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16 de setembro de 2012

A natureza sabe o que faz (3)

Por Darci Bergmann




   O tempo e a observação cuidadosa podem nos ensinar muito.

   Estamos imersos num mar de preocupações e de cobranças impostas pela civilização tecnológica. Nesse contexto nem sempre aprendemos as lições que a natureza nos transmite. Quase sempre queremos resultados rápidos. Quantos são os que plantam florestas nativas e recuperam áreas degradadas? Um percentual pequeno talvez. O nosso imediatismo nos leva a consumir ràpidamente o que a natureza levou um bom tempo para construir. Os produtos das florestas, por exemplo. Precisamos de madeira, lenha, fibras, matéria-prima para remédios, frutos e sementes. Esses produtos são muito cobiçados por quem não os plantou e não tem paciência em produzi-los, nem em conservá-los. Quando escasseiam, pelo excesso de consumo e esbanjamento, aumentam de preço. Aí, vozes inconformadas bradam ante os holofotes.

  Um modelo de agricultura predatória na base do arado, do agrotóxico, da monocultura, do uso abusivo do fogo e desmatamento descomedido arruinou milhões de hectares dos nossos solos.
  Em meio a esse transe imediatista, surgiram pessoas que alertaram sobre a necessidade de ações mais respeitosas ao solo e a todas as formas de vida nele contidas. Foram assim as práticas naturais propostas pelo casal Arthur e Ana Primavesi, que conheci nos meus tempos na Agronomia da UFSM. Tive a honra de ler e comentar alguns dos seus livros antes mesmo de serem publicados. E quanto aprendi com eles. Nesse tempo, conheci também o José Lutzenberger, notável ambientalista.    Antes deles, tive professores no então Ginásio Agrícola Celeste Gobbato*, em Palmeira das Missões, depois na Escola Técnica de Agricultura – a ETA em Viamão, que se preocupavam com uma agricultura mais natural. Caso do professor Henrique Muxfeldt e de Napoleão Leiria e outros mais.
    Em Palmeira das Missões, Henrique Muxfeldt ministrava aulas práticas de silvicultura aos adolescentes – eu tinha então 15 anos. Elas sempre eram precedidas de uma explanação. Os alunos sentavam no chão, sob a copa das árvores. Então a gente aprendia a refletir sobre o tema e a observar a natureza no entorno. Meu grupo plantou centenas de mudas de araucária, o nosso pinheiro. Muitos anos depois fiz uma visita ao local e me emocionei ao ver as árvores enormes que resultaram daquelas mudas produzidas e plantadas na minha adolescência. Só se aprende fazendo. Um cenário natural é a melhor sala de aula para se aprender sobre a própria natureza.   Como vamos ensinar aos nossos jovens sobre a natureza se tem escolas sem uma árvore sequer? Penso que ambientes  excessivamente artificiais não significam melhor qualidade de ensino.  
   Voltemos aos nossos mestres da agricultura natural. Transcrevo a matéria apresentada no programa Globo Rural, que faz referência à Ana Primavesi, com todos os méritos.

                     Nota:  * Ginásio Agrícola Celeste Gobbato, hoje Escola Estadual Técnica Celeste Gobbato, .____________________________________________________
16/09/2012 09h00 - Atualizado em 16/09/2012 09h00


Globo Rural conta a vida e a obra da

agrônoma Ana Maria Primavesi

Manejo ecológico dos solos é o centro do trabalho de Primavesi.
Em mais de 60 anos de carreira, ela escreveu livros e ganhou prêmios
.

Do Globo Rural

Focando seu trabalho no manejo ecológico dos solos, Ana Maria Primavesi é a agrônoma que desvendou mistérios da vida no solo. Seu estudo é um ponto de virada da agricultura tropical. Ao longo de mais de 60 anos de carreira, ela deu aulas, escreveu livros, fez conferências e ganhou prêmios em vários países.
A doutora Primavesi, hoje com 92 anos, passou a vida toda no campo, estudando e aprendendo com a natureza. Ao longo da carreira, ela sempre defendeu uma agricultura natural, sem agrotóxico e que valoriza a vida no solo. “Para mim é fascinante como a terra melhora, como a água nasce, como tudo está se desenvolvendo. A minha paixão é o solo, porque tudo depende do solo, inclusive os homens”, explica.
A renomada cientista nasceu em um vilarejo na Áustria. De família nobre, teve educação de qualidade, com muita leitura e estudo de várias línguas. Vivia em um ambiente ao mesmo tempo sofisticado e muito ligado às coisas simples do campo. A propriedade em que morava era também uma fazenda, com gado de leite, trigo e outros produtos.
Segundo a geógrafa e professora, Virgínia Knabben, que está escrevendo um livro sobre Primavesi, o contato com a agricultura, desde cedo, foi fundamental para que ela resolvesse estudar agronomia e ciências florestais na Universidade Rural de Viena e, posteriormente, fizesse um doutorado sobre nutrição de plantas e solos.
Em 1946, Ana se casou com Artur Primavesi, de quem pegaria o sobrenome. Quando chegaram ao Brasil, em 1949, ambos começaram a trabalhar como agrônomos, dando início a uma relação profunda com o mundo rural brasileiro.
Visitando fazendas, conversando com agricultores, aos poucos, o casal aprendeu português e começou a escrever livros e manuais. Ao longo da vida, a doutora Primavesi publicou 12 livros e 94 textos e artigos científicos inéditos.
Para o agrônomo João Pedro Santiago, o pensamento de Primavesi é um marco na agricultura tropical e começa com uma ideia simples: o agricultor deve valorizar a vida do solo. “O solo orgânico pode ter, em um punhado de terra, até cinco bilhões de seres vivos, desde os grandes, como minhocas, até bactérias, fungos e algas. É um universo de vida e quem fez a gente enxergar isso foi a Primavesi. Na época em que ela começou a defender essas ideias, o foco era dado apenas para a adubação química e o para o veneno”, conta.
Segundo Primavesi, as plantas que crescem em um ambiente rico em matéria orgânica ficam mais fortes e mais resistentes ao ataque de pragas e doenças. Ela é totalmente contra ao uso de agrotóxicos. “Quando você tem um ambiente em que não usa veneno, a vida é diversificada, uns competem com os outros. É um controle biológico natural. Quando você joga veneno, vira praga. O tóxico mata a vida”, defende.
De todos os livros da doutora Primavesi, o mais famoso é o “Manejo ecológico do solo”, lançado em 1979. Com força e pioneirismo, as ideias da agrônoma se espalharam pelas faculdades de agronomia e se tornaram referência obrigatória, principalmente para quem estuda manejo de solos e agricultura orgânica.
Os ensinamentos de Primavesi
A mensagem da doutora Primavesi também entrou no dia-a-dia de agricultores de várias regiões do Brasil. É o caso do produtor orgânico Fernando Ataliba. Em seu sítio de 36 hectares, em Indaiatuba, interior de São Paulo, ele planta hortaliças, frutas e grãos.
No sítio de Fernando estão vários exemplos concretos do que ele chama de “manejo Primavesi”. Por exemplo, em todos os cultivos, as entrelinhas devem estar sempre cobertas, o que ajuda a manter o solo úmido, fofo e fresco. “Tudo isso enriquece a vida do solo, que vai sendo alimento de fungos e bactérias. Quanto mais formas de vida, mais saudável e mais sustentável ele fica”, explica o agricultor.
Outra recomendação de Primavesi adotada no sítio é a rotação de culturas. A prática é positiva para a saúde do solo e também ajuda no controle de pragas e doenças. Além de não usar veneno industrial, Fernando evita também as caldas e defensivos orgânicos.
Outra dica de manejo, particularmente importante para a agricultura tropical, é o uso de quebra-vento. “O vento constante desidrata as plantas, carreia a umidade do solo e das folhas, fazendo as plantas se estressarem com essa situação”, explica Fernando.
Com todos esses cuidados e seguindo à risca as ideias da doutora Primavesi, a propriedade vem conseguindo resultados positivos em termos de produção. “Respeitando o equilíbrio do solo e a natureza das plantas, nós conseguimos explorar todo o potencial genético das plantas. Isso quer dizer que eu estou produzindo acima da produtividade convencional um produto de alta qualidade”, garante Fernando.


9 de fevereiro de 2012

O semeador de árvores



As fotos acima são de fevereiro de 2006, nas margens da BR 285, em São Borja/RS, próximo à divisa com Santo Antônio das Missões. O registro é de arremesso de goiabas na faixa de domínio.  
Na foto superior Darci Roberto Schneid. Na outra foto, Darci Bergmann, em primeiro plano e Glademir Jaques, próximo à sombra do caminhão. 

Imagem: Cartaz e foto de Nena Nobre

   Por Darci Bergmann

   Desde menino, tenho contato com a natureza e, portanto, com as árvores.
   Na minha infância elas forneciam a lenha que aquentava o fogão nas noites frias de inverno e deixava pronta a comida caseira.    Criei-me à sombra delas. Alimentei-me dos seus frutos. Nelas brinquei de ‘tarzan’. Muitas esfoladas e algumas contusões fazem parte do meu currículo.
   Tornei-me um defensor das árvores e cada vez que uma delas era cortada eu parecia ter um sentimento de perda. Um dia constatei que a expansão da agricultura e dos pastos iria sacrificar muitas árvores e florestas inteiras. As estradas, as redes elétricas e o avanço das cidades eram saudados como progresso e as árvores eram empecilhos. Percebi que o furacão civilizatório deixava seu rastro de destruição. Nas paisagens desfiguradas, os bichos silvestres morriam por falta de habitat ou pela caça sem limites.
   Com o passar dos anos, a região das matas virgens da minha infância em terras catarinenses ficou uma colcha de retalhos. Entre os fragmentos florestais remanescentes, as lavouras morro acima sofreram prejuízos com a erosão do solo. Logo eram abandonadas e a vegetação secundária ali se estabelecia. Reparei que em alguns trechos era possível reintroduzir algumas espécies florestais. O vento e os animais ali depositavam sementes e novas árvores então apareciam. Fiz algumas experiências com as sementes de araucárias, imitando as gralhas e muitos pinheiros surgiram..
   Ainda em Mondaí, no Extremo Oeste Catarinense, lá pelos meus 11 anos eu e um grupo de amigos fizemos uma caminhada de reconhecimento numa região de morros. Saímos pela manhã cedo e não levamos nenhum alimento. Muitas horas depois a fome bateu. Para sorte nossa, encontramos goiabeiras com frutas maduras em meio às capoeiras. Desde então sou admirador dessa frutífera nativa. Passei a semear goiabas em vários locais.
   Quando estudei no Ginásio Agrícola Celeste Gobbato*, em Palmeira das Missões, eu tinha por hábito coletar pinhões num bosque próximo. Eles eram assados no fogo das grimpas caídas. Por gratidão, sempre deixava alguns pinhões para serem enterrados nas clareiras daquela mata. Também comia pitangas e arremessava parte das sementes para que germinassem no meio dos chircais.
    Em São Borja foram arremessados centenas de quilos de goiaba nas margens das rodovias. Fiz várias excursões para semeadura de árvores. Às vezes só, às vezes com pessoas que aderiam à causa. Numas dessas excursões reunimos quase 200 pessoas. Arremessamos sementes de várias espécies florestais nativas, às margens da BR 287, até o distrito de Nhu-Porã, num trajeto de 24 Km. Eu sabia que nem todas as sementes germinadas iriam vingar, pois o fogo destruiria a maioria delas.  No entanto, algumas árvores se originaram daquela semeadura e hoje são disseminadoras de novas mudas, através do vento e dos animais.   Para mim o mais importante era a semeadura de idéias nas mentes dessas pessoas. Em qualquer fase da vida, a lição aprendida ali poderia ser posta em prática. Tenho relatos de que muitas daquelas pessoas se tornaram semeadores também.
   De uns tempos para cá percebo que em vários trechos aumentou a quantidade de goiabeiras e outras espécies arbóreas. Essas ações criaram na tradição local uma imagem da minha pessoa, como sendo ligada à preservação das árvores. E conhecido por muitos como o ‘semeador de árvores’. Por coincidência, o editor da Revista Natureza, Aydano Roriz, numa das suas edições, usou a mesma expressão quando se referiu ao projeto Plante Uma Vida, Plante Uma Árvore, premiado por votação dos leitores.
   Talvez centenas de milhares de árvores resultassem dessas ações. Para mim ficou uma grande lição. Se queremos mudar alguma coisa precisamos agir, não esperar pelos outros.


*Ginásio Agrícola Celeste Gobbato, atualmente Escola Estadual Técnica Celeste Gobbato
 (BR158, km 06, saída para Cruz Alta, Palmeira das Missões – RS);
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