Em dezembro de 2008 escrevi um artigo sobre as enchentes do Vale do Itajaí, em Santa Catarina. Tragédias semelhantes se repetem neste início de 2010, na região Sudeste e também em boa parte do Rio Grande do Sul. Transcrevo aqui o artigo Lições de Santa Catarina, escrito em dezembro de 2008, pois expõe a problemática das ocupações desordenadas dos espaços rurais e as suas consequencias:
LIÇÕES DE SANTA CATARINA
As enchentes de Novembro de 2008 no Vale do Itajaí, em Santa Catarina, causaram comoção. As muitas vítimas fatais e os impactos sobre a economia merecem ampla análise. Opiniões à parte, desde a enchente de 1983, entidades ambientalistas propunham medidas preventivas às autoridades e à população em geral. Entidades, como a APREMAVI, de Rio do Sul e a Fundação Água Viva promoveram simpósios, encaminharam ações judiciais contra empresas poluidoras e cobraram ações das autoridades para deter a derrocada ambiental. Pressentindo uma nova tragédia, as ONGs partiram para ações práticas de reflorestamento, educação ambiental e o que fosse possível para evitar uma nova tragédia. Na obra Manejo Ambiental em Bacia Hidrográfica, de 1993, página 7, os autores Christian Guy Caubet e Beate Frank afirmam: Porém as enchentes são o mais grave problema do Vale do Itajaí. Problemática histórica, ela é hoje agravada pelas agressões ambientais observadas na região, como desmatamento, a ocupação desordenada das encostas, o crescente processo de erosão e o assoreamento das calhas dos rios ..... Mais recentemente, a proibição de exploração florestal na Mata Atlântica (Decreto presidencial nº 99.547, de 25/09/1990) veio lembrar, acertadamente, que o desflorestamento indiscriminado é uma das atividades econômicas mais importantes e que ela se efetua a montante das áreas que costumam ser inundadas. No plano regional, as violentas reações empresariais contra o decreto 99.547, simplesmente confirmaram que a economia madeireira teima em ignorar os requisitos básicos de uma exploração racional da floresta. Em outros trechos os autores falam que a extração irregular de madeira continuou, a despeito do decreto. As toras eram transportadas à noite. Elas provinham de cortes de espécies nobres como a canela sassafrás e outras. Os tocos levaram anos para se decompor e as pequenas clareiras nos morros cicatrizaram aparentemente com outras espécies ocupando os seus espaços. Mas bastariam chuvas mais intensas para que as encostas broqueadas mostrassem a sua fragilidade. As árvores antigas mantinham uma trama de raízes entrelaçadas e dificultavam o deslizamento. Agora essa trama estava decomposta e facilitou a desagregação do solo. O presidente Lula, ao sobrevoar a região, mostrou-se impressionado com o fato de que morros cobertos de mato terem sofrido tamanho deslizamento. O presidente desconhecia que a ação humana já tinha causado grande estrago na região. A Natureza tem mecanismos complexos que a racionalidade humana ignora. Quantas vezes ambientalistas são hostilizados pela opinião pública manipulada pelo discurso do progresso e geração de empregos. A própria FATMA, equivalente catarinense da FEPAM, fazia vistas grossas aos problemas ambientais como chegou a ser denunciado no Tribunal da Água – Casos e Descasos, publicado em 1994, pela Fundação Água Viva.
As áreas de preservação permanente – APP são de extrema importância para manter pelo menos parte do equilíbrio ambiental. Agora, discute-se a reserva legal, já prevista desde 1965, pela lei federal nº 4.771. O decreto que dava prazo curto para a implantação e multas altas era draconiano. Mas a pretensão de alguns em suprimi-la é um passaporte para a degradação ambiental. A reserva legal e as APP, se implantadas com apoio do governo, inclusive com remuneração pelos serviços ambientais que elas geram, são fundamentais à produção sustentável. Desde a preservação dos mananciais de água, conservação do solo, prevenção às enchentes, retenção de carbono, corredores ecológicos, etc. Prevenir ainda é o melhor remédio. Aprendamos com as lições de Santa Catarina. (Darci Bergmann, engenheiro agrônomo e presidente da ASPAN-Associação São Borjense de Proteção ao Ambiente Natural)
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