27 de março de 2012

Temperaturas podem subir 3°C já em 2050, diz estudo


26/03/2012   -   Autor: Fabiano Ávila]   -   Fonte: Instituto CarbonoBrasil/Agências Internacionais

Resultado de milhares de simulações conduzidas em computadores de voluntários mostra que o aquecimento global está mais rápido do que se pensa e cientistas alertam para a necessidade de colocar em prática ações de mitigação e adaptação


Atualmente, os dados do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) são os mais adotados para a projeção do aumento das temperaturas médias. A entidade afirma que até o fim do século veremos uma alta entre 1,8°C e 4°C, o que já causaria uma maior frequência de desastres climáticos e provocaria consequências como o aumento no nível do mar, queda na produção de alimentos e migrações em massa.

Porém, mesmo a previsão do IPCC pode ser muito conservadora e existe a chance de estarmos vivendo um aquecimento global bem mais acelerado do que pensamos.

Quem afirma isso é um estudo publicado neste domingo (25) no periódico Nature Geoscience, que apresenta dados das mais de 10 mil modelagens climáticas realizadas com a ajuda de computadores domésticos dos voluntários do projeto climateprediction.net.

Segundo essas simulações, as temperaturas médias devem subir entre 1,4°C e 3°C até 2050. Vale lembrar que o máximo defendido por cientistas para evitar as piores consequências das mudanças climáticas seria 2,5°C.

“Os resultados preocupam porque mostram que mesmo o cenário mais pessimista é plausível”, afirmou Dan Rowlands, líder do estudo, da Universidade de Oxford.

De acordo com o cientista, o modelo utilizado pela pesquisa é o mais complexo já proposto e agrega alguns fatores e incertezas que outras simulações desconsideraram.

“Apenas levando em conta essas incertezas, o que foi possível graças à ajuda dos computadores de voluntários, podemos tentar simular as complexidades do nosso clima”, explicou Rowlands.

Analisando dados dos últimos 50 anos e assumindo que essas informações do passado são confiáveis para prever o que vai acontecer daqui para frente, o estudo chegou à conclusão de que qualquer aquecimento entre 1,4°C e 3°C está na faixa do “provável”.

“A temperatura média da Terra durante a década de 2000 a 2010 foi quase 1°C acima da média entre 1960 e 1990”, afirmou Rowlands.

Esse aquecimento mais rápido do que o previsto precisa ser levado em conta pelos governos, alertam os cientistas.

“Melhores medidas de mitigação devem ser planejadas desde já para estarmos preparados se essa previsão de um aquecimento de mais de 2,5°C nas próximas décadas se confirmar”, afirmou Corinne Le Quere, diretora do Centro Tyndall de Pesquisas de Mudanças Climáticas da Universidade de East Anglia.

O projeto climateprediction.net já envolve mais de 30 mil voluntários, que permitem que modelos climáticos sejam rodados em seus computadores domésticos.

“É um esforço ambicioso e demonstra como cidadãos podem contribuir para a sociedade e para a ciência climática”, disse o coautor do estudo Ben Booth, do Met Office.

15 de março de 2012

O lixo é uma questão cultural

Por Darci Bergmann

  Nem a revolução tecnológica, nem a inclusão sócio-econômica de classes menos favorecidas foram suficientes para equacionar a questão dos resíduos sólidos em muitos países. 

Alixeira de ferro deveria estar localizada no pátio do prédio e não sobre o passeio público.
Moradores das vizinhanças querem se mobilizar pela retirada da estrutura.
Foto: Darci Bergmann, 10/03/2012 - São Borja/RS
 O propalado aumento do poder aquisitivo da população brasileira traz na sua esteira o aumento do consumo de bens nem sempre tão essenciais a uma boa qualidade de vida. Alguns se referem a produtos supérfluos, entre os quais, guloseimas, bugigangas,  descartáveis - geradores de lixo por excelência. Nas cidades inchadas por ocupações irregulares, as periferias e terrenos não edificados se tornaram depósitos de lixo. Nas ruas, os depósitos são até tolerados pelo poder público, disfarçados de lixeiras, aquelas estruturas geralmente de ferro, que prejudicam o trânsito dos pedestres nos passeios públicos. 
  Nossa cultura entende que o morador deve limpar a casa e o pátio. A limpeza da rua é de responsabilidade do poder público. Por isso que aquelas lixeiras de ferro se espalham na frente das residências e não se respeita sequer o horário de coleta. Tudo é ali jogado, incluindo restos de comida, bicho morto, embalagens, lâmpadas, remédios, tintas e muito mais.
  Na maioria das vezes os resíduos estão misturados e antes da coleta pública os catadores vasculham essas lixeiras e levam o que lhes convém, deixando sobras sobre os passeios públicos. Dali, parte dos resíduos é varrida para o leito das ruas e pátios vizinhos pelo vento ou pela água das chuvas. Na época das enxurradas, o problema se agrava, pois ocorrem entupimentos dos sistemas de esgotamento pluvial, transbordamento de córregos e perdas patrimoniais e até de vidas humanas. 

  No Brasil, somos competentes em produzir lixo e incompetentes em manejá-lo adequadamente.


Fotos: flagrantes de lixo mal acondicionado  e local impróprio
A lixeira sobre o passeio público - foto superior - prejudica o trânsito de pedestres e já causou  ferimentos em  crianças.
Moradores do prédio e pessoas de outros locais arremessam lixo ao lado do passeio público -foto inferior.
Fotos: Darci Bergmann,  São Borja/RS


 Esta é a questão. Poucas cidades atingiram um patamar de cultura do seu povo no tocante aos resíduos sólidos. Mesmo nos espaços onde se localizam as nossas universidades, sejam elas públicas ou privadas, é possível encontrar inúmeros maus exemplos no que se refere ao lixo. A cultura de um povo vai além da implantação de educandários. É preciso amor à cidade, respeito aos vizinhos e um senso crítico em relação ao consumismo produtor de tanto lixo. 
  Quando as calamidades são agravadas pela interferência humana no seu ambiente, caso do lixo jogado em qualquer local, não adianta só xingar este ou aquele. Cada um de nós deve fazer uma revisão dos seus procedimentos. Às vezes atitudes simples podem trazer grandes melhorias para a saúde, no visual das cidades e na prevenção de tragédias. Cito algumas: 1) reduzir o consumo de supérfluos e descartáveis; 2) dentro de casa separar as partes secas e orgânicas do lixo; fazer a compostagem da parte orgânica - até em apartamento e condomínios é possível;3) vender ou doar a catadores credenciados a parte seca reciclável; 4) instalar as lixeiras no pátio interno da moradia ou do condomínio - para evitar que o lixo seja  remexido por pessoas e animais e ainda acidentes com transeuntes.
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Mais sobre o tema:

13 de março de 2012

Crise Ambiental: É preciso correr, adverte a ciência,

Crise Ambiental: É preciso correr, adverte a ciência, artigo de Washington Novaes

Publicado em março 12, 2012


 Deveria ser leitura obrigatória para todos os governantes, de todos os níveis, todos os lugares, o documento de 22 páginas entregue no último dia 20 de fevereiro, em Nairóbi, no Quênia, aos ministros reunidos pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, escrito e assinado por 20 dos mais destacados cientistas que já receberam o Prêmio Blue Planet, também chamado de Prêmio Nobel do Meio Ambiente. Entre eles estão a ex-primeira-ministra norueguesa Gro Brundtland, coordenadora do primeiro relatório da ONU sobre desenvolvimento sustentável; James Lovelock, autor da “Teoria Gaia”; o professor José Goldemberg, ex-ministro brasileiro do Meio Ambiente; sir Nicholas Stern, ex-economista-chefe do Banco Mundial, consultor do governo britânico sobre clima; James Hansen, do Instituto Goddard de Estudos Espaciais (Nasa); Bob Watson, conselheiro do governo britânico; Paul Ehrlich, da Universidade Stanford; Julia Marton-Lefèvre, da União Internacional para a Conservação da Natureza; Will Turner, da Conservação Internacional – e vários outros.
Nesse documento os cientistas traçam, com palavras sóbrias e cuidadosas, um panorama dramático da situação do mundo, hoje, em áreas vitais: clima; excesso de consumo e desperdício; fome; necessidade de aumentar a produção de alimentos e escassez de terras; desertificação e erosão; perda da biodiversidade e de outros recursos naturais; subsídios gigantescos nas áreas de transportes, energia, agricultura – e a necessidade de eliminá-los. Enfatizam a necessidade de “empoderamento” das mulheres e de grupos sociais marginalizados; substituir o produto interno bruto (PIB) como medida de riqueza e definir métodos que atribuam valor ao capital natural, humano e social; atribuir valor à biodiversidade e aos serviços dos ecossistemas e deles fazer a base da “economia verde”.
É um documento que, a cada parágrafo, provoca sustos e inquietações, ao traçar o panorama dramático que já vivemos em cada área e levar todo leitor a perguntar qual será o futuro de seus filhos e netos. “O atual sistema (no mundo) está falido”, diz Bob Watson. “Está conduzindo a humanidade para um futuro que é de 3 a 5 graus Celsius mais quente do que já tivemos; e está eliminando o ambiente natural, do qual dependem nossa saúde, riqueza e consciência. (…) Não podemos presumir que a tecnologia virá a tempo para resolver; ao contrário, precisamos de soluções humanas”.
“Temos um sonho”, afirma o documento. “De um mundo sem pobreza e equitativo – um mundo que respeite os direitos humanos – um mundo de comportamento ético mais amplo com relação à pobreza e aos recursos naturais – um mundo ambientalmente, socialmente e economicamente sustentável, onde desafios como mudanças climáticas, perda da biodiversidade e iniquidade social tenham sido enfrentados com êxito. Esse é um sonho realizável, mas o atual sistema está profundamente ferido e nossos caminhos atuais não o tornarão realidade”.
Segundo os cientistas, é urgente romper a relação entre produção e consumo, de um lado, e destruição ambiental, de outro: “Crescimento material sem limites num planeta com recursos naturais finitos e em geral frágeis será insustentável”, ainda mais com subsídios prejudiciais em áreas como energia (US$ 1 trilhão/ano), transporte e agricultura – “que deveriam ser eliminados”. A tese do documento é de que os custos ambientais e sociais deveriam ser internalizados em cada ação humana, cada projeto. Valores de bens e serviços dos ecossistemas precisam ser levados em conta na tomada de decisões. É algo na mesma direção das avaliações recentes de economistas e outros estudiosos, comentadas neste espaço, a respeito da finitude dos recursos naturais e da necessidade de recompor a vida econômica e social em função disso.
O balanço na área de energia é inquietador, com a dependência de combustíveis fósseis, danos para a saúde e as condições ambientais. Seria preciso proporcionar acesso universal de toda a população pobre aos formatos “limpos” e renováveis de energia – a transição para economia de “baixo carbono” -, assim como a formatos de captura e sepultamento de gases poluentes (ainda em avaliação). Como não caminhamos assim, as emissões de dióxido de carbono equivalente já chegam a 50 bilhões de toneladas anuais, com a atmosfera e os oceanos aumentando suas concentrações para 445 partes por milhão (ppm)- mais 2,5 ppm por ano, que desenham uma perspectiva de 750 ppm no fim do século. E com isso o aumento da temperatura poderá chegar a mais 5 graus Celsius.
Na área da biodiversidade, 15 dos 24 serviços de ecossistemas avaliados pelo Millenium Ecosystem Assessment estão em declínio – quando é preciso criar caminhos para atribuir valor à biodiversidade e seus serviços, base para uma “economia verde”. Mas para isso será preciso ter novos formatos de governança em todos os níveis – hoje as avaliações cabem a estruturas políticas, sociais, econômicas, ambientais, separadas e competindo entre elas.
E para que tudo isso seja possível, dizem os cientistas, se desejamos tornar reais os nossos sonhos, “o momento é agora” – enfrentando a inércia do sistema socioeconômico e impedindo que sejam irreversíveis as consequências das mudanças climáticas e da perda da biodiversidade. Se falharmos, vamos “empobrecer as atuais e as futuras gerações”. Esquecendo que vivemos em “uma sociedade global infestada pela crença irracional de que a economia física pode crescer sempre, deslembrada de que os ricos nos países desenvolvidos e em desenvolvimento se tornam mais ricos e os pobres são deixados para trás”.
Não se trata de um manifesto de “ambientalistas”, “xiitas” ou hippies. São palavras de dezenas dos mais conceituados cientistas do mundo, que advertem: “A demora (em mudar) é perigosa e seria um erro profundo”.
É preciso ler esse estudo (www.af-info.or.jp). Escutar. E dar consequências.
Washington Novaes, jornalista. E-mail: wlrnovaes@uol.com.br
Artigo originalmente publicado em O Estado de S.Paulo.
Fonte: EcoDebate, 12/03/2012