A mesma árvore em foto de 21-02-2013, com floração reduzida. Dois anos antes foram suprimidos ramos volumosos nas proximidades do prédio ao lado. |
Por Darci Bergmann
Alguém seria capaz de comprar uma árvore em terreno que não
lhe pertence só para preservá-la?
Pois foi o que ocorreu comigo. Voltemos um pouco no tempo. Em
fins da década de 1970, algumas árvores centenárias da cidade de São Borja
foram derrubadas e transformadas em tábuas e lenha. Eram árvores nativas e um
dos motivos alegados era o conflito com a rede elétrica de alta tensão. Pessoas
ávidas por madeira e lucro fácil escolhiam árvores frondosas localizadas
próximas às redes elétricas. Alguns proprietários, temerosos de sofrerem
penalizações em casos de acidentes, vendiam tais árvores. A lei municipal ainda
não estabelecia restrições de corte em terrenos particulares e a necessidade de
laudos técnicos para comprovação de riscos à segurança pública.
Um dos compradores e cortadores de árvores urbanas escolheu
mal a sua última presa. A árvore que seria derrubada é uma canafístula, nome
botânico Peltophorum dubium. O
argumento utilizado pelo arboricida
era o fato de que, por debaixo da enorme copada, cruzava a rede elétrica.
Aquela árvore frondosa, rente ao passeio público, num terreno ao lado daquele
que eu alugava, era a preferida para as rodas de mate, devido à boa sombra nos dias quentes de verão. Quando
chegava dezembro, iniciava a intensa floração amarela que se estendia até março
ou abril. Um espetáculo deslumbrante da natureza. Sem que eu soubesse, a senhora idosa e
proprietária do terreno vendeu a canafístula. Mais tarde, alegou-me que tomara
tal decisão por medo de ser multada pela concessionária de energia elétrica,
alertada que fora pelo comprador da árvore.
O dia era da árvore, não do cortador.
Era por volta das duas da tarde. Saí com minhas tralhas de topografia, ainda no tempo do teodolito, da trena e das balizas, para demarcação de uma área de campo. A poucos quilômetros da cidade, deparei-me com a falta de alguns equipamentos e dei volta. Ao retornar à minha empresa, percebi algo estranho na canafístula do terreno ao lado. Uma escada junto ao tronco, serra, um machado, cordas e, lá no alto da copa, um sujeito cortando galhos grossos com serrote de mão. Indagado sobre o que fazia, respondeu-me que comprara a árvore e iria derrubá-la. Primeiro tiraria os galhos e depois derrubaria o tronco. Argumentei que a operação era de risco e que ele descesse da árvore, com o que ele não concordou. Disse-lhe que eu iria acionar a Brigada Militar. O sujeito, enfurecido, desceu da árvore, deu de mão no machado e, ameaçando agressão, aos berros disse que ninguém o impediria de cortar o que era seu. Diante da agressão iminente, muni-me das balizas de ferro e não arredei pé, esperando o agressor. Em volta, dezenas de pessoas acompanhavam o desenrolar dos fatos, temendo uma peleia. Acuado e vendo que eu não demonstrara medo, o cortador de árvores propôs um acordo. Queria me vender a canafístula ao dobro do que pagou, alegando prejuízos e serviços de terceiros já acertados. Diante do impasse criado e até porque eu tinha pressa, aceitei a proposta. Comprei a árvore com recibo passado, perdido numa dessas caixas de badulaques. Assumi perante a senhora proprietária do terreno a responsabilidade por eventuais situações de risco.
Era por volta das duas da tarde. Saí com minhas tralhas de topografia, ainda no tempo do teodolito, da trena e das balizas, para demarcação de uma área de campo. A poucos quilômetros da cidade, deparei-me com a falta de alguns equipamentos e dei volta. Ao retornar à minha empresa, percebi algo estranho na canafístula do terreno ao lado. Uma escada junto ao tronco, serra, um machado, cordas e, lá no alto da copa, um sujeito cortando galhos grossos com serrote de mão. Indagado sobre o que fazia, respondeu-me que comprara a árvore e iria derrubá-la. Primeiro tiraria os galhos e depois derrubaria o tronco. Argumentei que a operação era de risco e que ele descesse da árvore, com o que ele não concordou. Disse-lhe que eu iria acionar a Brigada Militar. O sujeito, enfurecido, desceu da árvore, deu de mão no machado e, ameaçando agressão, aos berros disse que ninguém o impediria de cortar o que era seu. Diante da agressão iminente, muni-me das balizas de ferro e não arredei pé, esperando o agressor. Em volta, dezenas de pessoas acompanhavam o desenrolar dos fatos, temendo uma peleia. Acuado e vendo que eu não demonstrara medo, o cortador de árvores propôs um acordo. Queria me vender a canafístula ao dobro do que pagou, alegando prejuízos e serviços de terceiros já acertados. Diante do impasse criado e até porque eu tinha pressa, aceitei a proposta. Comprei a árvore com recibo passado, perdido numa dessas caixas de badulaques. Assumi perante a senhora proprietária do terreno a responsabilidade por eventuais situações de risco.
Mais tarde, na condição de vereador, a canafístula e outras
cinco árvores de grande porte, foram declaradas imunes de corte.
O episódio acima circulou de
boca em boca e afastou por um bom tempo os cortadores de árvores urbanas.
Conhecedor do fato, José Celso Aquino Marques*, em 26 de março
de 2009, assim se expressou:
“Décadas de atuação de Darci Bergmann na defesa do interesse público são
a prova mais cabal e veemente dos elevadíssimos princípios éticos que norteiam
a sua conduta. Um fato pitoresco ocorrido lá por 1980 é uma pequena amostra
desse desprendimento. Darci Bergmann alugava um terreno nas esquinas das ruas
Aparício Mariense com a Gal. Canabarro, em São Borja. Num terreno ao lado,
localiza-se uma árvore centenária da espécie canafístula. A proprietária do
terreno vendeu a árvore para determinada pessoa que a transformaria em madeira
de construção. Quando o comprador se preparava para derrubar tal árvore, Darci
vinha chegando ao local e interferiu para que ela não fosse derrubada. Foi
ameaçado de agressão, mas diante de inúmeras pessoas que estavam à volta, o
comprador desistiu e propos ao Darci que lhe comprasse então tal árvore para
livrá-lo do prejuízo. Darci Bergmann então, com anuência da proprietária que
lhe passou um recibo, comprou uma árvore em propriedade alheia para que fosse
preservada. Hoje ela está declarada imune de corte por lei municipal elaborada
pelo próprio Darci Bergmann quando foi vereador”
* José Celso Aquino Marques, professor aposentado da UFRGS, ex-presidente da AGAPAN
Um comentário:
Ótima atitude!
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