27 de janeiro de 2010

BARULHEIRA


Por Darci Bergmann




De uns tempos para cá, está difícil freqüentar certos eventos. A animação musical já não é mais uma demonstração de arte e se transformou em barulheira, tal a intensidade dos ruídos. Alíás, a própria arte musical perde espaço para o barulho com as geringonças de amplificação sonora brilhando a todo vapor.
Como se não bastasse isso, nos bailes e outros eventos, a conversação entre as pessoas fica quase impossível. E aí mais uma vez as relações humanas sucumbem ante a imponência tecnológica imposta pela indústria do lucro, travestida de modernidade.
Quem se submete por muito tempo à tortura sonora, regada pela ingestão de álcool, talvez nem se de por conta dos malefícios de tal exposição. O dia seguinte já mostra sinais de desgaste auditivo e de outras perturbações. O zumbido característico dos ouvidos é o primeiro alarme. As crianças são ainda mais sensíveis. Os especialistas em audição alertam que os danos são acumulativos e irreversíveis em alguns casos.
Pior em tudo isso, é quando as pessoas que não estão freqüentando os eventos barulhentos são obrigadas a ouvi-los. Umas porque moram próximo e outras porque estão momentaneamente nas imediações por razões de trabalho.
Mas a barulheira não é exclusividade só dos eventos. No dia a dia das cidades a balbúrdia sonora já é corriqueira. São vendedores ambulantes de frutas, picolés e guloseimas anunciados e vendidos sem nenhum controle de higiene. Dia desses, um vendedor ambulante de abacaxi, entrou no meu estabelecimento comercial e pediu para ir ao banheiro. Depois do expediente fisiológico saiu dali sem lavar as mãos e logo em seguida pegou um abacaxi, descascou-o e saiu oferecendo às pessoas na rua uma prova do produto. Picolés, produzidos, não se sabe em que condições, são anunciados por vendedores motorizados. As autoridades sanitárias gostam muito de fiscalizar os estabelecimentos regulares, mas fazem vistas grossas para essa venda ambulante. Os consumidores incautos adquirem tais guloseimas sem saberem dos riscos que correm. Ninguém sabe que tipo de corante foi utilizado, pois alguns podem ter metais pesados altamente tóxicos. A urina dos ratos pode transmitir a leptospirose e os produtos congelados, tais como picolés e sorvetes, conservam o bacilo transmissor da doença.
A zoeira do cotidiano aumenta com a propaganda sonorizada móvel. No meu entender é uma falta de respeito ao consumidor anunciar produtos e serviços dessa forma, quando existem outras opções de publicidade. Primeiro que ninguém guarda preço de produto anunciado na rua. Segundo, todos os consumidores também estão trabalhando de alguma forma. A propaganda sonorizada móvel perturba o trânsito, que perde fluidez e com isso aumenta a poluição do ar.
Há também uma mania de exibicionismo com barulho. Fabricantes e revendedores de equipamentos de sonorização, com astúcia, inculcam nos jovens o consumismo exacerbado. E alguns de personalidade mais fraca, submetem-se à volúpia da ostentação barulhenta, no intuito de chamar atenção de alguém. Nem que para isso tenham que perturbar centenas de outras pessoas. Isso me lembra dos meus tempos de adolescente, quando os fabricantes de cigarro anunciavam os seus produtos com os artistas de cinema. Tudo com o fim de fisgar algum incauto que, uma vez viciado em tabaco, passaria anos contribuindo para o lucro crescente das empresas fabricantes e às custas da saúde do consumidor enganado.
Vivemos uma época plena de avanços tecnológicos. No entanto, é paradoxal que a espécie humana está se sentindo mais insegura. Além disso, o respeito ao semelhante e à sua privacidade parecem retroceder diante da avalanche de grosserias e do mau uso dos produtos da tecnologia. Que se busque o equilíbrio e a volta ao bom senso. O respeito entre as pessoas e dessas com a Natureza talvez seja um novo desafio nesses tempos incertos.

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