O jornal a Folha Regional, edição de 06/11/2009, pág. 05, divulgou matéria sobre novas derivas do herbicida Gamit, princípio ativo Clomazone, em área urbana de São Borja, RS. Desta vez alguém aplicou o produto com pulverizador costal em um terreno e a deriva atingiu hortaliças nas áreas contíguas. O herbicida Clomazone é muito volátil e não há condição segura para aplicação. Prova disso é que os cinamomos (Melia azedarach), na Av. Leonel de Moura Brizola, estão com intensa clorose, na verdade albinismo, tal o branqueamento das folhas nessa época em que deveriam estar com o verde intenso para realização da fotossíntese. Os cinamomos foram atingidos pela deriva de Gamit aplicado por avião agrícola a mais de quatro mil metros de distância.
DEPOIMENTO DE UM PILOTO AGRÍCOLA
Um piloto me fez a seguinte revelação sobre o Gamit: depois de aplicar o herbicida numa lavoura de arroz em Itaqui, RS, colocou o macacão utilizado no vôo numa sacola e a entregou a uma senhora para que lavasse a peça de roupa. Dias depois, a pessoa encarregada de lavar o macacão comunicou ao piloto que as plantas no pátio da sua casa e folhagens no interior desta estavam com sintomas de branqueamento. A água da lavagem não fora usada para irrigar as plantas. A conclusão é óbvia e mostra que o herbicida Clomazone é extremamente volátil. Um produto assim pode continuar com registro para ser comercializado e utilizado?
O QUE DIZ A FMC, REGISTRANTE DO GAMIT
Neste ano de 2009, funcionários da FMC Química do Brasil Ltda visitaram a ASPAN, em São Borja,RS. Queriam esclarecer fatos ligados ao Gamit e o seu princípio ativo Clomazone. Isso porque houve mobilização da entidade e da minha pessoa em função das muitas ocorrências de deriva ligadas a esse produto. O Clomazone é o único herbicida que provoca clorose albina nas folhas, branqueamento que depois se torna um amarelo pálido e por fim a necrose. Mas os técnicos da empresa alegaram que estava havendo mau uso do produto e que as derivas também seriam causadas por outros herbicidas. Sim, outros herbicidas também causam derivas, se usados em condições desfavoráveis. Conheço os dois lados do balcão, porque já trabalhei com glifosato e outros produtos e inclusive com aviação agrícola no início dos anos 1980. Depois , em 1983, surgiram as normas técnicas da aviação agrícola, do Ministério da Agricultura, através da Portaria SNAD 009/1983 e do seu anexo. Em várias ocasiões não permiti que os herbicidas fossem aplicados, quase sempre devido às condições de velocidade e sentido do vento, às vezes devido à baixa umidade relativa do ar. Os pilotos das empresas recebem comissão sobre os serviços e nessas ocasiões ficavam contrariados. Outras vezes, as condições meteorológicas eram favoráveis para aplicação aérea e os trabalhos eram então iniciados. Mas na época da primavera, quando as pulverizações em arroz irrigado são mais frequentes, às condições do tempo mudam de uma hora para outra e o serviço deve então ser paralizado. Mas quantos o fazem. Pilotos e integrantes da equipe de terra, e às vezes o produtor, pressionam para que não haja paralização. Nessas condições acontece deriva com qualquer agrotóxico aplicado via aérea.
No caso do Gamit não há condição segura nem para aplicação terrestre nem por aviação agrícola. Esta é a questão. Por mais que as condições estejam favoráveis, o Clomazone provoca deriva. De nada adianta usar aditivo, mudar ângulo dos bicos ou aumentar o tamanho da gota. A simples revoada de uma aeronave com o sistema de pulverização fechado provova sintomas de branqueamento nas plantas mais sensíveis.
UM FATO INTRIGANTE
Certa vez um produtor apresentou-me um pulverizador costal que necessitava de reparos. O aparelho teria sido lavado e segundo o dono fora utilizado o herbicida Gamit dias antes. Como não havia peças daquela marca de aparelho, o produtor pediu para deixá-lo no meu local de trabalho pois teria que ir ao banco. Era um dia de intenso calor.O pulverizador ficou intacto por algumas horas ao lado de uma parede até que o dono o recolhesse. Coisa de dois ou tres dias depois, num raio de uns tres metros, as plantas rasteiras de diversas espécies, apresentaram sintomas de albinismo. Lembrei-me então de que ali próximo havia ficado o tal de pulverizador costal que sequer fora aberto. Contei tal episódio aos representantes da FMC. Como resposta, foi dito por um deles de que reconhecem que o Gamit é volátil. A recomendação é que as viaturas que transportam o produto, especialmente as embalagens, após as aplicações não circulem em áreas que tenham viveiros, hortas, pomares, entre outros. Que dizer então das aeronaves que circulam por esses rincões afora pulverizando clomazone que se desloca a grandes distâncias e atinge todo ambiente. Nem as cidades ficam imunes. Aliás, Clomazone e outros pesticidas são inalados, nos chegam pela água e como resíduos nos alimentos. Doses pequenas, mas que se repetem no dia e no decorrer dos anos. Nas plantas da região, os bioindicadores já dão o alarme. Os cinamomos estão morrendo. Chega a primavera, as brotações aparecem para a fotossíntese que deveria suprir as reservas das árvores caducifolias. O ar pestilento das aplicações maciças de herbicidas vai minando a clorofila e a planta definha e morre alguns anos depois. Esqueletos arbóreos aparecem por toda a região da fronteira oeste do rio Grande do Sul. Mas agora também as árvores nativas, como a imponente canafístula (Pelthophorum dubium), a timbaúva (Enterolobium contortisiliquun), entre outras, agonizam e seus esqueletos erguem os esquálidos ramos desnudos. Nesse mes de Novembro de 2009, por toda a região o branqueamento das árvores se repete. É um testemunho mudo de que a biota está agonizante. Árvores mortas não falam. Mas são um testemunho eloquente de que algo está errado. Afinal, técnicos do IBAMA e de outras instituiçoes oficiais andam por essas bandas e poderiam constatar o tremendo impacto do Clomazone sobre a nossa flora. A sintomatologia é inequívoca. Alegar mau uso por parte dos produtores é tapar o sol com peneira. Produtos com essas características de volatilidade devem ter o registro suspenso. Até porque se inibe a fotossíntese, pela destruição dos mecanismos de proteção da clorofila, o Clomazone pode ter implicações a longo prazo sobre as espécies animais também. Já existem registros de que tende a se acumular no fígado dos mamíferos.
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