Fundamental para a formação de cidadãos conscientes de seus direitos e deveres e bem preparados para o mercado de trabalho, a carreira de professor é uma das menos procuradas pelos jovens brasileiros. Salários baixos, ausência de planos de carreira, instabilidade no emprego devido ao alto percentual de contratações temporárias e também a falta de respeito em sala de aula são alguns dos motivos para a profissão ser uma das menos valorizadas no país.As estatísticas do último vestibular compravam essa falta de interesse -- os cursos que possibilitam uma carreira na docência do ensino básico estão entre os menos concorridos.
Enquanto os cursos mais procurados no vestibular da Fuvest, que seleciona alunos para a USP, têm mais de 50 candidatos por vaga, a concorrência nas licenciaturas e na pedagogia não chega a 10. Na Unicamp, a situação não é muito diferente: apenas a licenciatura em letras ultrapassa os 10 candidatos por vaga.
"A carreira de professor não é atraente e não consegue empolgar a juventude por não oferecer uma perspectiva de futuro que permita ao trabalhador transcorrer o tempo de trabalho com tranquilidade", afirma Roberto Leão, presidente da
Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE).
O desinteresse acaba se refletindo nas salas de aula. Apesar de o último censo da educação básica de 2012 apontar que o país tem mais de dois milhões de docentes, faltam professores nas disciplinas de matemática, física, química e inglês.
Aos profissionais que optaram pelo magistério resta tentar melhorar suas condições de trabalho com greves e protestos. Ao longo de 2013, muitas dessas ações foram manchete em jornais no país inteiro. No Rio de Janeiro, os professores municipais pararam de trabalhar por 77 dias e chegaram a ocupar a Câmara Municipal, de onde foram retirados à força pela polícia militar.
Brasil no fim do rankingA péssima situação da carreira de professor no Brasil ficou evidente no ranking de valorização elaborado pela fundação educacional Varkey Gems, em 2013. Com base em quatro indicadores -- interesse pela profissão, respeito em sala de aula, remuneração salarial e comparação com outras profissões --, a instituição avaliou a carreira em 21 países.
O Brasil ficou em penúltimo lugar. Numa escala que vai de 0 a 100, a avaliação do país ficou bem abaixo da média de 37 pontos, atingindo apenas 2,4 pontos. O país ficou à frente apenas de Israel. A China recebeu 100 pontos, sendo o local onde mais se valoriza a profissão, seguida da Grécia, com 73,7, e da Turquia, com 68.
Mas a grande contradição revelada pelo estudo fica por conta da questão da confiança no professor. Embora a profissão tenha uma péssima reputação, o Brasil é o país que mais confia nos docentes para oferecer uma boa educação.
Falta de profissionaisPara a pesquisadora Gabriela Miranda Moriconi, da
Fundação Carlos Chagas, as razões que levam a maioria dos jovens a desistir de seguir uma carreira nessa área são os baixos salários, o desrespeito por parte dos alunos e a falta de valorização da profissão pela sociedade.
O atual piso salarial nacional para professores de nível médio, com uma jornada de trabalho de 40 horas é de 1.697,37 reais. Mas muitos estados não pagam nem mesmo esse valor, que já é bem inferior aos ganhos de outras profissões. Segundo Leão, um profissional de educação ganha, em média, 60% do que outros profissionais empregados no serviço público com a mesma formação.
"Para melhorar a remuneração, a saída encontrada é duplicar ou triplicar, quando possível, a jornada de trabalho como professor ou, em alguns casos, arranjar uma segunda ocupação. Isso prejudica tanto a vida pessoal do profissional como a qualidade do trabalho que ele pode realizar", completa Moriconi.
Medidas para melhorar a situaçãoPara reverter esse cenário, a profissão precisa passar por um processo de valorização, começando com a criação de um plano de carreira nacional que estimule o aperfeiçoamento dos profissionais e valorize seu tempo de trabalho e também o serviço realizado na escola, afirmam os especialistas.
Outras medidas apontadas são um maior reajuste dos salários, a diminuição das contratação temporárias e o incentivo a uma formação continuada.
Nesse sentido, o Plano Nacional de Educação (PNE), em votação no Congresso Nacional e que deve valer até 2024, pode ser um dos caminhos para tornar a carreira de professor atraente. O PNE prevê equiparar a remuneração dos docentes com a média salarial de outras ocupações de nível superior e a criação de planos de carreira em todos os municípios.
"No entanto, vai ser necessário que o governo federal defina estratégias concretas para garantir que os recursos adicionais previstos no plano cheguem aos estados e municípios e sejam efetivamente empregados para a melhoria dos salários do magistério", afirma Moriconi.
O PNE já foi aprovado na Câmara e no Senado, onde sofreu modificações, e por isso precisa ser novamente votado pelos deputados.
O vice-coordenador da diretoria de educação da
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), Andreas Schleicher é otimista em relação às mudanças que estão acontecendo nesse setor no Brasil.
"O governo fez coisas importantes, melhorando as condições de trabalho, aumentando os salários. Em muitos aspectos o Brasil está mudando na direção certa, mas ainda precisa criar um plano de carreira que proporcione o desenvolvimento dos profissionais", opina Schleicher.
FONTE
Deutsche WelleAutoria: Clarissa Neher
Edição: Alexandre Schossler