21 de fevereiro de 2011

Contaminar se conjuga no masculino


Por Julio Godoy

Os maus hábitos alimentares e o uso ineficiente do transporte fazem com que os homens provoquem mais emissões do contaminante dióxido de carbono do que as mulheres.


PARIS, França, 14 de fevereiro (Tierramérica).- A desigualdade de gênero em detrimento da mulher é bem conhecida e documentada. O que não se sabe tanto é que o comportamento masculino também é o maior responsável pela emissão de gases causadores do efeito estufa, que provocam o aquecimento do planeta. A essa conclusão chegaram dois estudos independentes desenvolvidos por cientistas europeus separadamente, ambos baseados em dados estatísticos sobre o consumo e as atividades cotidianas de homens e mulheres em países industrializados.

Frédéric Chomé, consultor francês para questões ambientais e de desenvolvimento sustentável, afirmou que uma mulher francesa típica provoca a emissão de 32,3 quilos de dióxido de carbono (CO²) por dia, em média, enquanto um homem no mesmo período é responsável por 39,3 quilos. “As estimativas têm como base um estudo das atividades humanas dividido por gênero, realizado pelo Instituto Nacional de Estatísticas e Estudos Econômicos da França”, explicou Frédéric ao Terramérica.

“Embora nosso método de cálculo ainda seja muito aproximado, creio que o resrultado é um bom indicador das diferenças de poluição ambiental derivadas do comportamento diferente entre homens e mulheres”, acrescentou o autor do estudo “23 Heures Chrono: Votre Bilan Carbone” (24 Horas Exatas: Sua Conta Pessoal de Carbono). A conclusões semelhantes chegaram a sueca Annika Carlsson-Kanyama e a finlandesa Riita Räty em uma pesquisa sobre os comportamentos de homens e mulheres em dez atividades cotidianas na Alemanha, Grécia, Noruega e Suécia.

“Os homens consomem mais carne e bebidas processadas do que as mulheres, além de utilizarem com mais frequência o automóvel e dirigir por distâncias mais longas. Isso os leva a emitirem maior quantidade de CO²”, diz o estudo “Comparing Energy Use by Gender, Age and Income in Some European Countries” (Comparaçao do Uso de Energia por Gênero, Idade e Renda em Alguns Países Europeus). Comentando os dois trabalhos, Corinna Altenburg e Fritz Reusswig, do Instituto de Potsdam para Pesquisa do Impacto Climático (Alemanha), avaliaram que alguns dos hábitos mais poluentes atribuídos à população masculina são motivados pelos papeis que eles cumprem na sociedade.

“No transporte, por exemplo, fazem muitas viagens em avião e automóvel, o que aumenta consideravelmente a pegada ecológica dos homens”, explicaram Corinna e Fritz ao Terramérica. Esse desequilíbrio pode ser compensado “na medida em que a igualdade de oportunidades profissionais permitirem que a mulher suba na escala profissional e os homens assumam mais tarefas domésticas”, afirmaram. Por outro lado, as diferenças na alimentação são determinantes por gênero. “Os homens tendem a comer mais carne e as mulheres mais frutas e vegetais, hábitos difíceis de serem combatidos”, acrescentaram.

Corinna e Fritz sugerem que uma política voltada à redução das emissões masculinas deve se orientar tanto para objetivos ambientais como para temas de desenvolvimento urbano, tradições profissionais e costumes arraigados. “A meta em alimentação deveria ser trocar quantidade por qualidade. Ao diminuir o consumo de carne se consegue reduzir a produção em massa e, assim, baixar as emissões de CO² emitidas pelos animais, por exemplo”, ressaltaram.

A culpa dos homens 

Frédéric comprovou que na França, apenas devido aos hábitos alimentícios, um homem é responsável pela emissão de 7,98 quilos de CO² por dia, enquanto uma mulher emite 6,79 quilos. O cientista estimou diferenças semelhantes de gênero em praticamente todas as 11 atividades analisadas. No único caso em que as mulheres provocam maiores emissões desse gás-estufa é quando realizam tarefas tradicionais em casa, como lavar, cozinhar, limpar a casa e passar roupa, segundo o estudo divulgado no dia 24 de novembro.

Por sua parte, Annika explicou ao Terramérica que a pesquisa feita com Riita apresentou como resultado que, além das diferenças substanciais entre gênero em transporte a e alimentação, o consumo de álcool e tabaco são dois fatores que aumentam as emissões sobre as quais os homens são muito mais responsáveis. “Para o estudo, examinamos o uso total de energia por família nos quatro países e depois diferenciamos os consumos individuais entre homens e mulheres por atividade”, explicou.

A atividade mais importante por suas consequências ambientais é o transporte, disse Annika. “Só neste item, os homens consomem entre 70% e 80% mais energia do que as mulheres na Alemanha e na Noruega, 100% a mais na Suécia e até 350% na Grécia”, acrescentou. Isto se explica pela utilização muito mais intensiva de automóveis individualmente por parte deles, o que representa um consumo maior de conbustível e peças de reposição, bem como mais consertos.

“Estas diferenças não são específicas dos quatro países analisados, sendo generalizadas em toda a União Europeia (UE), e têm pouco a ver com as diferentes atividades profissionais entre homens e mulheres”, disse Annika. As mulheres na UE tendem a fazer viagens mais curtas de carro, utilizar mais vezes o transporte público e concebem seus trajetos em função das necessidades de transporte de outras pessoas. Em geral, o estudo publicado em agosto de 2009 por UE e Riita mostra que os homens consomem muito mais energia do que as mulheres. As diferenças vão desde 8% na Alemanha, passando por 6% na Noruega, até 22% na Suécia e 39% na Grécia.

Como outros estudos anteriores, o destas pesquisadoras também conclui que o consumo de energia aumenta na medida em que cresce o nível de renda das famílias, e com isso também aumentam as emissões de CO² e sua contribuição individual para a mudança climática. Segundo Annika, as descobertas das duas pesquisas sugerem que os governos europeus devem focar seus esforços de redução de emissão de gases-estufa em convencer a população masculina a mudar seus hábitos de transporte e alimentação, para aumentar sua eficiência no consumo de energia nessas atividades.

* * O autor é correspondente da IPS.

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