30 de agosto de 2011

Vida de cão


Cadela Rosinha*: animal maltratado, estava abandonado
e com apenas 2,8 quilos.
*Crédito da foto: Arthur Puls, Correio do Povo, 07/05/2011, pág. 13



Por Darci Bergmann

            Desde tempos remotos os animais acompanham  a espécie Homo sapiens. Nessa trajetória, algumas espécies se adaptaram mais ao convívio dos humanos, sobressaindo-se o cão e o gato. O primeiro até considerado por muitos como o melhor amigo do homem. Outras espécies não tiveram a mesma sorte e estão em risco de extinção devido, principalmente, à destruição de seus habitats.
            Voltemos aos cães e gatos. Esses animais hoje fazem parte do cotidiano das pessoas. Parte deles é adotado por gente de todas as classes sociais. Outros perambulam nas cidades, vilarejos e zonas rurais e ali se reproduzem espontaneamente, sem controle sanitário.
            Adotar animais virou um modismo ou quem sabe uma necessidade.  Talvez um preço a ser pago pelo progresso. O aumento da população humana, com a desnaturação dos seus espaços de convivência, a insegurança - e a isso se agregam outras causas - motivaram um estado de solidão em muitas pessoas. Difícil é aceitar que existe solidão em um mundo tão agitado e populoso, mas é o que parece se evidenciar cada vez mais.

            Os animais adotados têm realidades diferentes, conforme o poder aquisitivo dos proprietários e dos cuidados que lhes dispensam. Nesse tocante, constata-se que algumas pessoas vão ao exagero de humanizar os animais domésticos. Os bichos gozam de uma regalia que muitos humanos não têm. Rações caríssimas, nutritivas, assistência de médicos veterinários, produtos e salões de beleza, creches, festa de aniversário.  Até mesmo vestuário canino que vai do razoável ao ridículo. Às vezes aparece bicho pintado com cores chamativas, extravagantes, no meu entender um desrespeito. O tratamento dispensado aos bichos evidencia cenas inusitadas. Alguém uma vez reclamou do exagero que uma dondoca dedicava ao seu cãozinho de estimação. Ao ver a dona charmosa dispensando beijos no bichinho enfeitado, o sujeito comentou:
            - Desse jeito até eu queria levar vida de cão.
            Pessoalmente, entendo que um animal deve ser respeitado na sua individualidade. Isso implica que não deve ser maltratado, mas também não deveria ser tratado como alguém da espécie humana. Assim procedi em relação a uma cadela vira-lata. Era faminta. Depois de alimentada fixou moradia no meu quintal. Não lhe restringi a liberdade de ir e vir. Até porque não gosto de animal preso, acorrentado ou em espaço muito restrito. Apenas intervenho com a administração de vermífugos e anticoncepcionais. Tem direito a um abrigo contra intempéries. Antes arredia, agora se tornou proprietária do pátio e faz guarda contra eventuais intrusos à noite. Em suma, nada de exagero.
            O comportamento dos humanos em relação aos animais é controverso. Cães e gatos bem alimentados, maquiados e cheios de mimo escondem uma triste realidade. O mundo animal reflete o que ocorre com os humanos. Para uns sobram regalias, para outros as mazelas.

  Começando pela exclusão das outras formas de vida. A civilização caminha mesmo para um mundo cada vez mais artificializado, com predomínio egoísta da espécie humana em prejuízo da biodiversidade. As espécies escolhidas para o convívio são aquelas que se mostram aparentemente submissas, caso dos cães, gatos e algumas outras mais. Também existem as espécies que foram domesticadas para o fornecimento de alimentos e matérias primas diversas.
 O que se percebe é a proliferação exagerada de algumas espécies animais – como as já citadas – e a ganância por lucros polpudos com os extravagantes modismos.
 Se uma parte dos recursos gastos com o luxo aos animais de estimação fosse aplicada na manutenção de reservas biológicas, certamente milhares de outras espécies poderiam ser salvas da extinção. Respeito aos animais de todas as espécies, sim. Extravagância e luxúria, não.

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