5 de junho de 2014

Os nossos solos também são cisternas de água


 Por Darci Bergmann

  Lá no meio do brejal silencioso,  entre aromas e o adejar de borboletas, encontro mais um motivo   de gratidão a Deus quando mato a sede com a água pura que brota das entranhas da terra.
  

   Quero me reportar à água, em especial sobre a importância de armazená-la no solo, melhorando as condições de infiltração e recarga dos aquíferos. Nos últimos anos temos desenvolvido muito a capacidade de armazenar água na superfície – através das barragens e o seu uso na irrigação das lavouras. Isto já é um avanço, mas ainda não o suficiente para resolvermos a crise de água. No atual momento, em muitas regiões, as populações e as lavouras amargam grandes perdas com a escassez de chuvas. As comunidades e gestores públicos se mobilizam para ampliar os sistemas de armazenamento de água. Os cuidados começam com a conservação do solo e dos ambientes naturais de recarga. 


   É de fundamental importância melhorar a infiltração de água no solo

Isto se consegue com o aumento da cobertura vegetal, investimentos em arborização e na preservação e recuperação dos banhados.     Preocupa o fato de que alguns técnicos recomendem a utilização das águas profundas para irrigação de lavouras sem medidas que melhorem a recarga desses mananciais. As conseqüências podem ser o esgotamento dessas reservas. Demoram meses, anos e décadas para que uma parte das águas das chuvas chegue novamente a esses reservatórios subterrâneos. E o quadro se agrava com a expansão urbana que impermeabiliza a superfície do solo.

A vegetação forra a superfície do solo e, junto com as raízes,
aumenta a infiltração das águas pluviais.


   Os banhados desempenham um papel importante na reposição da água

Eles fazem o efeito esponja, retendo a água das chuvas que vão se infiltrando nas camadas mais profundas. A drenagem dos banhados acelera o escoamento das águas. O acréscimo de mais alguns hectares de terra drenada não traz ganho real, quando se perde o principal fator de uma boa colheita - a água.

Banhados e brejos retardam as enchentes e recarregam
os mananciais.


   A água dos reservatórios de superfície – açudes - sofre perdas expressivas pela evaporação.

 A baixa umidade relativa do ar, a incidência de ventos e as altas temperaturas quase sempre coincidem com os meses de poucas chuvas.

   O assoreamento da bacia de acumulação dos açudes também reduz a capacidade de estocagem de água.

Nesses casos, muitos proprietários procuram aumentar a altura da barragem, o que nem sempre é a melhor solução. Isto porque aumenta a área alagada com perdas de vegetação nativa e a maior superfície de lâmina de água expõe a maiores perdas por evaporação. Quando é feita a ampliação da barragem, é de suma importância fazer arborização no entorno do açude, como preconiza o Código Florestal.

   Nas pequenas propriedades

 Algumas práticas conservacionistas podem resultar em melhor aproveitamento da água. Pelo menos garante água para o consumo humano e para alguns animais. Aqui me refiro à água subterrânea de pequenos poços – os chamados poços de balde. Quanto mais arborizada a área, maior será a infiltração da água das chuvas. Terraços em nível, pequenas barragens e a preservação dos baixios úmidos são medidas que fazem a diferença nas épocas de seca. Formei experiência nessa área aplicando os conceitos da cobertura vegetal – principalmente arborização e recuperação de um pequeno banhado de menos de um hectare. Um poço com diâmetro de 0,10 m e com profundidade de16,00 m era a única garantia de água no período de estiagens. Com o passar dos anos, a parte reflorestada e a várzea recuperada aumentaram a retenção de água. Agora, pequenos poços revestidos de tijolo e com bocal cimentado também garantem água mesmo nos meses críticos. Um desses poços tem apenas dois metros de profundidade. Escavado num leito pedregoso, manteve sempre uma lâmina de 0,30 m de água fria e cristalina, no mesmo período de escassez em que poços mais profundos da região secaram. A vazão desse poço não permite sonhar com irrigação em escala, mas garante água potável de boa qualidade a uma família média. 
 O custo é destinar parte das terras à preservação dos mananciais.




   É desalentador ver a estiagem castigando os campos, as lavouras e as árvores perdendo as folhas. Os riscos de queimadas aumentam e parece não existirem alternativas de permanência no campo. Mas, quando chove, o cenário muda completamente e o ânimo se renova. É nesse momento de reflexão que nós humanos precisamos tomar consciência de que a natureza precisa ser  entendida e não hostilizada com mais destruição.Essa reverência aos ambientes naturais é uma forma de gratidão ao Princípio Criador que faz uma ligação entre o sagrado e a sustentabilidade. 

Lá no meio do brejal silencioso,  entre aromas e o adejar de borboletas, encontro mais um motivo de gratidão a Deus quando mato a sede com a água pura que brota das entranhas da terra.
  
   

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