Análise
Por Risto Isomäki*
Enquanto há pouco progresso para reduzir os gases que provocam o aquecimento global, avança-se rapidamente na proibição de substâncias capazes de esfriar a atmosfera, afirma neste artigo o escritor Risto Isomäki.
HELSINQUE, Finlândia, 30 de agosto (Tierramérica).- Em uma temporada de impressionantes notícias vinculadas ao clima, há sinais de que estão derretendo gelos submarinos que abrigam depósitos de gases-estufa cuja liberação tornaria insignificantes as atuais emissões dessas substâncias causadoras da mudança climática. Neste ano de 2010, são batidos recordes mundiais e nacionais de calor: 37,2 graus na Finlândia, 35 na república russa de Sajá e 54 no Paquistão.
Os incêndios de florestas e jazidas de carvão causam enormes danos na Rússia, enquanto o Paquistão sofreu grandes inundações e enxurradas de lama. Um enorme bloco de gelo se desprendeu da geleira Petermann, no noroeste da Groenlândia, e a extensão do gelo no Mar do Ártico é a segunda menor que se recorde.
Em 1994, foi feita uma estimativa de que havia cerca de 25 mil quilômetros cúbicos de bancos de gelo flutuantes no Ártico. Desde então, a quantidade caiu, pelo menos, em 80%. Enquanto o gelo e a neve refletem entre 70% e 90% da radiação solar para o espaço, as superfícies aquáticas refletem apenas entre 4% e 10%. Portanto, a perda de gelo marinho acelera o aquecimento das águas em áreas polares. O Ártico abriga enormes depósitos naturais de carvão orgânico e metano, potente gás de efeito estufa.
As áreas terrestres com gelo permanente (permafrost) contêm sozinhas um bilhão e meio de toneladas de carvão orgânico que poderia ser liberado na atmosfera em forma de metano se o permafrost derretesse. Quase metade do leito do Ártico está coberta por um permafrost submarino além de existirem ali jazidas de hidratos de metano, uma mistura de gelo comum e gás presa dentro e debaixo do gelo. O derretimento deste permafrost e destes depósitos de hidratos de gás pode, teoricamente, liberar tanto metano e dióxido de carbono que, em comparação, nossas atuais emissões de gases-estufa seriam insignificantes.
Há sinais de que algo assim começa a acontecer. Em agosto de 2009, uma equipe da britânica Universidade de Southampton descobriu 250 locais em que as jazidas submarinas de hidratos de gás tinham começado a derreter e a liberar metano, ao redor do arquipélago ártico de Spitsbergen. É necessário deter esse derretimento antes que as coisas fujam ao controle.
Enquanto há pouco progresso nas negociações para reduzir as emissões que causam o aquecimento global, os esforços para reduzir emissões de substâncias capazes de esfriar a atmosfera avançam rapidamente. A Organização Marítima Internacional (OMI) decidiu, em outubro de 2008, que o máximo de conteúdo de enxofre no combustível usado pelas embarcações que percorrem os oceanos deverá ser de 0,5% até 2020, enquanto o limite no momento é de 2,7%.
As pequenas gotinhas de enxofre emitidas na atmosfera pela combustão dos motores dos navios estimulam a formação de nuvens baixas, que têm um impacto refrescante sobre o planeta, indicam observações científicas. As estimativas disponíveis indicam que as emissões de enxofre das embarcações ajudam a esfriar o planeta com uma eficiência de 58 décimos de watt por metro quadrado. Além disso, esse enxofre faz com que as nuvens sejam mais brancas, reflitam melhor a luz solar e tenham maior vida útil. Seu efeito é especialmente importante sobre os oceanos, onde frequentemente há escassez de pequenas partículas que possam atuar como núcleos de condensação para as nuvens.
Assim, a aplicação dessa disposição da OMI pode reduzir o efeito refrescante dos barcos em 0,31 watt por metro quadrado. Pode parecer pouco importante, mas, segundo medições da Nasa, a agência espacial dos Estados Unidos, o desequilíbrio do calor planetário, o aquecimento global, chega hoje a 85 décimos de watt por metro quadrado. Isto significa que a Terra recebe mais energia do Sol do que a irradia de volta ao espaço, e que essa diferença é de 0,85 watt por metro quadrado.
Em outras palavras, a colocação em prática do tratado da OMI pode elevar o aquecimento global em 26%, de 0,85 para 1,16 watt por metro quadrado, um extremo perigoso, sobretudo porque o impacto se concentraria sobre os oceanos, especialmente no Atlântico Norte e no Ártico. O enxofre é prejudicial à saúde humana, por isso tem sentido reduzir as emissões nas zonas marinhas próximas de lugares densamente povoados, como o Báltico e o Mediterrâneo.
Porém, o enxofre emitido no meio do oceano dificilmente pode ser um problema importante para a saúde humana. Este é realmente um bom momento para investir mais de US$ 200 bilhões por ano para reduzir as emissões de enxofre das embarcações que cruzam os oceanos? Embora o tratado da OMI tenha boas intenções, poderia nos empurrar para a beira do abismo.
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* Risto Isomäki é ambientalista e escritor finlandês com livros traduzidos para vários idiomas. Direitos exclusivos IPS.
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