualmente realiza a colheita da marcela de forma harmônica e respeitosa ao ambiente natural |
O sagrado também implica em reconhecer a natureza como obra divina. Qualquer ser, por mais insignificante que pareça, é a expressão da força criadora. E por isso merece respeito.
Relatos das reflexões dos participantes do passeio:
Jarbas:
Passar a tarde de hoje no Sítio Itaperaju, em meio à natureza, foi bom. A experiência de estar entre outras formas de ser, sentir o cheiro das plantas, o frescor do ar, o silêncio rompido apenas pelo canto dos pássaros ou pelo barulho da vegetação ao caminhar é sempre algo único, subjetivo. Mas é na simplicidade, ou em momentos que parecem simples, que somos convidados a perceber, com o exercício de nossa sensação, a razão de ser, do sentido e da beleza da vida. Diria mais, são momentos como esses que nos deixam em contato com o divino. Estar entre a natureza, no dia de hoje, foi oportuno para encontrar o equilíbrio do eu, do espírito e o corpo.
Capim-limão e caraguatá |
Como interiorano, sempre faço comparações. A vivência do dia de hoje, ou quando estou, por exemplo, no centro de Porto Alegre, entre aquele amontoado de pessoas, indo e vindo, na corrida do dia a dia. Vejo expressões de preocupação na face e no olhar e, muitas vezes, de infelicidade. Tudo para garantir a sobrevivência. E então me pergunto, há outra forma de organização de sociedade?
Ana Luisa:
Esta ida ao campo foi muito interessante porque exploramos lugares e vimos animais diferentes.
Gralha-picaça (Cyanocorax chrysops) |
Melissa:
Eu gostei de andar pelo meio da capoeira, das vassouras, das barbas-de-bode, dos espinilhos esparsos perto do brejal, porque me lembro da minha infância, quando sentávamos pra fazer piquenique no gramado e tomar banho de açude. Até considero essas áreas mais bonitas do que as próprias florestas, pois não é preciso grandes árvores pra perceber a diversidade de plantas e animais que existem nesses locais.
Ambiente rústico, este 'chircal' tem várias plantas nativas aromáticas e de interesse apícola. |
Darci:
Poço de balde com apenas dois metros de profundidade. Apesar das chuvas escassas, conservou água fresca e cristalina, resultado da arborização ciliar e recuperação de um pequeno brejal. |
A minha reflexão focou-se mais na questão da água. Esta última estiagem marcou-me profundamente. E a chuva de ontem foi uma verdadeira bênção, a ser observada nesta sexta-feira-santa. É desalentador ver a estiagem castigando os campos, as lavouras e as árvores perdendo as folhas. Os riscos de queimadas aumentam e parece não existirem alternativas de permanência no campo. Mas, quando chove, o cenário muda completamente e o ânimo se renova. É nesse momento de reflexão que nós humanos precisamos tomar consciência de que a natureza precisa ser entendida e não hostilizada com mais destruição. Essa reverência aos ambientes naturais é uma forma de gratidão ao Princípio Criador que faz uma ligação entre o sagrado e a sustentabilidade. Lá no meio do brejal silencioso, entre aromas e o adejar de borboletas, encontro mais um motivo de gratidão a Deus quando sacio a sede com a água pura que brota das entranhas da terra.
Mensagem final. O ser humano tem um enorme potencial de realizações. Apesar de todas as crises ele é capaz de se reeducar e dar um novo sentido à sua relação com a natureza, à qual ele pertence.
Sempre há uma luz. Sempre há uma esperança.
Fotos: Darci Bergmann, realizadas em 06/04/2012; Sítio Itaperaju/São Borja/RS
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