28 de dezembro de 2010

Plante uma vida, plante uma árvore

PLANTE UMA VIDA, PLANTE UMA ÁRVORE

RELATO DE UMA HISTÓRIA DE LUTA PELA PRESERVAÇÃO AMBIENTAL


O INÍCIO: Da ação individual à ação coletiva. O começo conforme narrado por Darci Bergmann: Em Janeiro de 1977, a uma temperatura ambiente de 40ºC, a cidade de São Borja parecia um deserto de vida. Na rua em que me encontrava, não havia sombra, nem pássaros, nem flores. Sob o sol escaldante tomei uma decisão: Vou iniciar uma campanha de arborização.
Em agosto, escrevi para O JORNAL, periódico local, propondo uma parceria para divulgação de trabalhos na área de educação ambiental que eu já iniciara então. Surgiu assim o projeto Plante Uma Vida - Plante uma árvore.
De uma campanha de arborização, passei a perceber a importância da inserção da comunidade num projeto mais amplo, visto que os problemas ambientais eram complexos. Aceitando convite do Centro Nativista Boitatá, entidade social recreativa, criamos o Departamento de Ecologia, que dirigi de 1978 a 1988, com ação significativa, distribuindo e orientando sobre o plantio de dezoito mil mudas de espécies nativas.




AS DIFICULDADES INICIAIS: Não havia viveiro. Tive que produzir minhas próprias mudas.Utilizava saquinhos de leite e latas de óleo comestível, arrecadadas no lixão e a partir de campanhas nas escolas em troca de mudas. Com amigos, realizamos os primeiros plantios em vias públicas. Não havia consciência preservacionista e os primeiros plantios sofreram ações de vândalos.


OS PRIMEIROS RESULTADOS: No outono e inverno de 1978, já havia em torno de 10.000 mudas no viveiro. Trezentas foram plantadas em vias públicas, com participantes da comunidade que se comprometeram em abrir as covas e cuidar do desenvolvimento da planta. Essa parceria, foi o ponto de partida de um grande projeto que se desmembrou em vários setores da comunidade, com múltiplas formas de atuação, como veremos resumidamente.








PALESTRAS DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL, envolvendo escolas, associações de bairros, Igrejas, clubes. Etc, somando mais de quinhentas palestras realizadas inclusive fora do município.







CURSOS DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA ADOLESCENTES.


FORMAÇÃO DO CLUBE DE ECOLOGIA VIVA A NATUREZA


Distribuição de 120.000 mudas de mais de 70 espécies nativas no Município. Em 1987, propus a um grupo de amigos a criação da ASPAN ( Associação São Borjense de Proteção ao Ambiente Natural), consolidando-se a fase de ação coletiva do projeto.


OBJETIVOS:
1) INICIAL : 1977 Implantar campanha de arborização na cidade de São Borja, RS.
2) OBJETIVOS AGREGADOS NO DECORRER DO PROJETO:
2.1) Ações educativas pertinentes à temática ambiental de forma abrangente;
2.2) Envolver a comunidade em um Projeto Ambiental;
2.3) Criação de uma ONG ambientalista;
2.4) Realização de Seminários ambientais.









3) OBJETIVOS DEFINIDOS PELA ASPAN EM 1987
3.1) Educação Ambiental formal e informal, em continuidade aos trabalhos já iniciados.
3.2) Projetos de proteção e recuperação ambiental em parceria com outras instituições.
3.3) Política ambiental a partir de uma estrutura executiva na Prefeitura Municipal.
3.4) Legislação Ambiental: Adaptação das leis municipais para a temática ambiental. Zelar pela aplicação das leis ambientais.
3.5) Realização de seminários ambientais bianuais.
3.6) Distribuição de material informativo sobre o meio ambiente na comunidade: boletins, folhetos, etc...
3.7) Criação de um boletim informativo periódico ( ainda não concretizado).
3.8) Viabilização de uma fundação ambiental.


DESENVOLVIMENTO E METODOLOGIA DE AÇÃO.
TRÊS EIXOS DE AÇÃO.


1.ÁREA DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL
1.1.PALESTRAS: Com a fundação da ASPAN, intensificamos a ação pedagógica de educação ambiental no ensino formal e participação em atividades junto a sindicatos e associações de moradores. O nome de seu idealizador e presidente, Darci Bergmann, torna-se referência no município e região em eventos que envolvem a questão ambiental.
1.2.CURSOS: Entre os mais importantes cabe destacar:
1.2.1.CURSO DE ECOLOGIA E MEIO AMBIENTE - Destinado a adolescentes. Realizado em duas edições com total de 40 participantes. Encontra-se em estudo parceria com o governo municipal para outras edições. O curso é dividido em aulas teóricas e práticas.
1.2.2. CURSO DE JARDINAGEM E PAISAGISMO: realizado antes da fundação da ASPAN. Participaram 46 pessoas. Foi dada ênfase à preservação da paisagem local, sua recomposição e as matas ciliares como elemento paisagístico e de preservação. Em decorrência deste curso, um produtor rural recompôs a mata ciliar em trecho do Rio Uruguai, com plantio de 40 mil exemplares de espécies nativas.

1.2.3PROGRAMA RADIOFÔNICO VIVA A NATUREZA: Esse programa de educação ambiental é apresentado desde junho de 1990, em edições de 30 minutos pela Rádio Cultura AM. O programa é pago, sendo mantido com a colaboração de empresas locais. Tem grande audiência. Já foram entrevistadas centenas de pessoas que repassaram experiências relativas ao meio ambiente.





1.3 ROTEIROS EDUCATIVOS
1.3.1. SUB- PROJETO CONHECER PARA PRESERVAR: Tem por objetivo a identificação de locais que, por sua natureza, possam servir como áreas de turismo ecológico, ou reflexão sobre a temática ambiental. São realizadas excursões, com diversos segmentos sociais, identificando-se áreas com mata ciliar, nascentes de rios, cascatas, áreas de desertificação, experiências de arborização, reciclagem, etc. É um projeto permanente, sem cronograma definido.
1.3.2. SUB-PROJETO DE REFLORESTAMENTO: Experiência com reflorestamento, na Chácara Itaperaju, localizada próxima à área urbana do município, em uma extensão de 7,7 ha. Mais de 400 espécies arbóreas nativas e exóticas, plantadas a partir de 1978, abrigando hoje espécies de animais silvestres como tatus , bugios( Alouata caraya), graxains, diversas espécies de aves, entre outras transformando-se em um acolhedor habitat. A cada ano mais espécies aparecem, propiciando acompanhamento da capacidade regenerativa de área devastada, com a contribuição do ser humano.







2- RELAÇÕES INSTITUCIONAIS E OUTROS PROGRAMAS
2.1. SUB-PROJETO 10 MIL IPÊS:
O Ipê roxo (Tabebuia avellanadae) é a árvore símbolo do Município desde 1980. A ASPAN propôs-se a plantar 10 mil exemplares dessa espécie em diversos locais da cidade e zona rural. Do total previsto, 8 mil exemplares já foram plantados.
2.2. CIRCUITO DOS IPÊS
Prevê o plantio de espécies de ipê roxo e ipê amarelo nas BRs de acesso à cidade e avenidas perimetrais. As avenidas Leonel de Moura Brizola, Presidente João Goulart e trecho da BR 472 já receberam centenas de exemplares. As queimadas, mal uso de ceifadeiras e vandalismo obrigaram a freqüentes reposições de mudas. Por sugestão da ASPAN, o Executivo Municipal, em decreto, criou o Circuito dos Ipês, prevendo a ampliação do plantio em outras artérias e logradouros públicos.










2.3 PLANO DIRETOR DE ARBORIZAÇÃO URBANA- A ASPAN preparou minuta de projeto para o PLANO DIRETOR DE ARBORIZAÇÃO URBANA, a ser desenvolvido em parceria com a Prefeitura Municipal e apoio de outras entidades.
O prazo máximo para a execução é de seis anos, paralelamente ao manejo da arborização já existente. Haverá necessidade de contratação de pessoal, tais como estagiários e monitores que serão treinados para esse fim. Esses atuarão no levantamento preliminar, rua por rua, em todos os bairros. Na fase seguinte começará o plantio propriamente dito. A legislação municipal de 1991 regulamenta o plantio e as podas das árvores em vias públicas. O plano diretor visa complementar o que já é previsto na citada regulamentação.
2.4. CONSELHO MUNICIPAL DE RECUPERAÇÃO E DEFESA DO MEIO AMBIENTE - A ASPAN teve participação ativa no referido Conselho, quando da elaboração do Plano Ambiental do Município.
Uma antiga reivindicação da nossa entidade foi concretizada: trata-se da criação da Secretaria Municipal do Meio Ambiente. Esperava-se que a partir daí o Poder Público Municipal conseguisse estabelecer compromissos e resultados efetivos na área de proteção ambiental. A atual administração municipal (2005-2008) mudou a estrutura, reunindo a pasta da Agricultura com o Meio Ambiente.
2.5. CONVÊNIO COM A FEPAGRO
A FEPAGRO - Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária mantém em São Borja uma Estação Experimental Fitotécnica. Por alguns anos foi efetuada parceria com a FEPAGRO-Cereais. O convênio não foi renovado, por dificuldades estruturais da FEPAGRO.


2.6. SEMINÁRIO AMBIENTAL :
A primeira edição foi realizada em maio de 1998, com a participação de 400 pessoas. Oito Universidades estavam representadas e mais de 50 municípios. A ASPAN contou com o apoio do Sindicato Rural de São Borja, da Urcamp (Universidade da Região da Campanha) e da Prefeitura e Câmara Municipal de São Borja. Pretendemos que as próximas edições tenham abrangência na área do Mercosul.
A segunda edição foi realizada de 3 a 5 de Junho de 2004, nas dependências da Comunidade Evangélica Luterana, no Bairro da Pirahy.
Com isso solidifica-se um dos objetivos do PROJETO PLANTE UMA VIDA PLANTE UMA ÁRVORE: criar-se um fórum permanente de discussão e busca de soluções nas questões ambientais. Além do caráter didático desses seminários, espera-se que eles possam traçar diretrizes para os municípios, estados e países.
O Rio Uruguai que nos divide politicamente como fronteira, nos une como referência geoambiental.
Outros seminários têm sido realizados por instituições diversas, sem a coordenação da ASPAN.


2.7. SEDE PRÓPRIA E CENTRO DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL.
Em 1999 foi adquirida uma área de 3,3Ha contígua à Estação Experimental Fitotécnica, com recursos da Fundação Francisco, sediada em Brasília. Nessa área pretende-se desenvolver um trabalho integrado de Educação Ambiental e implantação de um horto florestal com espécies nativas da região.






Com recursos do Projeto SEMEAR, o horto florestal já está em implantação.
A implantação do Centro de Educação Ambiental, com aulas teóricas e práticas, é mais um dos objetivos que nortearam o projeto Plante Uma Vida, Plante Uma Árvore e dependerá do aporte de recursos.


3.LEGISLAÇÃO AMBIENTAL
3.1.ELABORAÇÃO DE LEIS AMBIENTAIS:


No período em que Darci Bergmann atuou como vereador, por duas legislaturas, foram aprovados vários projetos de lei de interesse ambiental, tais como:
O que institui a espécie botânica Tabebuia avellanadae família Bignoniaceae, como árvore símbolo do Município; o que instituiu a espécie Furnarius rufus (João de barro), família Furnaridae, como ave símbolo do Município; a Lei Municipal dos Agrotóxicos; a lei que proíbe corte de exemplares arbóreos nela especificados, a lei nº 1046, de 1981, que proíbe o tabagismo em determinados locais, entre outras.
A ASPAN, em 1989, participou da elaboração da Lei Orgânica do Município, apresentando a minuta do capítulo de Ecologia e Meio Ambiente.
Em 1991, a convite do então prefeito, elaboramos proposta de regulamentação de dispositivos da LOM (decretos 3489/91 e 3573/91), sobre arborização urbana. Hoje estão incorporados na lei complementar 24/2001. A Lei Complementar 24/2001 compilou a maior parte das leis e decretos municipais já mencionados e dispositivos de leis estaduais e federais que surgiram posteriormente e foram transformados em projeto de lei pelo então vereador Antônio Veiga Machado, com apoio do bel. Gastão Ponsi, sócio da ASPAN.


3.2.DIVULGAÇÃO:
Diversos textos legais foram divulgados ao grande público pela ASPAN, especialmente o Código Florestal Federal (lei 4.771 de 15/09/65), a Lei de Proteção à Fauna (lei nº 5.197/67), Lei Federal dos Agrotóxicos (lei 8.102), além de outras.


3.3. AÇÕES JUDICIAIS
3.3.1 - CASO ICAMAQUÃ - SANGA FUNDA
Em 1989, a ASPAN recebeu denúncia de desmatamento em área de preservação permanente às margens do Rio Icamaquã, junto à foz da Sanga Funda, no Município de São Borja. Após vistorias e filmagens aéreas, foi encaminhada representação ao Ministério Público. Diante da gravidade da situação, o MP abriu inquérito, requerendo ação processual junto ao PJ. Desde então, até abril do ano de 2001, a ASPAN assessorou o MP. A ação resultou em acordo judicial onde os réus concordaram em: a) Recuperação das áreas desmatadas, respectivamente de 20,5 e 31 ha;
b) Auxiliarem financeiramente a ASPAN em projetos de arborização comunitária e educação ambiental. Em decorrência, surgiu o projeto SEMEAR.
O fato teve tal repercussão, que outros desmatamentos deixaram de ser consumados. Isso trouxe o respeito à nossa entidade ambientalista. Houve a participação decisiva nessa ação da Juíza de Direito Mara Lúcia Cóccaro Martins, que deu prioridade ao processo.





3.3.2 A QUESTÃO DO SÃO DONATO- Em 12/03/1975, Euclides Trichez, então governador do Rio Grande do Sul, pelo decreto 23.798, criou a Reserva Biológica de São Donato, entre outras. São mais de 3 mil ha de banhados, campos e matas, a 40 km de São Borja, nos Municípios de Itaqui e Maçambará. A área é cortada pela BR 472. O que parecia um ato ecológico do governador transformou-se em uma grande batalha desde então. De um lado, ecologistas como Antônio Gutierrez (in memorian), Rui Perez Antunes e Erlon Benites, de Maçambará; Gastão Ponsi, Darci Bergmann, Mario César Dutra Lago, Antonia Senhorinha Alves (in memorian), Antonio de Oliveira Alves, Amauri Parcianello, entre outros de São Borja. De outra parte, proprietários lindeiros e invasores na parte das matas. Eram intensas as drenagens e desmatamentos. Até uma draga do DNOCS trabalhou no local, abrindo valos, à revelia do Decreto. Com o rebaixamento do nível das águas, os fazendeiros avançaram as cercas, adentrando na reserva, com criação de gado e lavoura de arroz. A fauna, rica em espécies de aves (algumas oriundas da Patagônia), répteis como o jacaré-de-papo-amarelo (Cayman latirostris), mamíferos como capivaras, ratão-do-banhado, entre outros animais, teve drástica redução. Foram feitos abaixo-assinados, um deles com mais de duas mil assinaturas, entregue ao governador pelo ambientalista José Antonio Lutzenberger. Foram realizadas moções nos parlamentos municipais e Estadual de apoio à Reserva . Nada parecia surtir efeito, tal a pressão dos interessados na área. Os governos estaduais que se sucederam calaram diante dos fatos. Convém lembrar que era época do PRÓ–VÁRZEAS, um programa federal que foi fértil em corrupção pelo desvio do dinheiro público e danos ambientais.
Em 1997, o advogado da ASPAN, Gastão Ponsi, reestudou a questão. Daí entrou com ação civil pública contra o Estado do Rio Grande do Sul. Em 03/10/97, a juíza de direito Drª Rosmari Girardi, proferiu sentença histórica, condenando o Estado a tomar as medidas para a recuperação e implantação definitiva da Reserva Biológica de São Donato. O Tribunal de Justiça do Estado manteve a sentença inicial por unanimidade.
Em 1999, técnicos do Estado sobrevoaram a área com duas aeronaves, fotografando, filmando e fazendo levantamento com GPS. Uma batalha ainda não encerrada, de 25 anos, parecia encaminhar-se para um desfecho de sensatez ambiental. Foram anunciados recursos oriundos de termo de ajustamento entre o Estado e a REFAP para o início da demarcação da Reserva e a indenização dos proprietários, quando coubesse. São Borja teve até um escritório da SEMA, mantido com os recursos da REFAP. Ainda no governo Olívio Dutra, os recursos anunciados para a Reserva Biológica de São Donato foram, em sua maioria, destinados a outras unidades de conservação, frustrando a expectativa dos ambientalistas da região. Tudo voltou à estaca zero, apesar de existir sentença transitada em julgado, obrigando o Estado a implantar a Reserva.
Nesse longo tempo foram reunidos dados num amplo dossiê, com fotografias, filmes, notícias e artigos de jornais, manifestos e estudos técnicos sobre a Reserva Biológica de São Donato. Muitos companheiros desistiram da luta, em função de desgaste pessoal, ameaças e até pela descrença nas instituições.
A situação da Reserva hoje é deplorável, mas não irreversível. Certamente nos anos vindouros, as gerações futuras entenderão o significado desses mananciais de vida e continuarão a luta encetada. Foi assim na Flórida, com os Everglades, alagados drenados para o cultivo agrícola e que salinizaram as águas. Agora, os norte–americanos gastam fortunas tentando reverter esse quadro de degradação ambiental, mercê de modelos imediatistas de exploração dos recursos naturais. Foi assim em outros países. Como lá, aqui haverá de imperar o bom senso, ainda que passem gerações.












NOVOS RUMOS
As ações geradas por uma iniciativa individual tiveram desdobramentos com a criação da ASPAN e o envolvimento da comunidade. Agora, impõem- se novos desafios, entre eles:


ESTRUTURAÇÃO DA ASPAN
Passa pela profissionalização de algumas pessoas. Até agora todos os trabalhos foram baseados no voluntariado, com sacrifícios até financeiros de alguns abnegados. Os novos projetos em andamento só terão êxito se atendida essa premissa.
Mesmo com todas as dificuldades muitas tarefas ainda serão voluntárias. Não há mais como voltar no processo.


CRIAÇÃO DE UMA FUNDAÇÃO AMBIENTAL
Esse é um antigo sonho do idealizador do Plante uma Vida, Plante uma Árvore, engenheiro agrônomo Darci Bergmann. Esta fundação teria sua ação mais voltada para o conservacionismo, administrando áreas representativas dos ecossistemas da região. Os primeiros contatos já estão sendo feitos para a identificação de áreas especiais. A acelerada descaracterização da paisagem impõe urgência na questão. Não podemos esperar só dos governos a criação de parques e reservas naturais.
Cabe lembrar que essas áreas protegidas, além de bancos genéticos, servirão como local de estudos para as atuais e futuras gerações.
Os empresários e pessoas da comunidade são convidados a refletirem sobre esse tema e podem tomar iniciativas para que esse objetivo seja alcançado. A Fundação poderá reunir vários instituidores. É sabido que empresários e proprietários rurais conscientes já são receptivos à idéia, mas ainda faltam ações mais efetivas.


PAPEL IRRADIADOR DA ASPAN
Desde sua fundação, a entidade tem procurado fomentar a criação de ONG’s ambientalistas. Foi assim que surgiu com o nosso apoio a AIPAN (Associação Itaquiense de Proteção ao Ambiente Natural). Também o grupo Comandos em Defesa da Natureza, semelhante aos grupos de escoteiros, hoje com 70 crianças e adolescentes e tendo sede própria, teve apoio inicial do engº agrº Darci Bergmann, ainda quando no Departamento de Ecologia do Centro Nativista Boitatá. Trabalhar nas entidades associativas, estimulando práticas e compromissos de proteção ambiental será um papel importante da ASPAN, como já vem ocorrendo. A formação de multiplicadores ambientais, nos cursos junto à sede própria, serão de importância estratégica. Até trabalhadores de empresas e órgãos públicos poderão receber novos conhecimentos sobre a temática ambiental. Assim, serão importantes na implantação de medidas práticas de desenvolvimento sustentável.
Para citar um exemplo de como uma ação gera outra, irradiando-se nos diversos segmentos do tecido social, temos a área cultural e artística. Faz alguns anos, desencadeamos campanha de preservação dos nossos riachos. Uma fita de vídeo conseguida junto ao Instituto Goethe, em Porto Alegre, tinha, entre outros, o tema riacho, na visão ecológica. Passamos o material em várias escolas. Certo dia, fizemos uma palestra com pessoas de diversos setores da comunidade. Convidamos também compositores e intérpretes da música nativista. Depois da apresentação, sugerimos que os compositores presentes fizessem canções baseadas no tema proposto. Salvador Lamberty compôs a canção Riacho, interpretada por Cezar Lindemeyer e foi uma das finalistas da 49ª edição da Sentinela da Canção Nativa, de Caçapava do Sul, RS, nov,1997). Outros artistas estão apresentando canções que falam dos temas ambientais, como Mano Lima, Telmo de Lima Freitas, Jorge Dornelles, entre outros, a pedido da ASPAN.
Importante salientar que várias escolas já possuem grupos interdisciplinares de meio ambiente. Promovem debates, palestras, gincanas, etc. Tivemos papel decisivo nessa área e é com alegria que vemos a evolução desse trabalho. São as sementes que foram semeadas alguns anos atrás, ainda antes do surgimento da ASPAN, quando os professores de hoje assistiam às primeiras palestras do Projeto Plante uma Vida, Plante uma Árvore.
Essa força irradiadora da ASPAN e seus voluntários deverá ser mantida e ampliada. Com a estrutura administrativa em novos moldes e com a criação do Centro de Educação Ambiental não temos dúvidas de que os resultados serão ainda mais expressivos.





RESULTADOS
Decorridos 31 anos do PLANTE UMA VIDA, PLANTE UMA ÁRVORE os resultados são evidentes. Há aqueles efeitos difusos que permeiam os diversos segmentos sociais e que não se visualizam num primeiro momento. Fazem parte da consciência ecológica e são base da massa crítica. Este é o resultado maior do nosso projeto e é perceptível também pelos efeitos quanti e qualitativos que afloram, com veremos resumidamente:


1) O VERDE URBANO: Desde o início em 1977, a cidade aumentou a área verde. De algumas centenas de árvores em vias públicas, saltamos para em torno de 10 mil exemplares hoje. Ainda há um déficit de mais ou menos outro tanto. Ocorre que novas ruas foram abertas e as avenidas perimetrais ainda não foram arborizadas. Nos terrenos particulares também aumentou a arborização, diversificada , inclusive com frutíferas nativas. Isso recompôs a avifauna local. Muitas espécies retornaram por encontrarem alimento e abrigo. Até bugios aparecem na área urbana. As podas são mais amenas, obedecendo a critérios mais ecológicos.
Em 1981, na Vila Goulart, o Plante Uma Vida, Plante Uma Árvore arborizou uma área em parceria com os moradores. Tirou-se o lixo do local e hoje é uma praça cheia de verde e árvores nativas. Os moradores receberam também quatrocentas mudas de espécies frutíferas para melhoria da sua alimentação.



2) ZONA RURAL: O projeto agiu em três frentes na zona rural .


2.1. A Questão dos Agrotóxicos: foram dezenas de palestras conscientizando proprietários e trabalhadores sobre manejo integrado de pragas, cuidados com o manuseio dos agrotóxicos e descarte correto das embalagens. As melhorias são perceptíveis, ano após ano, com a diminuição dos casos de intoxicação aguda. Diminuíram os casos de embalagens abandonadas sem critério.


2.2 Queimadas: Nos campos nativos utilizava-se o fogo para queimar a matéria fibrosa, permitindo a rebrotação dos pastos. Os agricultores queimavam a resteva para facilitar a aração. Criou-se um círculo vicioso com reflexos impactantes sobre o meio ambiente. Desde 1977, com as campanhas sistemáticas que promovemos, observou-se a diminuição das queimadas, recompondo boa parte da flora e da fauna. O projeto Plante uma Vida, Plante uma Árvore, através da AEASB-Associação dos Engenheiros Agrônomos de São Borja, promoveu cursos de conservação do solo, com ênfase no plantio direto. Também cursos de Jardinagem e Paisagismo foram realizados.


2.3. Arborização na Zona Rural: As palestras mostraram a importância da mata ciliar e a recomposição desta em áreas críticas. Houve melhoria notável.



As escolas rurais trabalharam o tema e receberam mudas de espécies nativas da região. Entre 1977 e 1987, mais de 100 mil mudas de espécies diferentes foram distribuídas entre a cidade e a zona rural. A partir daí a ASPAN desencadeou outras ações nessa área. Fizemos inclusive semeadura direta nas margens das BRs, visando o lado educativo e os resultados aparecem em vários trechos.


2.4 Centro Nativista Boitatá: Essa entidade de cunho tradicionalista tem em torno de 1300 associados. No seu primeiro baile em 19/09/ 1978, no decorrer da Semana Farroupilha, levamos o PLANTE UMA VIDA, PLANTE UMA ÁRVORE a participar com uma ação inédita. Foram colocadas 2 mil mudas nativas sobre as mesas e mais duas mil ficaram no saguão. Após uma apresentação do Patrão Antonio Rodrigues Aguilar e do Diretor do Departamento de Ecologia, Darci Bergmann, o 1º Baile Ecológico do Movimento Tradicionalista Gaúcho foi iniciado. Assim foi até 1988, em cada edição da Semana Farroupilha, totalizando 18 mil mudas distribuídas, atingindo cidade e interior. A idéia foi seguida por vários CTG’s no Estado. Muitos freqüentadores preservaram os capões de mato nas suas propriedades e arborizaram-nas em parte. Foi um trabalho com resultados gratificantes, pois hoje o MTG - Movimento Tradicionalista Gaúcho estimula as entidades filiadas a realizarem projetos de preservação ambiental.





3- EDUCAÇÃO AMBIENTAL
3.1. Na rede escolar:
Uma geração de professores participou de palestras que hoje se multiplicam em ações nas escolas. A educação ambiental é um objetivo permanente, atividade cotidiana e de perseverança. Todas as escolas estaduais e municipais e cursos superiores foram trabalhadas pelo nosso projeto. Muitas escolas também receberam mudas de espécies nativas, que nem sempre prosperaram por problemas estruturais.


3.2. Aspectos informais:
Com a Igreja Evangélica de Confissão Luterana fizemos parceria informal. Por um bom tempo acompanhamos o Pastor nas suas andanças pela região. Após os cultos fazíamos palestras sobre meio ambiente.
Outra estratégia para palestras no interior do Município foi a de aproveitar os bailes nos galpões comunitários. As palestras precediam o baile e com isso garantia- se um público variável.


3.3. Viva a Natureza:
Este é o nome do programa de rádio, de educação ambiental, no ar desde 1990 na Rádio Cultura AM de São Borja. O nome foi derivado do Clube de Ecologia mantido por 20 meninas adolescentes que funcionou nos anos de 1990 a 1992. O programa Viva a Natureza foi levado ao ar até 2002.
Com o programa fecha-se o leque de ação educativa envolvendo todos os setores sociais.





4. Resultados Institucionais:
A ASPAN foi reconhecida junto à comunidade local. Colaborou como assistente do Ministério Público, numa época em que não havia a PATRAM, nem a estrutura de licenciamento ambiental do Município. Na verdade antecipou-se espontaneamente em algumas questões. As parcerias se solidificam e surgem a cada dia novas propostas de trabalho e ações a serem desenvolvidas.


5. Outros resultados:


5.1. Coleta seletiva do lixo
Houve uma experiência de 1990 a 1992 em alguns bairros da cidade com bons resultados. Inexplicavelmente, a partir de então, foi suspenso o projeto-piloto. A ASPAN vem exigindo uma postura da Prefeitura pelo retorno da coleta seletiva, inclusive com recolhimento separado do lixo tóxico (pilhas de lanterna, lâmpadas fluorescentes, entre outros). Em 2003, a Secretaria Municipal do Meio Ambiente, com apoio da ASPAN e patrocínio de empresas locais, elaborou manual sobre reciclagem. É entendimento da entidade que a coleta seletiva deve ser incentivada a partir do gerador dos resíduos, dando-lhe as informações necessárias, daí o manual. Num segundo momento, parte-se para a coleta seletiva, incluindo-se os catadores como atores do processo. De certa forma, hoje em torno de 20% dos domicílios já separam os resíduos nas frações lixo seco e orgânico, facilitando a tarefa dos catadores. Estima-se em dois mil domicílios que já aproveitam os resíduos orgânicos realizando a compostagem para posterior aproveitamento no cultivo de hortas, pomares e plantas ornamentais.


O projeto SEMEAR vem dando continuidade nesses trabalhos


5.2. Mata ciliar no Mangrulho
Neste local, às margens do Rio Uruguai no Primeiro Distrito de São Borja, o então proprietário e sócio da ASPAN, Frederico Isbrecht, plantou quarenta mil exemplares de árvores de diversas espécies, a maioria nativas. Hoje, com as árvores já em grande porte, diversas espécies da fauna se fazem notar.


5.3. Sítio Itaperaju
De uma área depauperada pelas queimadas e erosão do solo, conseguiu-se a partir de 1978 uma recomposição florística espetacular, com centenas de espécies arbóreas e arbustivas, nativas e exóticas. Hoje, centenas de pessoas, especialmente escolares, percorrem as trilhas no local, em grupos agendados prèviamente.





5.4. O visual dos ipês
Os ipês plantados a partir de 1977, mostram toda a sua beleza nas florações de julho a agosto. Elevam o astral das pessoas e causam admiração nos visitantes; muitos desses atraídos a São Borja por ser Terra dos Presidentes.





5.5 Reserva Particular do Patrimônio Natural:
O ex-presidente da AGAPAN e sócio da ASPAN, Celso Aquino Marques, com seus familiares, criou a primeira RPPN no Município. Possui área de 135 ha de campos e matas, às margens do rio Butuí, no Rincão de São Lucas, 1º distrito de São Borja.


CONCLUSÃO
As ações desenvolvidas até aqui foram múltiplas, interpenetrando todo o tecido social, com amplo apoio comunitário. De um momento de indignação em 1977 a uma ação coletiva, já se passaram mais de trinta anos. O que motivou o engº Agrº Darci Bergmann foi a emoção. No desenvolvimento das atividades, mostrou-nos que não é preciso ser doutor em Ecologia para fazer ações voltadas à preservação ambiental. Mas é preciso entregar-se de corpo e alma a uma causa. Muitas críticas foram ouvidas. Aos poucos deram lugar ao apoio. Num certo dia, nos primórdios do projeto, Darci e equipe foram jogar sementes de espécies diversas às margens das BRs. Houve quem risse daquele gesto. A idéia era imitar a natureza, que pelo vento, água e animais também semeia. Onde o fogo não apareceu, algumas sementes germinaram e trechos estão arborizados. Todos os anos, esses mesmos semeadores repetem o ritual para reavivar os antigos ideais. Esses são os exemplos que ficam na memória coletiva.


Por essas ações, em 1999, o Projeto PLANTE UMA VIDA, PLANTE UMA ÁRVORE, foi premiado em votação dos leitores, pela conceituada revista Natureza, na categoria Preservação da Flora. (Até aqui narrado por Darci Bergmann, na Semana do Meio Ambiente – Junho de 2008 )







O projeto Plante uma Vida, Plante uma Árvore, começou com uma carta escrita pelo engenheiro agrônomo Darci Bergmann, em 03/08/1977, no semanário O JORNAL, indignado com a precária arborização da cidade de São Borja-RS. Na missiva propôs algumas ações. Foi, então, convidado pelos diretores de O Jornal a fazer matérias de interesse ecológico, resultando na campanha Plante uma Vida, Plante uma Árvore. O Jornal foi desativado, mas Darci Bergmann levou a termo a campanha, transformando-a num projeto pessoal de iniciativas na área ambiental, motivando pessoas. Em cada entidade que Darci Bergmann participava propunha ações ambientalistas, todas elas enquadradas com o nome de Plante uma Vida, Plante uma Árvore, resultando em 1987, com a criação da ASPAN-Associação São Borjense de Proteção ao Ambiente Natural, nas dependências da Câmara de Vereadores.
Segundo Bergmann, o projeto Plante uma Vida, Plante uma Árvore, foi o precursor do ambientalismo em São Borja e será levado a termo até o último dia da sua existência física.



foto direita: Plantio da primeira muda da campanha Plante uma Vida, Plante uma Árvore, por Darci Bergmann, em 1977, na rua Gal. Canabarro, em São Borja-RS

25 de dezembro de 2010

Piscina: Do lazer ao estresse

Por Darci Bergmann

Tenho lido muito sobre as piscinas fixas.  Elas são apresentadas como um acessório de lazer quase indispensável nas habitações.
Mas têm elas realmente todos esses benefícios apregoados? Ou seria mais um modismo ou quem sabe até mais um filão de mercado para a venda de produtos? Talvez as duas coisas. O certo é que existe todo um aparato que promove a idéia de que a piscina valoriza a casa e traz conforto aos seus moradores.
 Por algum tempo, pensei até em instalar uma. Fui então atrás de informações. Ouvi os vendedores desses equipamentos e só mostraram as maravilhas e vantagens desses acessórios. Visitei amigos e nas conversas com eles pude ver que as tais de maravilhas das piscinas fixas podem se transformar em dor de cabeça. 

A implantação de uma piscina ocupa espaço físico do terreno onde poderia ter uma área verde. O espaço ao redor da piscina traz limitações ao plantio de árvores por vários motivos. Um dos mais alegados é a queda de folhas na água, outro o sistema radicular. Uma vez instalada, ela precisa de manutenção e isto durante o ano todo. Nas regiões de clima mais ameno, ela é usada em média três meses ao ano. Quer dizer, muito gasto para pouco uso.

Os transtornos não param aí. Um casal relatou o seguinte. Os filhos pré- adolescentes queriam muito ter uma piscina. Assim, decidiram implantar uma. O orçamento na época permitiu o investimento. A piscina só era ocupada nos meses de verão. Depois, os filhos crescidos saíram de casa. E a piscina estava ali dando gasto e ocupando espaço. Com o passar do tempo, o orçamento familiar encolheu. Era preciso diminuir gastos.  Agora o casal se dera conta do quanto gastara para um lazer de pouco tempo. As tão sonhadas árvores de frutas que sempre almejou plantar não encontraram espaço. Tudo por causa da tal de piscina. Quando se quer viajar, alguém tem que vigiar o local, porque pode acumular água e atrair os mosquitos. O casal pensa em até vender a piscina, mas os custos de remoção são altos.

 Num outro caso, a situação era semelhante. O desfecho, porém foi outro. Cansado de gastar na manutenção de uma piscina desativada, o proprietário decidiu fazer um uso mais ecológico da estrutura. Fez um sistema de captação de água da chuva no telhado da casa. A piscina foi coberta com laje de concreto e transformada em depósito dessa água pluvial. Ao lado, foi implantada uma horta protegida e agora ele produz verduras de boa qualidade sem agrotóxicos.

Caros amigos e amigas. Se vocês pensarem em implantar uma piscina, façam antes uma análise das vantagens e desvantagens dessas estruturas. Não façam investimentos que depois podem resultar em transtornos. Desconfiem quando o assunto só é abordado de forma unilateral com patrocínio de toda uma gama de empresas ávidas para abocanhar uma boa parte do seu dinheiro. Existem coisas na vida que são simples e que nos dão felicidade mesmo assim. Estamos numa época em que é preciso decidir por um estilo de vida menos sujeito ao gasto de matérias primas e energia. Felicidade é ter menos preocupações.

12 de dezembro de 2010

Herbicida prejudica o meio ambiente e pequenos agricultores.

Por Darci Bergmann






O tema é recorrente. Foi debatido em seminário ambiental por quase trezentas pessoas em São Borja, em junho de 2004. Por delegação unânime fui incumbido de apresentar minuta de anteprojeto de lei. Era um ano eleitoral e a proposta parou na Consultoria Jurídica. Seria retomada a discussão após o pleito, o que não ocorreu. De lá para cá a diversidade da flora foi duramente atingida, matando milhares de árvores. Uma espécie nativa quase sumiu do cenário rural: a canafístula - Pelthophorum dubium. Os milhares de esqueletos dessa e de outras árvores nativas e exóticas são um testemunho da insensatez humana, do descaso, da falta de fiscalização e do imediatismo que não respeita a natureza.

O que era verde virou branco

Agora, em 2010, a primavera revelou uma paisagem com árvores de folhas esbranquiçadas, entre os troncos e galhos secos das que já morreram anteriormente. 
Por todos os rincões ecoam protestos de agricultores atingidos pela nuvem assassina dos herbicidas. Como fixar pessoas no campo e querer diversificar a produção num cenário tão hostil, favorável à concentração fundiária e à monocultura?

O maior vilão





São muitos os produtos vilões, mas talvez nenhum deles se compare ao famigerado Clomazone, mais conhecido por Gamit. Se voce abrir uma embalagem desse produto e imediatamente fecha-la, em poucos dias as plantas a vários metros no entorno estarão apresentando sintomas típicos de branqueamento. Tal é a volatilidade desse produto. Gamit, usado em aplicações com pulverizador do tipo costal, ultrapassou a área que estava sendo tratada e causou sintomas de branqueamento em samambaias no interior das casas vizinhas.  
Acredite, leitor, esse produto com essas características nocivas e ainda outras não reveladas é registrado no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento para uso em várias culturas: arroz, fumo, cana-de-açúcar,cebola, entre outras. As restrições de uso estão nos sites AGROFIT e AGROSIA e nas bulas das formulações comerciais do Clomazone. Mas um produto assim deve é ser proibido no interesse da saúde e do meio ambiente. As limitações de uso deixam claro que um produto com essas características não devria nem ser registrado.


Módulo Pós-Registro
Produtos Formulados (Agrotóxicos)
Produtos Técnicos
Monografias (Ingredientes Ativos)

RELATÓRIO DO AGROTÓXICO

Marca Comercial:
Nº Registro MAPA: 1428691
Registrante: FMC Química do Brasil Ltda.        
Classe(s): Herbicida -
Formulação: EC - Concentrado Emulsionável
Ingrediente Ativo:  clomazona
Concentração de IA: 500 g/l
Grupo Químico: isoxazolidinona
Modo de Ação:
Modo de Aplicação: Terrestre/Aéreo
Modalidade de Emprego: (Pré/Pós-emergência)
Restrição UF:
Corrosivo:
Inflamável:
Classificação Toxicológica:   II - Altamente tóxico
Classificação Ambiental: II - Produto muito perigoso
LIMITAÇÕES DE USO: Não se recomenda aplicar Gamit a menos de 800m da cultura de girassol e milho e das seguintes atividades: hortas, pomares, viveiros, casas de vegetação (estufas), jardins, videiras, arboredos, vegetações ribeirinhas e outras nativas. Culturas de inverno (trigo, aveia, centeio) subsequentes à aplicação de Gamit poderão apresentar leve clorose em locais se houver erro de aplicação como doses duplicadas ou sobreposição de barra. Entretanto, estas plantas recuperam-se normalmente, não afetando a produção nestas condições. Aguardar um período mínimo de 150 dias após a última aplicação do Gamit para a instalação de culturas subsequentes. Uso em milho: não aplicar nas variedades de milho híbrido AG 301, AG 303 e Braskalb XL 678, pois são sensíveis ao produto. O uso do Gamit na cultura de algodão somente poderá ser feito caso as sementes tenham sido previamente tratadas com o produto PERMIT ou com disulfoton, ou com a aplicação do mesmo no solo (sulco de plantio). Para aplicações em cana soca já brotada, poderá ocorrer clorose localizada pela ação do contato com o Gamit, havendo recuperação total da planta. Deve-se evitar aplicação em cana soca com mais de 20 cm de altura.
INFORMAÇÕES SOBRE OS EQUIPAMENTOS DE APLICAÇÃO: A aplicação de GAMIT poderá ser efetuada através de pulverização terrestre (manual ou tratorizada) e aeronaves agrícolas (arroz irrigado)
PRECAUÇÕES DE USO E ADVERTÊNCIAS QUANTO AOS CUIDADOS DE PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE: Este produto é MUITO PERIGOSO ao meio ambiente. Evite a contaminação ambiental - Preserve a Natureza. Não utilize equipamento com vazamento. Aplique somente as doses recomendadas. Não aplique o produto na presença de ventos fortes ou nas horas mais quentes. Não lave as embalagens ou equipamento aplicador em lagos, fontes, rios e demais corpos d'água. Não execute aplicação aérea deste agrotóxico em áreas situadas a uma distância menor que 800 (oitocentos) metros de povoação e de mananciais de captação de água para abastecimento público; de 500 (quinhentos) metros de mananciais e moradias isoladas e de agrupamentos de animais. Observe as disposições constantes na legislação estadual e municipal concernentes a atividades aero-agrícolas. Em arroz irrigado maiores precauções devem ser tomadas para evitar que este produto contamine corpos d'água. Descarte corretamente as embalagens e restos do produto - siga as instruções constantes no item "Destino final de resíduos e embalagens". Em caso de acidente, siga corretamente as instruções constantes na bula.



O piloto e o macacão envenenado
Um piloto agrícola fez um relato  sobre esse produto: Fiz uma pulverização aérea com o Gamit, tomando todo o cuidado possível. Chequei as condições meteorológicas, que naquele momento estavam normais para uma aplicação aérea. Depois de encerrados os trabalhos daquela aplicação, tomei um banho e troquei as roupas. O macacão que eu usei durante a aplicação do Gamit eu coloquei numa sacola de plástico, bem isolada e solicitei à uma senhora para que o lavasse. Dias depois, quando fui receber a peça de roupa lavada, fui comunicado pela referida senhora que as plantas do seu pátio e as samambaias no interior da casa estavam ficando com as folhas esbranquiçadas. Então eu percebi com mais clareza o quanto um produto desses pode fazer mal à natureza e talvez à saúde das pessoas.


Legislação municipal sobre agrotóxicos

A seguir, apresento sugestão de minuta de anteprojeto de lei, nos moldes daquele apresentado em 2004 à Prefeitura Municipal de São Borja, esperando que desta vez, ante o clamor geral, os poderes Executivo e Legislativo em uníssono proíbam esse vilão da natureza. 
Talvez na esteira dessa tomada de providências outros produtos altamente impactantes sejam proibidos, tais como o inseticida carbofuran, e o herbicida 2,4-D com seus vários nomes comerciais. Sobre o glifosato, dessecante largamente utilizado, novos estudos revelam outros comportamentos sobre a saúde e o meio ambiente que podem resultar em severas limitações de uso e até à proibição como já ocorreu numa cidade da Argentina



PROJETO DE LEI Nº

Proíbe, no Município de São Borja, a estocagem, a comercialização e o uso de agrotóxico que contenha o princípio ativo  Clomazone e dá outras providências.

O Prefeito Municipal de São Borja....

ART 1º - Fica proibido no Município de São Borja, a estocagem, a comercialização e o uso de agrotóxico que contenha na sua formulação princípio ativo Clomazone.
ART 2º - As empresas que comercializam agrotóxicos no Município terão o prazo de seis meses a contar da publicação desta lei para se desfazerem dos estoques de agrotóxicos que contenham princípio ativo Clomazone, ficando vedada a venda para outras pessoas jurídicas e físicas de São Borja.
ART 3º - As empresas prestadoras de serviços de aplicação aérea ou terrestre estabelecidas no Município ou que aqui atuem em caráter eventual nas épocas de aplicação, estarão obrigadas ao cumprimento desta lei;
ART 4º - O agricultor usuário de agrotóxicos deverá devolver ao fornecedor possíveis saldos de agrotóxico de princípio ativo Clomazone, dentro do prazo de seis meses a partir da publicação desta lei. 
ART 5º - Caberá à Secretaria Municipal do Meio Ambiente a fiscalização para o efetivo cumprimento desta lei;
Paragr. primeiro – A fiscalização também poderá será ser feita pelos órgãos estaduais e federais pertinentes, incluindo-se a Patrulha Ambiental da Brigada Militar.
Paragr. Segundo – Os fiscais do Município, por iniciativa própria ou em caso de denúncia, farão vistorias nas empresas que comercializam, prestam serviços de aplicação de agrotóxicos e nos agricultores usuários;
ART 6º - O não cumprimento desta lei sujeitará o infrator às seguintes penalidades:
1-      Apreensão do produto e multa de .......urms
2-      Em caso de reincidência será aplicada multa em dobro
3-      As empresas que comercializam agrotóxicos e as prestadoras de serviço, nessa área, em caso de duas reincidências estarão sujeitas à cassação de alvará de funcionamento.
ART 7º - Os valores arrecadados com as multas destinar-se-ão ao Fundo Municipal do Meio Ambiente.
ART. 8º Esta lei entra em vigor na data da sua publicação.

JUSTIFICATIVA

A problemática dos agrotóxicos no Município de São Borja já vem de algumas décadas. A legislação federal e estadual, bem como os dispositivos de fiscalização, não tem sido suficientes para amenizar o problema. Alguns produtos, por suas características próprias, causam sérios danos ambientais com reflexos na saúde pública e na agricultura familiar.
Em 1984, devido à precariedade da legislação federal, foi criada uma lei municipal de agrotóxicos. Nessa época outros municípios do Estado e no Brasil também estabeleceram mecanismos legais de controle e fiscalização. Em 1988 surgiu uma lei federal mais abrangente e detalhada sobre a matéria. Mas as variáveis de produção, culturas e ecossistemas no Brasil são complexas e uma lei federal de agrotóxicos não é capaz de contemplar todas as questões envolvidas. Também existem falhas na fiscalização. O incipiente licenciamento ambiental na agricultura também tem falhas. A nível de campo, faltam técnicos especializados para acompanhar as atividades licenciadas. Assim, os abusos ocorrem.  


A diversificação de culturas



Por outro lado, a tão almejada diversificação da matriz produtiva está seriamente ameaçada especialmente pelo uso de herbicidas de princípio ativo Clomazone. Técnicos da Prefeitura Municipal de São Borja, tem constatado os impactos desse produto sobre a flora nativa remanescente e sobre culturas atingidas pela deriva de aplicações aéreas e terrestres. A agricultura de subsistência praticada por um grande número de pequenos agricultores vem acumulando prejuízos ano após ano, sem que o MAPA - Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - tome as providências cabíveis.  A ONG ambientalista local ASPAN – Associação São Borjense de Proteção ao Ambiente Natural, juntamente com associações de moradores, vítimas de derivas de agrotóxicos e pessoas da comunidade, encaminhou abaixo-assinado com centenas de assinaturas ao MPE, solicitando providências, especialmente com relação aos abusos da aviação agrícola e a aplicação de alguns princípios ativos extremamente danosos ao meio ambiente. Este é o caso do Clomazone - princípio ativo de formulações comerciais - usado no controle de ervas daninhas em várias culturas. Aqui no Município, as formulações contendo Clomazone são mais conhecidas como Gamit e utilizadas no arroz. Em regiões de cultivo de cana-de-açúcar, tabaco e cebola essas formulações de Gamit também são utilizadas.


ASPAN solicita interferência do Ministério Público Federal 

A ASPAN também encaminhou expediente ao MPF, em Uruguaiana, solicitando sua interferência junto às autoridades federais, para que suspendam o registro de agrotóxicos de princípio ativo Clomazone em todo o território nacional. O MPF abriu procedimento sob nº 1.29.011.000007/2009-75. As limitações de uso desse agrotóxico, praticamente inviabilizam a sua aplicação nas lavouras de São Borja e, no entanto, ele é receitado impunemente até para uso por aviação agrícola. No site AGROFIT, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA, as recomendações de uso para as formulações comerciais de Clomazone, referem que ele não pode ser aplicado a menos de oitocentos metros de hortas, pomares, arvoredos e vegetação ciliar o que praticamente inviabiliza o seu uso na região.


A comunidade já debateu sobre a proibição de alguns agrotóxicos 

Nos seminários e conferências municipais a questão dos agrotóxicos tem sido intensamente debatida e cobrada das autoridades responsáveis, sem que as soluções aparecessem. Na 2ª Conferência Municipal do Meio Ambiente, em 2004, foi aprovada por unanimidade moção que pleiteava a proibição de comercialização e uso de alguns princípios ativos no Município de São Borja. 


Um cinturão de dez quilômetros em torno da cidade, livre das aplicações aéreas de agrotóxicos


Com relação à aviação agrícola, foi sugerida, em 2004, a implantação de uma zona de exclusão aérea de mais ou menos dez quilômetros ao redor do perímetro urbano. Ali não seriam aplicados herbicidas via aérea ou pesticidas tóxicos (classes I e II ). O raciocínio lógico concluía que se o Município pode licenciar atividades agropastoris também poderá legislar sobre o uso de agrotóxicos, levando em conta as peculiaridades locais. Outra justificativa apontada era a total incapacidade das autoridades estaduais e federais de fiscalizarem o uso de tais produtos. Faltam fiscais e a tarefa é dificultada porque se faz uso intenso da aviação agrícola.


O município pode legislar em caráter complementar. É integrante do SISNAMA

Em seminários estaduais também ficou delineada a possibilidade de municípios e estados legislarem sobre a matéria, já que uma lei federal não atende todas as variáveis envolvidas numa questão de tamanho interesse público. O Município de São Borja faz parte do SISNAMA – Sistema Nacional de Meio Ambiente - e nessa condição pode aplicar a legislação federal e estadual pertinente às questões ambientais e legislar em caráter complementar quando a mesma não atender o interesse da comunidade. Aqui existem assentamentos de pequenos agricultores, além daquelas propriedades de agricultura familiar tradicional que tem sido vítimas das derivas de agrotóxicos. A cidade também não fica livre da ação de alguns princípios ativos que atingem a população pela inalação do ar contaminado, resíduos em alimentos e pela própria água captada pela CORSAN. O Rio Icamaquã drena uma extensa área de agricultura, com diversas lavouras de arroz nesta sub-bacia, despejando acima do ponto de captação grande quantidade de agrotóxicos. Assim também ocorre com a Sanga da Estiva.


 Nem tudo é revelado sobre o comportamento dos produtos

Faz em torno de 20 anos ocorreu o registro, junto ao MAPA, de produtos de princípio ativo Clomazone para uso em diversas culturas. Aqui seu uso maior é na cultura de arroz. Agora com a inclusão do Município na região produtora de cana-de-açúcar, o uso desse herbicida agravará ainda mais o impacto ambiental, inviabilizando outras atividades produtivas. Naquela época, as pesquisas não apresentaram toda a realidade que cerca esse produto. Quase sempre os dados se referem a aplicações em pequenos canteiros experimentais, com informações repassadas pela empresa registrante. O tempo mostrou que o Clomazone é muito mais lesivo ao meio ambiente. Os levantamentos de campo dos técnicos do Município e das ONGs, bem como da população, revelam uma verdadeira tragédia ambiental, com alto impacto sobre toda a biodiversidade.

O herbicida clomazone já está disseminado nas águas.

Em pesquisa feita pelo professor da URCAMP, Luiz Carlos Porto, as vísceras de peixes coletados nos rios Icamaquã e Butuí acusaram a presença de fenóis, mas esses rios não sofrem impacto de esgotos de cidades, nem de indústrias. Logo, os agrotóxicos estão associados a esse fato. A fórmula estrutural do Clomazone mostra o radical fenila ligado a um átomo de cloro.
Pesquisadores da UFSM encontraram Clomazone nas águas superficiais de arroios em Agudo – RS, depois que ocorreram aplicações terrestres de herbicida Clomazone em lavouras de fumo.
Em Pelotas, pesquisa da EMBRAPA demonstrou que o Clomazone foi encontrado em águas superficiais depois de aplicado via aérea em lavoura de arroz, até 114 dias após.
Em trabalho feito na Bacia do Rio Corumbataí, no estado de São Paulo, o Clomazone foi encontrado em algumas amostras de lodo de rio, principalmente a partir das lavouras de cana em solo arenoso. Os mesmos autores revelam que o Clomazone tende a se acumular no fígado. Portanto mais um indício de que ele se acumula nas vísceras dos animais.


Empresa fomenta uso de produto que permite aumentar tolerância ao Gamit. Mais herbicida é jogado no ambiente e com isso aumenta a poluição.

A empresa FMC, registrante do Gamit no MAPA, recomenda a utilização da substância comercial conhecida como Permit nas sementes de arroz. Com isso, essa cultura fica mais tolerante a doses maiores de Clomazone. Assim doses maciças desse herbicida, que ultrapassam aquelas recomendadas pelo MAPA – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, aumentam ainda mais a poluição ambiental.


A foto mostra painel que estava às margens da Av. João Goulart, em São Borja/RS




Produto extremamente volátil

As formulações comerciais de Clomazone (Gamit) são extremamente voláteis e nem as aplicações terrestres são seguras. Na área urbana de São Borja, já foram registrados casos de deriva de Gamit por aplicações com aparelho costal. Um desses casos foi  motivo de representação junto ao MP, impetrado pela ASPAN. O fato foi documentado pela PATRAM e até um laudo foi expedido pelo engº agrônomo José Ênio Abreu de Jesus, atual secretário municipal do Meio Ambiente.


O Ministério Público Estadual também já foi acionado

Desde o ano de 2007, centenas de pessoas encaminharam ao Ministério Público Estadual um documento solicitando uma audiência pública para discutir a questão da aviação agrícola e as derivas dos agrotóxicos e ainda poderão ser protocoladas outras manifestações dessa natureza. No Forum de São Borja tramitaram e tramitam ainda muitas ações envolvendo a questão dos agrotóxicos. Na maioria são casos envolvendo reparações por perdas devido às derivas em culturas e pastagens.
A tão desejada diversificação na agricultura está seriamente comprometida se nada for feito.
 Preocupam também as conseqüências sobre a saúde pública. Nas épocas mais intensas de aplicações aéreas a cidade fica sob uma nuvem tóxica de pesticidas, pois os produtos se deslocam devido às correntes de ar,  atingindo grandes distâncias.
Diante do exposto, não resta outra alternativa senão a de proibir princípios ativos, de elevado impacto ambiental, à saúde pública e causadores de problemas sociais e prejuízos à economia  O interesse da saúde da população urbana e rural e a proteção dos pequenos produtores rurais no seu direito de diversificação deve se sobrepor aos interesses de grupos privados


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