9 de fevereiro de 2012

O semeador de árvores



As fotos acima são de fevereiro de 2006, nas margens da BR 285, em São Borja/RS, próximo à divisa com Santo Antônio das Missões. O registro é de arremesso de goiabas na faixa de domínio.  
Na foto superior Darci Roberto Schneid. Na outra foto, Darci Bergmann, em primeiro plano e Glademir Jaques, próximo à sombra do caminhão. 

Imagem: Cartaz e foto de Nena Nobre

   Por Darci Bergmann

   Desde menino, tenho contato com a natureza e, portanto, com as árvores.
   Na minha infância elas forneciam a lenha que aquentava o fogão nas noites frias de inverno e deixava pronta a comida caseira.    Criei-me à sombra delas. Alimentei-me dos seus frutos. Nelas brinquei de ‘tarzan’. Muitas esfoladas e algumas contusões fazem parte do meu currículo.
   Tornei-me um defensor das árvores e cada vez que uma delas era cortada eu parecia ter um sentimento de perda. Um dia constatei que a expansão da agricultura e dos pastos iria sacrificar muitas árvores e florestas inteiras. As estradas, as redes elétricas e o avanço das cidades eram saudados como progresso e as árvores eram empecilhos. Percebi que o furacão civilizatório deixava seu rastro de destruição. Nas paisagens desfiguradas, os bichos silvestres morriam por falta de habitat ou pela caça sem limites.
   Com o passar dos anos, a região das matas virgens da minha infância em terras catarinenses ficou uma colcha de retalhos. Entre os fragmentos florestais remanescentes, as lavouras morro acima sofreram prejuízos com a erosão do solo. Logo eram abandonadas e a vegetação secundária ali se estabelecia. Reparei que em alguns trechos era possível reintroduzir algumas espécies florestais. O vento e os animais ali depositavam sementes e novas árvores então apareciam. Fiz algumas experiências com as sementes de araucárias, imitando as gralhas e muitos pinheiros surgiram..
   Ainda em Mondaí, no Extremo Oeste Catarinense, lá pelos meus 11 anos eu e um grupo de amigos fizemos uma caminhada de reconhecimento numa região de morros. Saímos pela manhã cedo e não levamos nenhum alimento. Muitas horas depois a fome bateu. Para sorte nossa, encontramos goiabeiras com frutas maduras em meio às capoeiras. Desde então sou admirador dessa frutífera nativa. Passei a semear goiabas em vários locais.
   Quando estudei no Ginásio Agrícola Celeste Gobbato*, em Palmeira das Missões, eu tinha por hábito coletar pinhões num bosque próximo. Eles eram assados no fogo das grimpas caídas. Por gratidão, sempre deixava alguns pinhões para serem enterrados nas clareiras daquela mata. Também comia pitangas e arremessava parte das sementes para que germinassem no meio dos chircais.
    Em São Borja foram arremessados centenas de quilos de goiaba nas margens das rodovias. Fiz várias excursões para semeadura de árvores. Às vezes só, às vezes com pessoas que aderiam à causa. Numas dessas excursões reunimos quase 200 pessoas. Arremessamos sementes de várias espécies florestais nativas, às margens da BR 287, até o distrito de Nhu-Porã, num trajeto de 24 Km. Eu sabia que nem todas as sementes germinadas iriam vingar, pois o fogo destruiria a maioria delas.  No entanto, algumas árvores se originaram daquela semeadura e hoje são disseminadoras de novas mudas, através do vento e dos animais.   Para mim o mais importante era a semeadura de idéias nas mentes dessas pessoas. Em qualquer fase da vida, a lição aprendida ali poderia ser posta em prática. Tenho relatos de que muitas daquelas pessoas se tornaram semeadores também.
   De uns tempos para cá percebo que em vários trechos aumentou a quantidade de goiabeiras e outras espécies arbóreas. Essas ações criaram na tradição local uma imagem da minha pessoa, como sendo ligada à preservação das árvores. E conhecido por muitos como o ‘semeador de árvores’. Por coincidência, o editor da Revista Natureza, Aydano Roriz, numa das suas edições, usou a mesma expressão quando se referiu ao projeto Plante Uma Vida, Plante Uma Árvore, premiado por votação dos leitores.
   Talvez centenas de milhares de árvores resultassem dessas ações. Para mim ficou uma grande lição. Se queremos mudar alguma coisa precisamos agir, não esperar pelos outros.


*Ginásio Agrícola Celeste Gobbato, atualmente Escola Estadual Técnica Celeste Gobbato
 (BR158, km 06, saída para Cruz Alta, Palmeira das Missões – RS);
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