24 de maio de 2010

ALARME POR INSETICIDAS ASSASSINOS DE ABELHAS



Por Julio Godoy*

A França autorizou o uso, até 31 de maio, das reservas de produtos químicos suspeitos de aniquilar apiários. Há preocupação em outros países europeus.

PARIS., (Tierramérica).- “Gaúcho”, um inseticida de ampla aplicação da empresa química alemã Bayer, foi proibido na França em 1999, por representar intoxicação para abelhas e outros seres vivos, incluindo os humanos, mas seu substituto, o “Regent”, da também alemã Basf, é igualmente perigoso, segundo apicultores e biólogos. O produto da Bayer era usado sobretudo na plantação de girassol e milho, e aplicado diretamente nas sementes, de modo que se incorporasse em toda a planta, desde a raiz até flores e grãos. Após meses de análises e batalhas legais, o Ministério da Agricultura francês determinou, em 1999, que o imidaclopride, principal componente químico do Gaúcho, era altamente tóxico e que um breve contato com plantas tratadas por esse inseticida resultava mortal para abelhas e outros insetos benignos.

Segundo a União Nacional de Apicultores Franceses, o Gaúcho causou o desaparecimento de centenas de milhares de abelhas, espécie que tem uma função ambiental vital através da polinização, bem como a bancarrota de milhares de pequenos produtores de mel. O inseticida da Bayer foi substituído pelo da Basf, mas não é por isso que os apicultores do sudoeste francês deixaram de constatar a morte de até 40% de suas abelhas.

Em meados de fevereiro, um juiz dessa região decidiu iniciar um processo contra a Basf e a Bayer pela “venda de produtos químicos altamente tóxicos para uso agrícola”. Além do Regent, outros cinco inseticidas baseados na substância “fipronil” estão no banco dos réus. Esse processo judicial obrigou o ministro da Agricultura, Hervé Gaymard, a agir. No dia 23 de fevereiro proibiu o uso do Regent, mas autorizou os produtores de milho e girassol a usarem suas reservas dos inseticidas suspeitos até 31 de maio.

Jean-Marc Bonmatin, especialista em abelhas do Centro Francês de Pesquisa Social e Científica, confirmou ao Terramérica ter descoberto fipronil em pólen de girassol na razão de 0,1 microgramas por quilo. “A título experimental, alimentamos abelhas com pólen contaminado com uma taxa similar de fipronil, e em poucos dias pudemos detectar o tipo de envenenamento denunciado pelos apicultores”, explicou. O biólogo Gerard Arnold, do mesmo Centro, garantiu ao Terramérica que o fipronil e o imidaclopride são perigosos para os seres humanos, aos quais chegam porque “se armazenam e concentram no leite, nas matérias gordurosas e nos vegetais”.

No dia 26 de fevereiro, camponeses defensores da agricultura orgânica ocuparam os escritórios do Ministério da Agricultura em protesto por essa decisão, e ali descobriram documentos, até então mantidos em segredo, que confirmam a elevada toxidade do Regent. Esses documentos incluem relatórios médicos da Mutual Social Agrícola, um seguro de saúde, sobre 182 casos de pessoas intoxicadas após terem contato com o Regent e outros inseticidas. Os relatórios mencionam complicações cardíacas e respiratórias, enfermidades da vista e da pele, disfunções digestivas e desmaios.

Os camponeses também descobriram um relatório do departamento jurídico do Ministério, detalhando as alternativas disponíveis para o governo na questão dos inseticidas. Segundo esse documento, o fim imediato do uso do Regent custaria cerca de US$ 360 milhões e a permissão de uso das reservas “teria conseqüências financeiras comparativamente mais baixas”. José Bové, líder dos camponeses defensores da agricultura orgânica e um dos ocupantes do Ministério, disse que “o governo baseou sua decisão exclusivamente em considerações financeiras e não em sanitárias e de segurança pública”.

Basf e Bayer alegam que o fipronil é usado em mais de 70 países sem conseqüências nocivas para a saúde animal ou humana. A Bayer, inclusive, iniciou um processo por difamação contra o apicultor Henri Clement por descrever o Gaúcho como um “assassino de abelhas”. Entretanto, nos Estados Unidos, o Estado da Flórida, a sudeste, aconselha a não usar o fipronil na proximidade de apiários; os criadores de caranguejos de Louisiana, ao sul, observaram, entre 1999 e 2002, a mortalidade elevada desses crustáceos depois que plantações de arroz da região foram tratadas com essa substância; e, no Estado de Nova York, a nordeste, estão proibidos os pulverizadores de fipronil contra parasitas de animais domésticos.

Na Europa, durante um encontro de agricultores, em abril de 2002, participantes belgas, suíços e espanhóis pediram a proibição de inseticidas com base no fipronil e no imidaclopride, e o diretor do Centro Belga de Informação sobre Apicultura, Etienne Bruneau, afirmou: “no ritmo atual, em dez anos não haverá mais abelhas na Bélgica”. A União Européia prevê definir em 2005 sua “Diretiva sobre Preparados Perigosos”, uma lista de produtos tóxicos a serem proibidos. A França é responsável pelo relatório sobre o fipronil e pediu a peritagem de uma Comissão de Estudo da Toxidade de Produtos Fitosanitários, cuja conclusão, no dia 29 de janeiro, foi de que “o fripronil não deveria ser autorizado, em vistas das enormes preocupações que provoca em relação ao meio ambiente e às espécies selvagens.

http://www.tierramerica.net.

* O autor é correspondente da IPS

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