23 de julho de 2010

Bioma Pampa já perdeu mais da metade da vegetação original

Agência Brasil

O bioma Pampa, que ocupa a maior parte do Rio Grande do Sul, já perdeu quase 54% da vegetação original. Os dados mais recentes do desmatamento do bioma, divulgados nesta quinta-feira (22) pelo Ministério do Meio Ambiente, mostram que, entre 2002 e 2008, 2.183 km² de cobertura nativa foram derrubados.

O levantamento, feito pelo Centro de Monitoramento Ambiental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), aponta os 19 municípios gaúchos que mais desmataram o bioma no período. Alegrete, no extremo oeste do Estado, é o campeão de derrubada, com 176 km² de desmate entre 2002 e 2008. As cidades de Dom Pedrito e Encruzilhada do Sul aparecem em seguida, com 120 km² e 87 km² desmatados em seis anos.

Apesar do grande percentual desmatado, o ritmo de devastação do Pampa é o menor entre os biomas brasileiros. De acordo com os dados do MMA, a região perdeu anualmente, em média, 364 km² de vegetação nos últimos seis anos. No Cerrado, o ritmo anual de devastação é de 14 mil km² por ano e, na Amazônia, a derrubada atinge 18 mil km² de floresta anualmente.

Veja a lista dos municípios que mais desmataram o bioma Pampa entre 2002 e 2008:
Município/Área desmatada entre 2002 e 2008 (km²)

Alegrete 176,23
Dom Pedrito 120,45
Encruzilhada do Sul 87,27
Rosário do Sul 86,6
Santana do Livramento 84,77
Uruguaiana 82,91
São Gabriel 81,29
Bagé 66,69
Piratini 63,73
São Borja 60,68
Itaqui 53,04
Jaguarão 48,56
São Francisco de Assis 43,23
Cachoeira do Sul 42,68
Santiago 40,99
Cacequi 39,59
Santa Maria 36,19
Maçambara 35,88
Tupanciretã 34,84

Fonte: Ibama

http://www.abril.com.br/noticias/brasil/bioma-pampa-ja-perdeu-mais-metade-vegetacao-original-580873.shtml

ALTERAÇÃO DO CÓDIGO FLORESTAL - NOTA TÉCNICA DO MPF


Nota técnica que expede a 4ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal acerca do substitutivo ao Projeto de Lei nº 1.876/1999, apresentado pelo Deputado Aldo Rebelo à Comissão Especial destinada a proferir parecer sobre o referido PL, que altera o atual Código Florestal, Lei n.º 4.771/65.
A presente Nota Técnica manifesta e fundamenta a posição contrária da 4ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal ao substitutivo ao Projeto de Lei nº. 1.876/1999 apresentado pelo Deputado Aldo Rebelo à Comissão Especial instituída para proferir parecer sobre projetos de lei que alteram o Código Florestal (Lei 4.771/65) (1)

Conforme será exposto ao longo dessa Nota as propostas de modificação da legislação fragilizam a proteção do meio ambiente, diminuindo drasticamente o padrão de proteção ambiental atualmente proporcionado pela legislação em vigor, contrariando as obrigações constitucionais impostas ao Poder Público para assegurar a efetividade do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

1. Exclusão de ambientes atualmente caracterizados como de preservação permanente.

Os topos de morros, montes, montanhas e serras deixarão de ser considerados área de preservação permanente. Essas áreas são especialmente relevantes para garantir a estabilidade das encostas, o que as torna de extrema importância para o bem-estar da população tendo em vista os desastres envolvendo deslizamento de encostas em época de chuvas, como verificado durante todo o verão de 2010 em diversos estados da federação.

Também perderão a proteção, locais com altitudes superiores a 1.800m, áreas em que é comum a ocorrência de espécies raras e endêmicas. Vale ressaltar que esses ambientes são pouco comuns no Brasil. Em estimativa dos analistas periciais do Ministério Público Federal com o uso do software ArcView, a partir de dados da Base Cartográfica Digital do IBGE, escala 1:1.000.000, de 2003, chegou-se a apenas 1.015 km² (101.548 hectares) de áreas com altitudes superiores a 1.800 metros, a maior parte situada na serra da Mantiqueira, na divisa dos estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo. Considerando que o Brasil
continental possui área de 8.514.876,59 km² (851.487.659 hectares), as áreas com altitudes superiores a 1.800 metros representam 0,01% desse território. Em função de sua relevância ambiental e cênica, a maior parte das áreas com altitudes superiores a 1.800 metros do Brasil encontra-se também protegida por unidades de conservação federais. É o caso das áreas dos Parques Nacionais de Itatiaia, da Serra da Bocaina, da Serra dos Órgãos, do Caparaó, da Chapada dos Veadeiros, do Pico da Neblina, do Monte Roraima e das Áreas de Proteção Ambiental da Serra da Mantiqueira e de Petrópolis. A eliminação da proteção das áreas com altitudes superiores a 1.800m, sob a forma de áreas de preservação permanente, possibilitará o uso alternativo daquelas localizadas fora das unidades de conservação de proteção integral, em prejuízo aos ecossistemas nelas existentes.
 (1)A presente Nota Técnica foi elaborada a partir das conclusões do Parecer Técnico nº 204/2010, de autoria dos analistas periciais em Engenharia Florestal Denise Christina de Rezende Nicolaidis e Marcos Cardoso Garcia

As restingas, em uma faixa de 300 metros a partir da linha preamar máxima, também deixarão de ser protegidas sob a forma de área de preservação permanente, possibilitando a sua ocupação por empreendimentos e equipamentos urbanos, com irreparáveis prejuízo ao patrimônio paisagístico que ainda resta do nosso litoral brasileiro. É preciso mencionar, por outro lado, que as restingas possuem importante papel na fixação do substrato arenoso, sujeito à ação erosiva do vento evitando problemas de bloqueio de estradas e invasão de habitações, além de atenuar o assoreamento de brejos, lagunas e canais. A cobertura vegetal contribui ainda para manter o substrato permeável, permitindo que a água das chuvas alimente o lençol freático, cujo nível garante o fornecimento de água potável e a manutenção do nível dos corpos d’água. A retirada da vegetação desse ambiente pode acarretar a lavagem acelerada dos nutrientes, com seu carreamento para as profundezas do solo, fora do alcance das raízes da vegetação, num processo de empobrecimento gradual do sistema. Em estágios mais avançados de degradação, o solo pode sofrer intensa erosão pelos ventos, o que pode ocasionar a formação de dunas móveis – um grave risco para o ambiente costeiro e, particularmente, para a população da faixa litorânea(2).

As acumulações naturais ou artificiais de água com superfície inferior a 1 ha serão dispensadas de possuírem faixa de preservação permanente em seu entorno (art.3º, § 4º).
Diversas lagoas marginais aos rios, de importância como berçário para diversas espécies, encontram-se nessa situação. A retirada dessa proteção permitirá, por exemplo, o avanço de atividades antrópicas, aí incluída a agricultura, todos os insumos que a acompanham, e a construção de edificações, seus sistemas de disposição de resíduos, até o limite dessas acumulações, o que certamente trará prejuízo a esses ambientes.

Os Estados poderão, no âmbito de programa de regularização ambiental criado pela proposta, dispensar a recuperação das áreas de preservação permanente localizadas em áreas rurais consolidadas, o que representa a possibilidade de completa supressão desses espaços territoriais especialmente protegidos. Até que tais programas sejam implementados pelos Estados ou pelo Distrito Federal ficará também assegurada a manutenção das atividades agropecuárias e florestais em áreas rurais consolidadas, localizadas em área de
preservação permanente e áreas com declividade entre 25º e 45º.Por fim, será facultado aos Estados e ao Distrito Federal diminuir em até 50% as áreas de preservação permanente definidas na lei.

(2)Ciência Hoje. Vol. 06 N.º 33

2. Flexibilização das normas atualmente vigentes acerca das áreas de preservação
permanente.
O referencial para demarcação da faixa de preservação permanente às margens de rios será alterado do leito maior para o leito menor. Essa alteração reduzirá consideravelmente a extensão da área atualmente protegida às margens dos rios, sendo possível inclusive que, em função de características topográficas, ocorra uma redução maior que a própria faixa. A redefinição proposta acarretará a possibilidade de ocupação do leito maior de cursos d'água por atividades antrópicas e até mesmo por assentamentos humanos. Como o leito maior é sujeito a inundações no período de cheias, é de se esperar o aumento de casos de danos materiais, além do risco à vida humana.

As faixas de áreas de preservação permanente às margens de rios cuja largura será 15m (art. 3º, inciso I, alínea “a”), ao invés dos 30m atualmente previstos como faixa mínima, poderão ser reduzidos em até 50% pelos Estados (art. 3º, § 1º). Com isso, na prática, a faixa mínima de proteção às margens de rios poderá ser de 7,5m. Esse valor não tem uma justificativa técnica que forneça garantias de que a proteção das margens será obtida com essa faixa de proteção.

A largura da área de preservação permanente no entorno de reservatórios artificiais passará a ser definida pelo órgão ambiental no âmbito do licenciamento de cada empreendimento (art. 3º, Inciso III; art. 4º). As faixa mínimas propostas, de 30m em área rural e de 15m em área urbana, são inferiores às faixas atualmente definidas na Resolução Conama 302/2002.

Propõe-se a distinção entre nascente e olho d'água (art. 2º, incisos XI e XII), considerados sinônimos pelo Código Florestal vigente. A partir dessa distinção, poderá ser permitida a interferência em áreas de preservação permanente ao redor de nascentes intermitentes. Enquadram-se nesses casos as diversas restrições impostas à intervenção ou supressão em áreas de preservação de nascentes previstas na Resolução Conama 369/2006, tais como a vedação de intervenção em nascente por atividades de interesse social, a vedação de intervenção para a extração de rochas para uso direto na construção civil e o condicionamento da intervenção à outorga do uso da água.

A definição de vereda adotada no substitutivo (art. 2º, inciso XVII) reduzirá a proteção atualmente vigente. O conceito da Resolução nº. 303/2002 do CONAMA, descrevendo o espaço, e inclusive o vinculando à ocorrência de nascentes e cabeceiras de cursos d'água, é mais apropriado à proteção ambiental desejada. Ao invés de caracterizar o espaço protegido, o substitutivo descreve a fitofisionomia. O conceito utilizado parece ter sido adaptado de Ribeiro e Walter (1998)(4), no entanto, deixa de observar que esses autores fazem distinção da fitofisionomia vereda de Palmeiral, no qual incluem o subtipo Buritizal, o que, se é pertinente em termos de fitofisionomia, não o é em termos de definição de espaços protegidos, uma vez que a fisionomia buritizal, tal como fisionomia vereda, também ocorre associada a solos brejosos ou encharcados, em fundos de vale, porém apresentando dossel. A proteção a ser conferida aos buritizais e a esses espaços brejosos deve ser idêntica à das veredas, uma vez que devem ser protegidos em toda a sua extensão, e não em faixas marginais, dada a fragilidade e importância ecológica desses ecossistemas como um todo.

(3) Vereda - espaço brejoso ou encharcado, que contém nascentes ou cabeceiras de cursos d'água, onde há ocorrência de solos hidromórficos, caracterizado predominantemente por renques de buritis do brejo (Mauritia flexuosa) e outras formas de vegetação típica.


(4)RIBEIRO, J. F.; WALTER, B. M; T. Fitofisionomias do bioma Cerrado. In: SANO, S. M.; ALMEIDA, S. P. De; RIBEIRO, J.F. Cerrado: ecologia e flora. Embrapa Cerrados. - Brasília. Embrapa Informação Tecnológica, 2008. p. 151-212.


3. Áreas de preservação permanente nos ambientes urbanos.

O conceito de área urbana consolidada (art. 2º) tornará mais permissiva a ocupação e o uso alternativo de áreas de preservação permanente urbanas. Os critérios de reconhecimento da área urbana consolidada, que não incluirão a exigência de que a área já seja habitada, permitem a criação de áreas urbanas “consolidadas” a qualquer tempo, independentemente da existência prévia da ocupação, possibilitando a abertura de novos assentamentos urbanos em áreas de preservação.

As áreas de preservação permanente em áreas urbanas consolidadas passarão a ser definidas nos Planos Diretores e leis de uso do solo do município. Se o município desejar suprimi-las não haverá impedimento, uma vez que não há previsão de um padrão mínimo de proteção.

O substitutivo, se aprovado, permitirá a implantação de infraestrutura de esportes, lazer e atividades educacionais e culturais ao ar livre, nas áreas de preservação permanente situadas em áreas urbanas consolidadas, o que significará a supressão de áreas de preservação para dar lugar, por exemplo, a estádios; clubes esportivos ou recreativos; escolas; fundações culturais; etc. Não há sequer a previsão da obrigatoriedade de inexistência de alternativa locacional para tais atividades. Note-se que não se trata da regularização de equipamentos já implantados, mas da permissão para novos se instalarem.

4. Propostas de modificação quanto à Reserva Legal.

Propõe-se eliminar a exigência da Reserva Legal para imóveis rurais com área de até quatro módulos fiscais (art. 14). Na Amazônia Legal, onde significativa parte do território tem o módulo fiscal definido em 100 hectares, propriedades com até 400 ha ficarão dispensadas de manter em seu interior área vegetada, estimulando o desmatamento. Considerando áreas de floresta, com Reserva Legal de 80% da área, seria possível o desmatamento de até 320 ha por propriedade com área igual ou superior a 4 módulos fiscais. Nessas condições, como propriedades rurais com área de até 400 hectares poderão ser totalmente desmatadas um conjunto de pequenas propriedades rurais, ocorrentes na mesma região, resultando em extensas áreas degradadas.

Será exigida Reserva Legal apenas para a porção do imóvel que exceder a quatro módulos fiscais (art. 14, §1º). Assim, haveria a redução de Reserva Legal em área correspondente a, no mínimo, 0,8 módulos fiscais (20% de 4 módulos) por propriedade rural, podendo-se chegar a 3,2 módulos fiscais (80% de 4 módulos), para cada propriedade rural localizada em área de floresta da Amazônia Legal.

Fazendo uma projeção apenas para os estados situados na região Norte (Acre, Amazonas, Amapá, Pará, Rondônia e Roraima) a introdução desse dispositivo será responsável pela redução de cerca de 71.000.000 ha (setenta e um milhões de hectares) de área protegida(5), área que é superior ao somatório de todas as unidades de conservação federais situadas na Amazônia Legal, de proteção integral e uso sustentável (61.598.042 ha) (6)



(5) Para essa estimativa foi considerado que os imóveis estão localizados em área com formações florestais, com Reserva Legal de 80% da área, exceto para o estado de Roraima em que foi considerada a formação savânica e Reserva Legal de 35%. O número de propriedades por área de módulo fiscal em cada estado foi obtido a partir de dados disponibilizados pelo Incra
 2, acessado em 18 junho de 2010). Acre: 14.265 propriedades com módulo fiscal de 100 há e 7450 com módulo fiscal de 70 ha;
. Se considerada a possibilidade de existência de uma infinidade de posses, não cadastradas pelo Incra, a redução da área protegida poderá ser ainda maior.

O fato de a dimensão do módulo fiscal variar não apenas no espaço, mas também no tempo, uma vez que a área do módulo de cada município pode ser alterada pelo INCRA levará a alterações constantes na área da Reserva Legal das propriedades, sem que isso seja associado a variáveis ambientais.

Será permitido o plantio de espécies exóticas na recomposição da reserva legal de acordo com critérios técnicos gerais estabelecidos em lei estadual ou do Distrito Federal (art. 25, §

2º). Tal medida promoverá a descaracterização da vegetação nativa das Reserva Legais assim recompostas. No Código atual, a recomposição deve ser apenas com espécies nativas, possibilitando o plantio de exóticas somente de modo temporário como pioneiras, visando à restauração do ecossistema original.

A localização da Reserva Legal no interior do imóvel será de livre escolha do proprietário ou possuidor, salvo quando houver prévia determinação de sua localização pelo órgão competente do Sisnama (art. 15). O Código Florestal vigente prevê que a localização da RL deve ser aprovada pelo órgão estadual competente, municipal ou outra instituição habilitada devendo ser considerados no processo de aprovação a função social da propriedade e os benefícios ambientais da localização.

 Será permitido o cômputo das áreas de preservação permanente no percentual de Reserva Legal (art. 16), podendo haver situação em que as áreas de preservação existentes na propriedade sejam suficientes ou próximas do percentual previsto para a região. O Código atual admite esse benefício apenas para casos em que a soma da vegetação nativa em área de preservação permanente e da Reserva Legal exceder a oitenta por cento da propriedade rural localizada na Amazônia Legal; cinquenta por cento da propriedade rural localizada nas demais regiões do País; vinte e cinco por cento da pequena propriedade assim considerada
aquela com 50 ha, se localizada no polígono das secas ou a leste do Meridiano de 44º W, do Estado do Maranhão, ou 30 ha, se localizada em qualquer outra região do País.

 Será permitida a compensação de Reserva Legal mediante a doação ao Poder Público de área localizada no interior de Unidade de Conservação (art.25, III), promovendo uma redução substancial da proteção de vegetação nativa. Cabe mencionar que o Ministério Público Federal ajuizou a ação direta de inconstitucionalidade nº 4367 em face do § 6º do art. 44 da Lei 4.771/65, com a redação que lhe foi conferida pela Lei 11.428/2006, que permite aos proprietários rurais a desoneração do dever de manter em sua propriedade reservas florestais legais, mediante doação de área de terra localizada no interior de unidade de conservação, pendente de regularização fundiária.

(6)Amazonas: 17.899 propriedades com módulo fiscal de 100 há, 41.512 com módulo fiscal de 80 há e 2.899 com módulo fiscal de 10 há; Amapá: 3.948 propriedades com módulo fiscal de 70 ha e 5.947 com módulo fiscal de 50 ha; Pará: 49.599 propriedades com módulo fiscal de 75 ha, 42.426 com módulo fiscal de 70 ha, 7.084 com módulo fiscal de 65 ha, 27.627 com módulo fiscal de 55 ha, 2.196 com módulo fiscal de 50 ha, 731 com módulo fiscal de 7 ha e 148 com módulo fiscal de 5 ha; Rondônia: 77.396 propriedades com módulo fiscal de 60 há; Roraima: 16.522 propriedades com módulo fiscal de 100 ha e 10.270 com módulo
fiscal de 80 ha..  http://www.socioambiental.org/uc/quadro_geral, acessado em 18 de junho de 2010



(7) em função do tipo de exploração predominante, da renda obtida com a exploração, de outras explorações existentes
no município que, embora não predominantes, sejam significativas em função da renda ou da área utilizada, do conceito de agricultura familiar,


Com a instituição de Cotas de Reserva Legal - CRA, áreas em que, por características próprias de localização, nunca seriam desmatadas, poderão ser negociados para a compensação de áreas em que a Reserva Legal não foi averbada. Com isso, ao final, tem-se a redução da proteção ambiental, porque a aquisição da CRA não está vinculada à mesma fitofisionomia, equivalência em importância ecológica, ou localização no mesmo estado e na mesma bacia hidrográfica que a Reserva Legal que se deseja compensar. O Substitutivo admite a CRA para a compensação de Reserva Legal de imóveis situados no mesmo bioma
(art. 41, parágrafo 3º). O conceito de bioma é muito amplo levando a situações em que CRA de propriedade localizadas no bioma Mata Atlântica pode ser utilizada para compensar Reserva Legal de outra localizada em qualquer um dos 15 estados da federação em que ocorre Mata Atlântica, por exemplo.

Acerca dos mecanismos de compensação, é preciso ter claro que os objetivos das áreas de preservação permanente, das reservas legais e das unidades de conservação, embora complementares, não se confundem (8).

 De acordo com Campos (2006b), as APP, as RL, e outras áreas legalmente protegidas, além de contribuírem para a preservação de ecossistemas, são importantes para aumentar a expressividade das Unidades de Conservação, sendo que o conjunto dessas áreas configura uma estratégia “expandida” de valorização da biodiversidade. Como é amplamente sabido (PRIMACK & RODRIGUES,
2001; PAGLIA et al, 2006; PINTO et al, 2006 ROCHA et al, 2006; BENSUSAN, 2006), a conservação da biodiversidade não se faz somente nos locais restritos das áreas protegidas pelas Unidades de Conservação. Por essa razão, o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) previu dois outros conceitos relevantes para a gestão de UCs. São eles: a zona de amortecimento e o corredor ecológico, que representam um esforço para levar a conservação da biodiversidade para além dos limites da UC. A zona de amortecimento, prevista no SNUC, tem como ideia central o fato de que o uso de recursos naturais no entorno da Unidade pode vir a comprometer os processos ecológicos que geram e mantêm a biodiversidade que se quer conservar. Já os corredores ecológicos procuram mitigar o efeito da fragmentação dos ambientes naturais a qual prejudica ou mesmo inviabiliza a manutenção da biodiversidade em função da redução e isolamento dosecossistemas. Os corredores propiciam a conectividade(9) entre as áreas conservadas e garantem a variabilidade genética das populações silvestres, que permite a evolução e sobrevivência das espécies (em última análise). Portanto, a busca de conectividade entre fragmentos de vegetação traz os benefícios necessários a uma proteção efetiva da biodiversidade. Deve ser levado em consideração que os processos de isolamento dos remanescentes de ecossistemas, conhecidos como fragmentação e insularização, produzem várias mudanças qualitativas fáceis de predizer, conforme destacado por Bierregaard, et al. (1992), Campos & Agostinho (1997) e Primack & Rodrigues (2001) apud Campos (2006a), entre as quais podem ser citadas:

acarreta a redução de populações silvestres, com consequências genéticas deletérias, aumentando a probabilidade de extinção de espécies, devido à menor capacidade de adaptação a mudanças naturais ou antropogênicas do ambiente; considerando que a distribuição das populações não é homogênea; certas espécies podem não estar presentes em determinados fragmentos ambientais simplesmente porque não




(8) O trecho a seguir foi retirado da IT n.º 76/09 – 4a CCR.
(9) Conectividade pode ser definida como a capacidade da paisagem (ou das unidades da paisagem) de facilitar os fluxos biológicos. A conectividade depende da proximidade dos elementos de habitat, da densidade de corredores e “stepping stones” (pontos de ligação ou trampolins ecológicos que facilitam o fluxo gênico entre fragmentos de vegetação) e da permeabilidade da matriz ambiental (METZGER, 2001).

“acharam o caminho” (dispersão) antes dos ecossistemas serem isolados; a fragmentação de habitat aumenta a vulnerabilidade dos fragmentos de vegetação à invasão de espécies exóticas e espécies nativas invasoras;
espécies que requerem grandes habitats podem não sobreviver em pequenos fragmentos.

4. Normas sobre o passivo ambiental: o Programa de Regularização Ambiental (PRA)

O substitutivo cria o denominado Programa de Regularização Ambiental - PRA para áreas que tiveram vegetação nativa suprimida antes de 22 de julho de 2008. A justificativa para o estabelecimento desse marco temporal é a entrada em vigor do Decreto 6.514/2008, que dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente. Ocorre que as infrações administrativas especificadas nesse Decreto já eram disciplinadas pelo Decreto nº 3.919, de 14 de setembro de 2001 e classificadas como crimes na lei 4.771/65. Assim, o marco temporal estabelecido é aleatório e beneficia indiscriminadamente todos os que
infringiram a legislação ambiental. Essa postura contribui para o fortalecimento da cultura de desrespeito à legislação e contraria os esforços que os órgãos públicos brasileiros e a própria sociedade têm empreendido para conferir efetividade à legislação ambiental.

Os Programas de Regularização Ambiental deverão ser elaborados pelos Estados e Distrito Federal e disporão sobre a adequação ambiental dos imóveis rurais. A União elaborará os programas de recuperação ambiental apenas nas áreas de seu respectivo domínio. O substitutivo não define o órgão responsável pela elaboração do PRA no âmbito do Poder Executivo, abrindo possibilidade para a desconsideração dos órgãos integrantes do Sisnama. Quanto à delegação de elaboração do PRA aos Estados, cumpre observar que a Constituição Federal estabelece ser competência comum da União, dos Estados e dos Municípios “proteger as florestas, a fauna e a flora”, cabendo a leis complementares fixar normas para a cooperação entre as unidades da federação, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional.
O substitutivo altera por completo o regime vigente acerca da responsabilidade pela recuperação dos danos ambientais, transferindo ao poder público a responsabilidade primordial pela recuperação ambiental de áreas ilegalmente degradadas: ao elaborar o programa de recuperação ambiental, os estados deverão indicar o orçamento dos investimentos realizados, as fontes de recursos e o cronograma de implementação. Os proprietários rurais, por sua vez, terão a forma de participação e contribuição definida no Programa, ficando desobrigados de adotar qualquer medida de recomposição de vegetação suprimida ilegalmente até que o Programa de Regularização Ambiental, assim o determine.
O substitutivo não apresenta formas para garantir a adesão dos proprietários e possuidores ao Programa de Regularização, prevendo apenas que eles participarão e contribuirão na sua implementação, sem estabelecer qualquer obrigação mínima.

5. Normas para o passivo ambiental: suspensão de penalidades aplicadas

 O substitutivo prevê que a partir da realização do Cadastro Ambiental, o proprietário ou possuidor não poderá ser autuado por infrações aos arts. 2º, 3º, 4º, 10, 16, 19, 37-A e 44 e das alíneas a, b e g do art. 26 da Lei nº 4.771, 15 de setembro de 1965, cometidas na respectiva propriedade ou posse antes de 22 de julho de 2008, ficando as multas já aplicadas, suspensas.

 Essa proposta confere verdadeira anistia àqueles que desrespeitaram as leis na vigência da legislação anterior. É importante ressaltar que muito embora o Decreto nº 7.209/2009 já estabelecesse um mecanismo de suspensão da aplicação de multas e incidência de novas autuações, tais medidas eram condicionadas à efetiva recuperação ambiental e averbação da Reserva Legal. O que propõe o texto do substitutivo apresentado à Comissão Especial é que a suspensão de multas serão condicionadas apenas ao “cadastro
ambiental” do proprietário junto aos órgãos competentes, sem qualquer compromisso com a efetiva recuperação ambiental.

 A esse respeito, é importante mencionar que a própria Constituição Federal é que determina a imposição de sanções penais e administrativas às condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente, bem como a obrigação de reparar os danos causados.

6. Conclusão

O projeto de lei altera por completo a sistemática vigente acerca das áreas de preservação permanente, das reservas legais e o sistema de responsabilização pela recuperação das áreas cuja vegetação foi suprimida ilegalmente. São excluídas categorias de áreas de preservação, diminuídas as faixas de proteção atualmente definidas e criada a possibilidade de autorização para a consolidação de ocupações irregulares em áreas urbanas e rurais, além da diminuição em até 50% dos percentuais de proteção definidos pela legislação federal.
Quanto à reserva legal, deixará de ser obrigatória para propriedades com até 04 módulos fiscais, será permitida a inclusão das áreas de preservação permanente no computo do percentual a ser protegido, bem como sua recomposição com espécies exóticas.
Para se ter idéia da magnitude dos danos ambientais associados à proposta, tratando do impacto de somente uma das modificações - a dispensa de reserva legal em propriedades com até 04 módulos fiscais - e em uma projeção apenas para os estados situados na região Norte (Acre, Amazonas, Amapá, Pará, Rondônia e Roraima) poderá haver a redução de cerca de 71.000.000 ha (setenta e um milhões de hectares) de área protegida, área que é superior ao somatório de todas as unidades de conservação federais situadas na Amazônia Legal, de proteção integral e uso sustentável (61.598.042 ha)

. Se considerada a possibilidade de existência de uma infinidade de posses, não cadastradas pelo Incra, a redução da área protegida poderá ser ainda maior.

(10) Para essa estimativa foi considerado que os imóveis estão localizados em área com formações florestais, com Reserva Legal de 80% da área, exceto para o estado de Roraima em que foi considerada a formação savânica e Reserva Legal de 35%. O número de propriedades por área de módulo fiscal em cada estado foi obtido a partir de dados disponibilizados pelo Incra (http://www.incra.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=category&layout=blog&id=153&Itemid=18
2, acessado em 18 junho de 2010). Acre: 14.265 propriedades com módulo fiscal de 100 há e 7450 com módulo fiscal de 70 ha; Amazonas: 17.899 propriedades com módulo fiscal de 100 há, 41.512 com módulo fiscal de 80 há e 2.899 com módulo fiscal de 10 ha; Amapá: 3.948 propriedades com módulo fiscal de 70 ha e 5.947 com módulo fiscal de 50 ha; Pará: 49.599 propriedades com módulo fiscal de 75 ha, 42.426 com módulo fiscal de 70 ha, 7.084 com módulo fiscal de 65 ha, 27.627 com módulo fiscal de 55 ha, 2.196 com módulo fiscal de 50 ha, 731 com módulo fiscal de 7 ha e 148 com módulo fiscal de 5 ha; Rondônia: 77.396 propriedades com módulo fiscal de 60 há; Roraima: 16.522 propriedades com módulo fiscal de 100 ha e 10.270 com módulo fiscal de 80 ha..
(11) http://www.socioambiental.org/uc/quadro_geral, acessado em 18 de junho de 2010




 Em prejuízo da segurança jurídica e demonstrando o total desprestígio aos milhares de agricultores que cumpriram a legislação vigente, o substitutivo propõe a suspensão de multas ambientais aplicadas e impede autuações para supressões ilegais de vegetação ocorridas até 22 de julho de 2008. Essa verdadeira anistia é desacompanhada de qualquer medida de recuperação ambiental, sendo vinculada apenas ao preenchimento de um cadastro ante ao órgão ambiental competente.
O conjunto das modificações propostas e analisadas nessa Nota Técnica contrariam frontalmente as disposições constitucionais que tratam das obrigações do Poder Público para dar efetividade ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e, se aprovadas pelo Congresso Nacional, colocarão em risco não somente o equilíbrio ambiental, mas o bem estar da população, especialmente de sua parcela mais desprovida de recursos.

Brasília, 28 de junho de 2010





22 de julho de 2010

DE VÍTIMA A RÉU (2)


UM CASO REAL

Por Darci Bergmann


Um proprietário rural foi multado porque houve queimada numa área de pastagem nativa. A queimada realmente ocorrera, mas a autoria do crime ambiental não poderia ser atribuída ao proprietário. Fatos relevantes não foram levados em conta. O autuado sempre foi contra o uso do fogo. Tem um histórico de plantador de árvores nativas e de preservar a vegetação ciliar nas suas propriedades. A sede da fazenda principal é rodeada de bosques com espécies nativas plantadas. Nunca permitiu a caça em suas terras. Nas pastagens nativas faz a roçada do pasto seco no final do inverno, o que aumenta o teor de matéria orgânica no solo. Isso também melhora o desempenho das espécies nativas forrageiras.




 
Numa gleba de terras, localizada próximo a uma vila e margeada por uma rodovia federal e também por estradas vicinais, três máquinas ceifavam o pasto seco. Foi no dia 27 de Setembro de 2007, o último da semana dedicada aqui no Sul do Brasil à Festa Anual das Árvores. A roçada estava na fase final e de repente do lado norte, próximo ao vilarejo e na face margeada por uma estrada vicinal, irrompeu o fogo. Os donos se encontravam na sede da fazenda principal a doze quilômetros dali. Os empregados e o capataz tentaram conter as chamas. O filho do proprietário fora avisado do sinistro e imediatamente buscou auxílio de outras pessoas no vilarejo próximo. Ao anoitecer daquele dia, o proprietário tentou fazer um BO - Boletim de Ocorrência, no posto da Brigada Militar da Vila. Os poucos soldados estavam em outra diligência. A queixa não foi feita ali e nem na cidade na Delegacia de Polícia. A queixa formal poderia atenuar já de início a sua culpabilidade quanto à autoria da queimada. Trinta e nove hectares foram atingidos pelo fogo. Mais de uma semana depois uma equipe da Patrulha Ambiental esteve no local dos fatos. Lavrou o auto de infração com pesada multa ao proprietário. Mas quem teria sido o autor do fogo? Que proprietário faria gastos com roçadas para depois atear fogo na palha? Semanas antes toda a área havia sido gradeada no entorno para evitar a entrada do fogo, principalmente devido à proximidade do vilarejo e das estradas vicinais e rodovia federal.

Em 20 de outubro de 2007 fiz vistoria na área. O laudo foi anexado na defesa da vítima e agora réu por crime ambiental. A questão foi parar no Ministério Público do Estado. O MP possui uma espécie de câmara técnica na área ambiental e esta elaborou um extenso parecer sobre o caso. O parecer do MP se baseou apenas no laudo da Patrulha Ambiental. Os emitentes de tal laudo não fizeram nenhuma vistoria a campo. Partiram do pressuposto de que o autor da queimada era o proprietário. Fizeram ampla exposição dos malefícios ambientais das queimadas, como se a vítima e agora réu desconhecesse o tema. Ora, justamente por saber dos prejuízos ambientais e econômicos do fogo, o proprietário autuado fazia as roçadas. E a pergunta continua: quem foi o autor da queimada ou o seu mandante?

21 de julho de 2010

DE VÍTIMA A RÉU (1)


Por Darci Bergmann

Na adolescência, fumei alguns cigarros ainda que esporàdicamente. Aquela história de imitar os adultos sem medir as conseqüências. Naquela época meu pai era fumante, mas por volta dos seus cinqüenta anos, o vício cobrara um preço alto e a realidade ali estava: a nicotina e todos os elementos nocivos aspirados junto com a fumaça deflagraram uma debilitação cardíaca e um quadro de enfisema pulmonar. Ali tive a primeira demonstração da propaganda enganosa que os fabricantes inescrupulosos lançam mão para venderem produtos prejudiciais à saúde. Naqueles tempos, a propaganda era feita com cartazes e nas revistas e também pelo rádio. É claro que por auto-estima, parei de fumar. Meu pai viveu um pouco além dos setenta anos. Não fosse o tabagismo teria acrescentado mais alguns anos de vida e com boa qualidade, já que tinha uma boa alimentação e não comia doces.

Com o tempo tornei-me um antitabagista convicto, pois o fumante, além de vítima, extrapola aos que o cercam as mazelas do vício. Os fumantes passivos também sofrem. O tabagismo provoca outras tragédias, estas contra o patrimônio e a Natureza. As pontas de cigarros acesas são causas de incêndios na cidade e nos campos. Pessoas deitam na cama e ali fumam. Adormecem e a bagana acesa inicia o sinistro. Na zona rural, já flagrei queimadas que iniciaram porque alguém que passava de carro jogou uma bituca de cigarro na macega seca pela estiagem. Nesses casos, o vento avoluma o fogo e metros adiante o que era verde se desidrata e a queimada se transforma em tragédia. Consome o capim, arbustos e o que vive neles de animais. Os que não morrem se tornam vítimas porque perdem os refúgios. As árvores são atingidas pelo calor do fogo que lhes consome a casca, causando o anelamento. Algumas resistem, mas a maioria morre a partir da parte afetada pelo calor das chamas.

A queimada na zona rural é enquadrada como crime ambiental. Mesmo que tenha como causa uma bagana de cigarro, a combustão espontânea, faísca de escapamentos de veículos ou um raio em tempestade seca. O proprietário da área afetada responde perante a lei. Supõe a doutrina legal que o dono deveria ter controle do seu patrimônio e como tal tomar medidas preventivas que evitem as queimadas. A chamada responsabilidade objetiva. Parece fácil, em teoria. O mesmo Estado que aufere recursos financeiros com venda de cigarros e assemelhados ainda estimula os seus fabricantes com incentivos fiscais, com a alegação de que o setor gera emprego e aumenta o PIB. Pois esse mesmo Estado é o que move o tacão da lei sobre proprietários que são vítimas das queimadas involuntárias.

Quero deixar bem claro, que sou contra as queimadas, radicalmente, pois já tenho sido vítima delas. Nenhum povo, nenhuma cultura, nas condições do Planeta já com escassez de recursos naturais, pode permitir a prática das queimadas inconseqüentes. Mas há que separar-se o joio do trigo. Por mais que alguém tome medidas acauteladoras, um incêndio pode ocorrer, até de forma criminosa e aí a vítima passa a réu, no entendimento de autoridades cartoriais. Presenciei tais situações que oportunamente deverei trazer a público. É preciso encontrar maneiras de não punir vítimas de crimes ambientais que não cometeram. Nos moldes atuais, o contradito legal custa caro à vítima transformada em réu. É penoso ser proprietário e guardião do patrimônio natural. Invasões, assaltos, queimadas e deriva de agrotóxicos rondam o proprietário rural por mais prevenido e consciente que seja. Se há quem, por teimosia, faz uso sistemático de práticas nocivas ao meio ambiente, que se lhe aplique o corretivo da lei. Diferente é quando alguém, cujo trato com o patrimônio natural tem um histórico de respeito e sustentabilidade, é punido por crimes ambientais que ocorreram por ação de terceiros.

Finalizo com uma pergunta. Quem multará o Estado quando as unidades de conservação e terras que estão sob seus cuidados são assoladas por queimadas?


13 de julho de 2010

Portal promove tecnologias e produtos para construções verdes

12/07/2010 - Fonte: CarbonoBrasil




Em um levantamento feito com nove mil consumidores de diversos países, conduzido pela Penn, Schoen & Berland Associates (PSB), constatou-se que apesar de a maioria dos consumidores em todos os países pesquisados acharem que produtos verdes custam mais, brasileiros e indianos consideram que o maior empecilho para sua compra é a falta de opções.

Com o objetivo solucionar esse problema, foi criado o portal Construção Eficiente que divulga produtos, tecnologias e serviços verdes para a construção civil. O site aproxima profissionais e empresas dos clientes que buscam opções ecológicas para suas casas e empreendimentos. O portal hoje já conta com mais de 400 produtos disponíveis e 100 fornecedores.

Consumidores e empresas interessadas podem pesquisar produtos/projetos, aprender sobre novas tecnologias, visualizar detalhes técnicos e fotos, solicitar orçamentos e iniciar uma negociação de forma simples e gratuita.

Já os fabricantes, lojistas e profissionais de produtos e serviços ecológicos podem divulgá-los e ter acesso a esta rede mostrando o que de fato estão produzindo e como podem colaborar com o meio ambiente.

Estima-se que 6% dos consumidores brasileiros praticam o chamado consumo consciente.

Arborização urbana: Uma carta é a semente de milhares de árvores


Carta escrita por Darci Bergmann, em 03/08/1977, ao semanário O JORNAL, de São Borja/RS

CARTA


Sr. Diretor,

Dirijo-me a V.S. no sentido de obter apoio de O JORNAL para tratar de um assunto que, infelizmente, não está sendo levado muito a sério. Trata-se do plantio de árvores ornamentais em nossa cidade.

Já é sabido que as plantas desempenham papel de relevância no embelezamento, quebrando a monotonia, ao mesmo tempo em que influem no aumento da taxa de oxigênio atmosférico, a ponto de a Organização Mundial da Saúde recomendar a proporção de 25 m² de área verde por habitante urbano, o que para São Borja daria em torno de 100 hectares. Portanto bem acima do que realmente dispomos.

De outro lado fala-se muito em turismo e nas possibilidades de sua implantação. Convém esclarecer, no entanto, que uma das premissas básicas do turismo é ter o que mostrar. Ninguém, por exemplo, vai a Canela e Gramado para ver mais edifício, mas sim para ver as belezas naturais, os jardins, os parques, que a população ali sabe tão bem preservar em seu estado natural.

Da mesma forma, nós são-borjenses precisamos nos conscientizar de que nossa potencialidade turística reside em nossa riqueza folclórica, aliada ao meio natural, isto é, à Natureza propriamente dita, tanto no interior, como na cidade.

No aspecto urbano já existem algumas iniciativas. A Prefeitura plantou essências ornamentais em algumas ruas. Particulares também o fizeram, plantando mudas e conservando, exemplarmente, árvores nativas, verdadeiros monumentos verdes. Mas tudo isso ainda é pouco. A comunidade toda, através das entidades sociais e dos educandários, deverá se mobilizar, a exemplo do se fez em outras cidades. Cito, a propósito, um trabalho pioneiro realizado em Uberaba (MG). Em cada quarteirão daquela cidade, os moradores nomearam um coordenador, o qual dirigiu o plantio de árvores ornamentais. Cada morador plantou e adotou uma árvore. Hoje, Uberaba orgulha-se de ser uma das cidades mais arborizadas do País. Em São Leopoldo temos outro exemplo dignificante. Acadêmicos da UNISINOS lideraram campanhas para plantio de árvores ornamentais e frutíferas e, assim, milhares foram plantadas no perímetro urbano.

E nós aqui em São Borja será que vamos continuar assistindo passivamente que uma minoria de pessoas continue depredando, inescrupulosamente, um patrimônio verde que é da comunidade? Esse patrimônio é fruto daqueles que, por amor à sua cidade, deixaram nesse chão as raízes, o exemplo para que plantemos mais árvores e preservemos aquelas já plantadas.

Creio que a irracionalidade destrutiva de alguns será sobrepujada pelo espírito comunitário são-borjense, tão vivo e tão presente. Creio na sensibilidade desse povo em preservar e plantar árvores. Essas árvores, que também são obra do Criador e que precisam ser defendidas por todos aqueles que se dizem seres racionais.

Atenciosamente

Engenheiro agrônomo Darci Bergmann


Esta carta iniciou a campanha “Plante uma Vida, Plante uma Árvore”. Com a extinção de O JORNAL, Darci Bergmann continuou os trabalhos, então como Projeto Plante uma Vida, Plante uma Árvore.


11 de julho de 2010

AJUDE A LIMPAR SUA CIDADE



GARRAFA LONG NECK, PROBLEMA SÓCIO-AMBIENTAL



Você talvez não se dê por conta dos problemas causados pelas garrafas tipo long neck.

Só quem leva a melhor nesse tipo de produto é o fabricante. Primeiro porque o consumidor paga mais. Segundo, o fabricante exime-se da responsabilidade de coletar as embalagens, visto que elas não são retornáveis.



AS GARRAFAS LONG NECK CAUSAM ACIDENTES E DANOS AMBIENTAIS.



Muitas pessoas já se feriram com os estilhaços das garrafas que são arremessadas nas vias e logradouros públicos.

Além disso, a poluição visual interfere na auto-estima das pessoas. Quem quer morar numa cidade suja?

Os fabricantes transferem os custos de coleta das embalagens e estilhaços às prefeituras e estas ao contribuinte.

Vai à sanção do presidente da república proposta de lei sobre a Política Nacional de Resíduos Sólidos.

Também devemos pressionar prefeitos e vereadores para que proíbam nos municípios a venda de bebidas em garrafas tipo long neck.

Saiba mais:

http://darcibergmann.blogspot.com/2010/07/vai-sancao-politica-nacional-de.html





http://aspanrs.blogspot.com/

9 de julho de 2010

Vai à sanção a Política Nacional de Resíduos Sólidos


Um dos mais sérios problemas do país, que é a ausência de regras para tratamento das 150 mil toneladas de lixo produzidas diariamente nas cidades brasileiras, é o principal alvo de um projeto aprovado na noite desta quarta-feira (7) pelo Plenário do Senado. O substitutivo da Câmara dos Deputados ao projeto de lei do Senado (PLS 354/89) que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos será encaminhado à sanção do presidente da República. A proposta tramitou por 21 anos na Câmara dos Deputados.

Lixões
O projeto proíbe a criação de lixões, nos quais os resíduos são lançados a céu aberto. Todas as prefeituras deverão construir aterros sanitários adequados ambientalmente, onde só poderão ser depositados os resíduos sem qualquer possibilidade de reaproveitamento ou compostagem. Será proibido catar lixo, morar ou criar animais em aterros sanitários. O projeto proíbe a importação de qualquer lixo.

Com 58 artigos que ocupam 43 páginas, a Política Nacional de Resíduos Sólidos apresenta algumas novidades, entre elas a "logística reversa", que obriga fabricantes, importadores, distribuidores e vendedores a realizarem o recolhimento de embalagens usadas. Foram incluídos nesse sistema agrotóxicos, pilhas e baterias, pneus, óleos lubrificantes, lâmpadas (todas elas) e eletroeletrônicos.
Responsabilidade

Além disso, é introduzida na legislação a "responsabilidade compartilhada", envolvendo a sociedade, as empresas, as prefeituras e os governos estaduais e federal na gestão dos resíduos sólidos. A proposta estabelece que as pessoas terão de acondicionar de forma adequada seu lixo para a coleta, inclusive fazendo a separação onde houver coleta seletiva.





A proposta prevê que a União e os governos estaduais poderão conceder incentivos à indústria de reciclagem. Pela nova política, os municípios só receberão dinheiro do governo federal para projetos de limpeza pública e manejo de resíduos sólidos depois de aprovarem planos de gestão. Os consórcios intermunicipais para a área de lixo terão prioridade no financiamento federal. As cooperativas de catadores de material reciclável foram incluídas na "responsabilidade compartilhada", devendo ser incentivadas pelo poder público.

Incentivo
Com os incentivos e as novas exigências, o país tentará resolver o problema da produção de lixo das cidades, que chega a 150 mil toneladas por dia. Desse total, 59% vão para os "lixões" e apenas 13% têm destinação correta, em aterros sanitários. Em 2008, apenas 405 dos 5.564 municípios brasileiros faziam coleta seletiva de lixo.

Com informações da Agência Senado (Texto acima)
Todas as fotos desta matéria são de autoria de Darci Bergmann

Comentário do Plante uma Vida, Plante uma Árvore: A legislação é um dos fatores que podem contribuir para a destinação mais correta do lixo. Mas deve ser complementada com outras medidas como a educação ambiental. As fotos desta matéria mostram que ainda há pessoas com ensino médio e superior completos que não se preocupam em fazer a separação dos componentes do lixo. Os receptáculos de ferro, chamados de lixeira, como o da foto, deveriam ser proibidos sobre os passeios. Eles causam acidentes e induzem pessoas a jogar lixo sem qualquer critério, principalmente de horários. Deveriam ser posicionados no terreno do condomínio ou da residência unifamiliar. 
Sobre incentivos à reciclagem é positiva a inclusão dos catadores. Mas pode haver também incentivo, por exemplo, à compostagem doméstica da fração orgânica. Assim, praticamente metade do lixo seria processado no local em que é produzido. Isto diminui a circulação de veículos para coleta e com isso também a poluição do ar. 
As garrafas tipo long neck e a logística reversa:  deveriam ser incluídos também outros produtos que deixam resíduos perigosos no ambiente. Um deles é a garrafa tipo long neck. Os vendedores de bebida não aceitam a devolução das embalagens e muitos consumidores as jogam na via pública. Os estilhaços de vidro causam acidentes e a sua coleta é mais difícil. O fabricante deixa aos municípios a responsabilidade pela remoção do seu lixo. Quem paga esse descaso é o contribuinte, como sempre. 







 
Saiba mais. Veja o tópico PRÁTICAS DE COMPOSTAGEM
Veja também: Lixo ganha importância

7 de julho de 2010

Carta ao Prefeito de Estrela-RS sobre Paisagismo Urbano

Senhor Prefeito
Gunther Ricardo Wagner
Prefeitura Municipal de Estrela
R. Júlio de Castilhos, 380
CEP 95880-000

                                             Porto Alegre, 22 de agosto de 1996.

                                             Prezado Senhor Prefeito


Agradeço o convite que me foi estendido para fazer uma visita à Cidade de Estrela - visita esta que teve lugar dia 13 de agosto de 1996 - para avaliação preliminar da situação ecológica, com ênfase na Praça Central, no novo Parque Esportivo e nas árvores das vias públicas.

Após o que pude observar, vejo-me numa situação algo difícil. Gostaria de poder fazer um relato todo positivo, com apenas algumas sugestões de ação complementar. No entanto, o somatório dos estragos que são consequência de tratamentos impensados e equivocados durante várias décadas é tal que já não se pode fácil ou rapidamente restaurar e reparar. O que podemos fazer de imediato é conter a continuação e ampliação dos danos.
Para chegar a uma situação de parques, jardins e arborização sadia, viçosa e bela precisamos de uma reorientação fundamental.
Quero deixar bem claro, entretanto, que, o que se constata em Estrela não é peculiar a esta cidade. Praticamente todas as cidades brasileiras, pequenas, médias ou grandes se encontram em situação semelhante. A coisa não é melhor em nossos países vizinhos. Quero citar apenas a Redenção em Porto Alegre, o Aterro do Flamengo e o próprio Jardim Botânico no Rio, outrora famoso. Durante as últimas décadas foi mantido por empresa de limpeza pública (!). O tratamento era todo em esquema esterilizante, os solos estão degradados, muitas das mais valiosas árvores estão precocemente decrépitas. Conheço este maravilhoso jardim desde os anos quarenta.Na época era maravilhoso! Em visitas sucessivas pude observar a progressiva decadência, inclusive a perda quase total de uma das mais valiosas coleções de plantas suculentas do mundo, por descaso. Outra coleção botânica valiosa, a coleção de cactáceas do Sr. Zuckerman, famosa no mundo, foi completamente perdida no Jardim Botânico de Porto Alegre.

Até a década de quarenta, tínhamos no Brasil excelentes jardineiros e grandes jardins, particulares e públicos. De lá pra cá houve uma decadência progressiva. Hoje, a quase totalidade dos que se dizem jardineiros não passam de tosadores de grama, varredores de pátio e mutiladores de árvores. A administração pública e os proprietários de jardins particulares muito raras vezes exigem mais do que isto. Temos ótimos viveiristas, isto sim, produtores de mudas para pomares e flores para corte ou coleção, como no caso de orquídeas e cactáceas ou bromélias, especialmente em São Paulo, mas os grandes jardins, quando não sucumbiram a fúria imobiliária, ou estão em decadência, ou estão devastados. A situação dos verdes públicos, em geral, é calamitosa. Onde sobram complexos valiosos, eles assim estão, mais por negligência que por atenção. Mas, quando menos se espera, recebem atenção, na maioria das vezes uma atenção destrutiva, pois, na cabeça de muita gente, tudo o que é natural, tudo que se desenvolve livremente, sem coação humana, é tido como "mato" e "mato", no linguajar brasileiro, tem conotação pejorativa.

O mais triste é que o público não nota e os administradores mal se dão conta do que está acontecendo, ou não dão valor. A maioria das pessoas está hoje tão alienada da Natureza, que com ela já não tem nenhum contato racional ou emotivo, não a sentem, não dialogam com ela, muitas vezes a temem. A prova mais patente desta situação é o estado das árvores nas vias públicas.

É quase impossível encontrar árvores bem conduzidas, intatas, hígidas. Quase todas sofrem as consequências de muitos anos de maus tratos - as chamadas "podas". Estão com seus troncos ocos ou parcialmente apodrecidos, os galhos também em estado de decrepitude. Um madeireiro que quer obter boas tábuas para móveis ou para construção não se interessaria por elas. Onde a administração pública deixa de "podar", o público reclama, insistentemente pede "poda" ou a pratica por conta própria, fazendo mutilações muitas vezes ainda mais drásticas que as oficiais. Além dos estragos causados pelas prefeituras e pelo público, temos as violentas agressões da CEEE (Companhia Estadual de Energia Elétrica-RS) que se acha no direito de, para proteger um cabo elétrico, por insignificante ou secundário que seja, poder praticar os mais absurdos vandalismos, tanto dentro como fora das cidades. Já ví demolirem figueiras centenárias, quando teria sido bem mais simples e mais barato desviar o fio. Os trabalhos não são entregues a pessoas qualificadas, mas a simples operários, que agem da maneira mais brutal possível - eficiente do ponta de vista deles. Não se importam sequer que os galhos que cortam, ao cair, antes de terminado o corte, rasguem lascas na parte inferior do tronco, ou eles decepam com machete ou machado, deixando dilacerada a ponta que sobra.

As prefeituras, as grandes empresas e outros donos de parques e jardins costumam achar que basta entregar a um agrônomo. Mas, infelizmente, os agrônomos brasileiros não aprendem jardinagem e no Brasil não temos escolas de jardinagem, que eu saiba. Oxalá esteja equivocado. Se alguém conhece uma, que me avise. Assim também, uma técnica tão simples e fascinante como é a "dendrocirurgia" - cirurgia de árvores - que na Europa e América do Norte chega a ser profissão respeitada (tree surgery; Baumkosmetik) entre nós é ignorada nas Escolas de Agronomia, nas Escolas de Engenharia Florestal e nas Faculdades de Biologia.

Hoje, também é comum arquitetos se arvorarem em paisagistas. Estes, com raríssimas exceções, não tem noção de biologia, ecologia nem falar. Significativo da alienação que muitos deles demonstram, é como projetam floreiras debaixo de escadas até no fundo de um corredor ou no lugar mais escuro de um saguão de entrada de edifício. Parece que nunca ouviram falar de fotossíntese. Burle Marx era uma das raras exceções, além de arquiteto, era grande botânico e tinha sensibilidade biológica.

Nas árvores de rua, a despreocupação com o solo é quase total. Em geral, se acha que encher a cova de esterco ou matéria orgânica mal decomposta na hora do plantio, resolve o problema para toda a vida da árvore. Assim elas já começam a sua vida doentes. Na maioria dos casos, as árvores têm seu solo coberto de pavimento impermeável no passeio e na rua, raras vezes lhes dão canteiro com solo aberto. Quando isto acontece o solo é pisoteado, compactado, e não se permite que se cubra de matéria orgânica. As folhas secas são tidas como lixo e religiosamente removidas. A água da chuva não tem como penetrar e não há recuperação de húmus. É de admirar-se como, apesar desta desconsideração, ainda muitas das árvores demonstram bastante viço e reagem bastante bem aos maus tratos, mas elas apanham sempre de novo. Por qualquer efeito das raízes sobre o pavimento da calçada, em vez de arrumar, levantar ou abrir a calçada, as raízes são logo ferozmente mutiladas, quando não se derruba a árvore toda. As prefeituras raras vezes punem os culpados.

Ultimamente, mesmo em cidades grandes como Porto Alegre, que tem um departamento de parques e jardins com mais de cem pessoas, além da incapacidade de tratar adequadamente as árvores adultas, está demonstrada em toda parte a inaptidão de conduzir árvores novas. Plantam mudas de espécies que atingem grande porte, do lado da rua em que corre o fio de alta tensão. Por que não limitar-se ao lado que não tem fio? Poderiam desenvolver-se livremente. É claro que poucos anos depois vêm a CEEE com seus macheteiros brutais... Em bairro da zona sul já ví plantarem paineiras (uma árvore que em quinze anos está frondosa com até 20 m de altura) debaixo de uma velha figueira que, de dentro de um jardim particular, estendia sua bela copa até o centro da rua (!), só porque, pela metragem, o lugar da muda era alí...

Não somente não se percebe sistema racional na localização das mudas, hoje, parece que não sabem mais o que é "educar", isto é, conduzir uma árvore. Ora, uma árvore isolada, em parque tipo britânico, com seus imensos gramados, acaba formando uma copa com saiote até o chão. Isto é muito lindo, mas, no passeio de uma via pública (em Londres também) as árvores devem ter tronco limpo até uma altura algo acima das cabeças dos transeuntes. Do lado da rua, a altura em que se abrem os galhos deve ser superior à altura dos ônibus e caminhões. Quer dizer que, após plantada, a muda precisa ser conduzida. Isto se faz com podão, não com serrote, machado, machete ou motoserra, enquanto os galhos forem finos, até a grossura de um lápis. Mas este tipo de trabalho não se faz uma vez e se esquece, é uma ação contínua que, conforme o caso, pode estender-se a toda a vida da árvore. Requer observação, acompanhamento, sensibilidade, amor, requer equipes bem treinadas de jardineiros motivados.

Uma atenção realmente absurda, desnecessária e feia, pois atesta alienação, mas ainda muito comum em nosssas cidades e até em propriedades rurais, é caiar de branco as árvores. Não consigo explicar-me de onde vem esta mania.

Em cima de árvores velhas costuma aparecer toda uma flora muito especial, que a maioria das pessoas classifica simplesmente de "parasitas" e, muitas vezes, passa a "limpar" as árvores, retirando-as todas. Ora, com uma única exceção, a erva-de-passarinho, estas plantas não são parasitas. Orquídeas, bromélias, Rhipsallis (cactus com ramas filiformes colgantes), peperômias, samambaias, musgos, quando vivem sobre árvores, não são parasitas, são epífitas (sobre plantas), elas não sugam seiva da árvore, vivem do húmus que se forma na casca dos galhos e troncos velhos e da poeira do ar. Além de manterem em suas raízes e às vezes sobre as próprias folhas, bactérias e fungos especiais que, em simbiose com elas, fixam nitrogênio do ar, elas sabem retirar os demais elementos de que necessitam, como, por exemplo, o fósforo, cálcio, potássio e outros, até os últimos microelementos, filtrando as sujeiras do ar. Se as pessoas fossem mais observadoras da Natureza, notariam que estas mesmas espécies também ocorrem sobre rochas. Lá são consideradas epílitas (sobre pedra). Como poderiam ser parasitas nestas condições? Quem já não observou certas bromélias, entre elas a Tyllandsia (cravo do mato), prosperar em cima de fios de telefone! A barba-de-pau, lindo enfeite de nossas velhas figueiras, também é bromeliácia do gênero Tyllandsia, ela consegue se alimentar exclusivamente do ar.

Quanto à erva de passarinho, ela é hemiparasita, quer dizer, ela é apenas parcialmente parasita. As plantas verdadeiramente parasíticas, entre elas a orobanche e a cúscuta são muito raras e desconhecidas de nosso público. Elas não têm fotossíntese, portanto não têm folhas verdes. Se a erva de passarinho tem folhagem luxuriante e bem verde é porque rouba da planta hospedeira apenas seiva bruta, não seiva elaborada como fazem as verdadeiras parasitas. Ela faz sua própria fotossíntese.

Quê fazer com ela? Depende! Em um pomar comercial, onde o alvo é o máximo de produtividade, é claro que não podemos tolerá-la. Temos que retirá-la enquanto for pequena. Entretando, um aspecto que a maioria dos agrônomos modernos desconhece ou não leva em consideração - o aparecimento e a proliferação de erva-de-passarinho sobre uma árvore é sintoma de fraqueza da mesma. Em árvore hígida, a erva não tem vez! Ela está me dizendo que cometí um ou vários erros no trato que dou às minhas plantas, principalmente no que se refere ao solo. A saúde do solo é o fator mais determinante para a sáude do vegetal.

Agora, em praças ou parques, quando a proliferação da erva-de-passarinho está muito adiantada, como em alguns dos velhos eucaliptos da Redenção, em Porto Alegre, nos velhos plátanos de Morro Reuter, prefiro deixá-la. Sua retirada total deixaria a árvore quase nua. Por que não, em parque ou praça, mostrar ao público fenômeno tão interessante? Os frutos desta planta são excelente alimento para muitos pássaros e ela é uma das mais importantes ervas medicinais, tem a ver com prevenção do câncer! Se aprendermos, em nossos parques e jardins, a dar um tratamento adequado ao solo (veja mais adiante) a erva-de-passarinho se tornará o suficientemente rara para passar a ser atração, não praga.

Gostaria de poder assessorar intensivamente a Prefeitura de Estrela e muitas outras na questão do cuidado e trato das árvores. Infelizmente, meus inúmeros e variados compromissos em cinco continentes não mais me permitem assumir novos encargos. Sugiro, portanto, a esta Prefeitura e a outras que manifestarem interesse, a entrar em contato com a Prefeitura de Santa Cruz do Sul, onde estamos treinando equipe de dendrocirurgia e reorientando parques e jardins, um trabalho recém iniciado e que se estenderá por vários anos. Poderão acompanhar aqueles trabalhos.

Praça Central
Infelizmente, quando tive oportunidade de ver esta praça, já estavam em andamento os trabalhos de reforma. Pena, teria gostado de dar-lhes orientação bem diferente!

Esta praça sofre de todos os males que já citamos acima. As velhas árvores estão decrépitas, com os estragos que sempre são a consequência de podas desnecessárias ou de falta de dendrocirurgia após estragos causados por ventanias, e todas sofrem de deficiências nutritivas, uma vez que o solo está totalmente degradado. Mas também nisto não temos situação peculiar a Estrela. Quase todas as praças, em quase todas as nossas cidades, estão em situação parecida.

Logo me chamou a atenção o solo. Em quase toda a extensão da Praça ele está morto, compactado, nú. Em parte da área se tentava manter gramado em lugar inadequado, com muita sombra, e em toda a parte as folhas secas eram varridas e o corte da grama era levado embora. Não sei se foram usados adubos químicos ou agrotóxicos. Nossos "jardineiros" não têm mais noção de húmus. Ora, folha seca não é lixo, não é a mesma coisa que embalagens plásticas, cacos de vidro, tocos de cigarro com filtro, latas, etc. Debaixo das árvores e dos arbustos ou ervas deve permitir-se o acúmulo das folhas que caem. Elas formam uma boa proteção para o solo, mantendo a umidade, evitando erosão e, a medida que se decompõem, formam húmus, alimentam a microvida e devolvem nutrientes minerais à terra.

Por quê será que é tão difícil, as pessoas entenderem este aspecto fundamental da vida dos vegetais??? Os solos da grande floresta tropical úmida da Amazônia estão entre os mais pobres do mundo, em termos de nutrientes minerais. Aquelas frondosas árvores se mantêm com a reciclagem completa e rápida dos nutrientes pelas folhas secas que caem e são logo decompostas e reabsorvidas.

Para os que gostam de varrer folha seca - em dia de chuva, pergunto - o qué é melhor, caminhar sobre fôfo tapete de folha seca ou em solo nú? A folha seca não suja o sapato!

Em gramados, é claro, folhas secas, se forem grandes, podem ser vistas, por alguns, como antiestéticas. Neste caso, se forem recolhidas, devemos levá-las a um composto e, mais tarde, devolver o terriço ao gramado. Quanto à tosa, melhor é tosar com mais frequência, para que o corte seja mais curto e deixá-lo alí mesmo. Ele será reabsorvido pelo gramado. O solo se manterá vivo e fértil. Em Brasília, se pode observar muito bem como todos os gramados, especialmente nos taludes dos trevos de tráfego, estão se degradando até morrer. Tenho observado como o produto da tosa é cuidadosamente ensacado em sacos plásticos e levado ao lixão. Por outro lado, por que insistir em gramado em taludes íngremes? Bem mais sustentáveis e belos são complexos arbustivos.

Na reestruturação da Praça, uma vez que ela é toda sombreada, devem ser abandonados os gramados. Nos canteiros, poderão ser mantidos complexos permanentes de plantas de sombra, arbustivas ou herbáceas. Alguns canteiros ou partes deles poderão ser mantidos apenas com a cobertura de folhas secas caídas das árvores. Isto teria valor educativo para o público que precisa aprender o que é o processo de humificação e mineralização da matéria orgânica num ecossistema. Deixemos também que germinem e se desenvolvam, pelo menos até o ponto em que se possa decidir se ficam ou serão transplantados, as mudas que germinam das sementes que as árvores deixam cair. Este é o processo natural de rejuvenescimento do bosque.

Infelizmente foi decidido fazer pavimento de mosaico português nos caminhos. Este tipo de pavimento, se for bem feito, é impermeável à agua da chuva. A situação das árvores, já precária, só poderá piorar. Seria preferível um pavimento de paralelepípedos ou lajes de pedra com frestas abertas, nas quais se desenvolveriam musgos. Isto dá um efeito muito belo, que será tanto mais belo quanto mais velho ficar o pavimento. Um pavimento assim contribui para a melhora do solo. Debaixo das lajes ou pedras, uma vez que haverá penetração da água da chuva e do oxigênio do ar, se desenvolve um complexo de microvida e proliferam minhocas que movimentam matéria orgânica e promovem humificação. Um pavimento impermeável, ao contrário, contribui para o ressecamento e empobrecimento do solo subjacente.

Pude constatar que no processo de retirada do velho pavimento, trabalho este feito em parte com máquinas pesadas, estas causaram alguns graves danos nos troncos de árvores e arbustos. Serão necessários trabalhos de dendrocirurgia. Outro estrago muito grave foi infligido às duas velhas grevilhas. As raízes, junto ao tronco foram brutalmente agredidas com cortes, aparentemente à machado, para ajustá-las ao novo meio-fio, em vez de ajustar este à árvore ou, o que teria sido melhor e mais educativo, interromper o meio-fio junto à árvore. Agora só resta retirar a respectiva parte do meio-fio, para expôr totalmente as grandes feridas e protegê-las com hidro-asfalto.

Durante os próximos meses e anos, terá que ser, então, observado e acompanhado o processo de cicatrização, com renovação da pintura sempre que ela se desgastar ou aparecerem fendas e rachaduras no lenho exposto. Provavelmente haverá necessidade de dendrocirurgia. Espero poder voltar a Estrela oportunamente, já em 1997, para ajudar na condução dos trabalhos.

Mais estragos foram causados pelas valetas que foram abertas para a colocação de cabos elétricos subterrâneos. Estes poderiam ser colocados em profundidade bem menor e, poderia ter havido mais respeito às raízes atingidas. Quando se deixa este tipo de trabalho a cargo, simplesmente, de operários, é claro que eles não têm condições de sequer se dar conta dos estragos que causam.

Quanto aos dois velhos cedros na entrada da Praça, na frente da Prefeitura, fui consultado se poderiam ser retirados. Ora, a Prefeitura tem autonomia para fazê-lo. No entanto, se é verdade que estas árvores estão em mau estado, como praticamente todas as árvores da Praça, seu estado poderá ser melhorado com um bom trabalho de dendrocirurgia. Pessoalmente, eu prefiro que sejam mantidas. Uma árvore velha, como uma pessoa velha, uma construção velha, é um processo histórico irreversível. Podemos derrubar em dois minutos uma árvore de cem anos. Entretanto, para que uma mudinha nova chegue a esta idade, precisamos esperar cem anos. A decisão está com a Prefeitura, ela demostrará ou não reverência diante de algo que tem história e que merece respeito e atenção. Pessoalmente, preferiria que déssemos uma chance a estas velhas criaturas. Vamos observá-las mais dois ou três anos para ver até que ponto têm capacidade de recuperação. Atenção: as estruturas de alvenaria na base destas árvores serão certamente removidas e substituídas durante o que falta fazer nos trabalhos de remodelação. Este trabalho, se quisermos evitar o tipo de estrago que foi feito nas grevilhas, terá que ser feito com muita atenção e respeito!

Espero que a Prefeitura de Estrela decida acompanhar os trabalhos que estamos iniciando em Santa Cruz e destaquem funcionários motivados para serem treinados.

Chafariz
Sendo que o chafariz no centro da Praça será também restaurado - já estava parcialmente demolido quando me foi apresentado, não sei qual a nova forma arquitetônica que lhe será dada - espero que o volume e a superfície de pequeno corpo de água sejam ampliados e que lhe seja dado um tratamento biológico e não estéril como é costume entre nós. Nas praças e jardins públicos, o chafariz e espelhos d'agua costumam ser periodicamente esvaziados para "trocar água", é retirado todo o lodo biológico que se forma no fundo, paredes e fundo são escovados e lavados - só falta regar com algum biocida para chegar a uma esterilização total... O que devemos fazer, é introduzir pelo menos uma ou duas espécies de plantas aquáticas, p.ex. a rosa d'água (Nymphaea) com suas lindas folhas semiflutuantes e flores espetaculares que, em nosso clima florescem quase todo o ano, e uma planta submersa que poderia ser a cabomba, ou Elodea, Valisneria (que forma gramado submerso) ou sagitária e outras.

O peixe mais indicado para este tipo de corpos de água pequeno seria o guarú-guarú, conhecido como barrigudinho. O cará acabaria com as plantas submersas. A pequena carpa dourada, por ser muito vistosa, possivelmente provocaria "artes" da garotada que tentaria pescá-la. Jamais introduzir carpas comuns ou Tilapias. Uma vez estabelecido este complexo vivo, é só deixar que mature e se equilibre por si mesmo. Caso algumas plantas se desenvolvam demasiado é só retirar o excesso. Este servirá de muda para outros jardins aquáticos.

Parque Esportivo
Esperavam de mim indicações mais o menos precisas sobre quais espécies de árvores plantar no Parque Esportivo. Na hora fiquei meio atônito. Não sabia o que dizer. Escolher entre espécies nativas? Pensando bem, prefiro que sejam exóticas de crescimento rápido, já que ali nada sobra de natural, tudo é artificial. Façam alamedas de plátanos, cinamomos, eucaliptos, grevilhas, pinus tahedra. Mas, por favor, aprovem na Câmara Municipal uma lei que proíbe terminantemente toda e qualquer "poda" convencional e destaquem algumas pessoas, de preferência jovens e motivadas, a quem possamos ensinar a condução de árvores novas.

Este parque foi construído a partir de um enfoque que é exatamente o contrário do que seria um enfoque ecológico. Uma preciosa área de várzea pantanosa, cuja função ecológica é amortizar cheias e servir de hábitat para grande diversidade biológica, assim como autodepuração das águas do rio, foi sumariamente enterrada debaixo de muitas dezenas de milhares de metros cúbicos de solo e subsolo, chegando-se a uma plataforma única, com todas as canchas esportivas no mesmo nível. A superfície entre as canchas está coberta de fino saibro, que não permite ver que tipo de material está por baixo. Suponho que é tudo saibro, como sucede quase sempre quando se faz terraplenagem em nosso país.

Para mim, a experiência foi tão chocante que me esquecí de pedir que me levassem ao lugar onde se fez a escavação ou demolição para obter o material de aterro. Deve haver ali uma grave e feia ferida na paisagem. Entre nós, quando se faz terraplenagem ou mineração a céu aberto, não costuma haver nenhum respeito paisagístico e ecológico. Os pesados tratores de esteira, retroescavadeiras, carregadeiras ou as máquinas conhecidas como "patrol" e as dragas não distinguem entre as diversas capas da formação geológica e edáfica. Solo e subsolo são brutalmente rasgados e misturados. Típico, é o que costuma ser feito nos assentamentos de BNH ou bairros industriais e outros. Primeiro, rebaixando ou aterrando, se prepara um deserto lunar. Depois, uma vez que em saibro nada cresce, vai se buscar terra preta. Para isso, se destrói, então, outro pedaço de natureza, roubando o solo que se precisa. Quase sempre se destrói mais um pedaço de bosque nativo. Não ocorre aos engenheiros, muito menos aos capatazes e operadores, separar primeiro o solo, guardá-lo ao lado da obra, para depois usá-lo na cobertura, seria até mais barato. Mas, do ponto de vista ecológico e paisagístico, diria, que mais de noventa porcento da terraplenagem que se faz em nosso país poderia ser evitada. O resultado estético seria bem outro e quanto petróleo, máquina e dinheiro se economizaria.

Agora, para plantar árvores naquela planície artificial e morta, teríamos que ver, primeiro, como está o substrato - se é saibro, pedregulho, argila ou solo. Hesito recomendar abrir grandes covas e trazer solo, pois não sei onde iriam obtê-lo e quais novos estragos isto significaria nos lugares de origem. Mas, com bom composto ou lodos orgânicos, poderíamos fazer solo no próprio local.

No centro do Parque sobrou um lago que, aparentemente, ainda está no nível do complexo palustre original. Não sei se tem ligação com o rio e, portanto, como se comportará nas cheias. Suas margens são íngremes, mostram a grossura do aterro que foi feito e estão parcialmente protegidas por pedras. Foi iniciado um certo ajardinamento, com gramados e arbustos nos taludes mas, foi também introduzida uma população excessiva de gansos que já iniciou trabalho sistemático de demolição deste ajardinamento. Ou se reduz o número de gansos para um ou dos casais, ou temos que aceitar taludes nús e erodidos. A água do lago ficará então mais barrenta do que já está. Não sei se foram introduzidas carpas. Estas sempre fuçam o fundo e não permitem a sedimentação necessária para que a água volte a ser cristalina como é num banhado natural. Espero que também não tenham sido introduzidas tilápias. A tilápia, um cará africano, é voraz devoradora de toda forma de vegetação aquática. Ela torna impossível o crescimento e a estruturação de complexos vegetais palustres, ancorados ou flutuantes. Se quisermos dar vida a este lago - pena que tem forma tão artificial - não podemos permitir a presença destas duas espécies exóticas.

Se o lago tem ligação com o rio, automaticamente se estabelecerá uma população complexa e equilibrada de espécies nativas - lambarís, carás, jundiás, cascudos e outros, incluindo a traíra. Haverá também moluscos e crustáceos, anfíbios e répteis, sem falar nos insetos que, diretamente, ou com suas larvas, alimentarão todas estas espécies.

Neste ponto, quero aproveitar para alertar para um problema ecológico muito grave da atualidade. Como hoje a grande maioria das pessoas está completamente alienada da Natureza, não se dá conta do mortal estrago que causa a iluminação elétrica nos insetos noturnos. Estes insetos, que passam o dia escondidos em lugares escuros, quando emergem para seus vôos à noite - com exceção daqueles que nos incomodam, como os mosquitos - por uma razão até hoje não completamente elucidada pelos biólogos, se vêem atraídos pelas lâmpadas elétricas. Ali ficam voando em círculos até a exaustão e acabam caindo mortos no chão. Se sobrevivem uma noite, morrem na segunda ou terceira. Outrora, como ainda hoje se pode observar em lugares de natureza intata, sem iluminação elétrica, as espécies de insetos noturnos eram tão ou mais numerosos que os diurnos. Quem já teve oportunidade de observá-los atenta e intensivamente, não pode deixar de admirar-se diante da incrível biodiversidade de formas e funções. Entre eles se encontram muitos dos polinizadores das flores e também muitos dos inimigos naturais das pragas de nossa lavoura. Portanto, a iluminação pública em parques e jardins deveria ser minimizada, não maximizada, e deveriam ser usadas só lâmpadas amarelas que não atraem estes insetos. Hoje, na Alemanha, algumas cidades, estão se conscientizando deste problema. Lá sobra pouco para salvar. Com aquela densidade de população quase não mais existe paisagem em que um inseto noturno possa voar algumas centenas de metros sem ir a morrer em uma lâmpada. Nós ainda podemos salvar muita coisa.

Voltando ao lago no parque esportivo - um inseto cuja larva é importante na alimentação dos peixes de água doce é a chamada "mariposa", que em certas noites de fim de verão saem aos milhões em vôo nupcial. As fêmeas fecundadas, carregadas de ovos, deveriam cair no rio ou lago de onde saíram. Se morrerem debaixo de uma lâmpada e forem varridas com o lixo na manhã seguinte, sofrem os peixes também.

Fundamental, ainda, para que o lago do Parque se transforme em um pequeno ecossistema é a introdução de plantas aquáticas - as mesmas que ali existiam quando foi eliminado o "brejo brabo": plantas flutuantes como a baronesa, Pistia, Salvinia, Limnobium, Lemna e outras, assim como plantas palustres ancorada como a Heteranthera, Myriophillum, pontederia, juncos, Typha, Thalia e outras. Quanto maior a diversidade mais intensidade de vida e mais belo será o lago.


Considerações finais
Este não é propriamente um "laudo técnico", é um trabalho de conscientização. O problema não é técnico, é quase filosófico, tem a ver com nossas atitudes e visão do mundo. Por isso, não se atêm só a detalhes da situação das áreas verdes de Estrela. Estas servem de exemplo, apenas. Procuro mostrar o absurdo dos enfoques predominantes e alertar para uma visão mais ecológica.

Agradeço à Prefeitura de Estrela a oportunidade que me deu. Há anos quero escrever algo semelhante, que sirva para todas nossas prefeituras. Permito-me, portanto, entregar este relato a outras administrações municipais, a escolas e a usá-lo em nosso trabalho de conscientização ambiental com crianças e jovens na Fundação Gaia.

Gostaria que este trabalho fosse, pela Prefeitura, entregue não somente a todos os seus funcionários, mas também a todas as escolas. Precisamos alertar, fascinar e motivar às crianças de hoje. Na maioria dos casos, nas escolas quase nada recebem em termos de conscientização ecológica, ao contrário, muitos professores contribuem para aumentar a alienação.

Espero, mais adiante, encontrar o tempo para ampliá-lo e generalizá-lo. Incluiremos, então, os aspectos de saneamento com propostas alternativas, baratas e acessíveis para o destino do lixo e o tratamento de esgotos.

José A. Lutzenberger