Por Darci Bergmann
Uma árvore é uma usina viva. Ela retira água do solo e a devolve à atmosfera, através dos estômatos, pequenos orifícios nas folhas. Nesse processo, ocorre a diminuição do calor pela evaporação da água, diminuindo a temperatura em torno de 15%. A copa de uma árvore intercepta em média 20% da radiação ultravioleta, aquela que pode causar câncer de pele. Ao mesmo tempo, pela fotossíntese, a árvore retira do ar o gás carbônico (CO²), fixando parte deste como constituinte do lenho e outros tecidos. As folhas e galhos sobre o solo formam uma forração natural, que absorve o impacto das gotas de chuva, mantém a umidade e melhora a infiltração de água. As raízes se aprofundam no solo, dele retirando nutrientes minerais, devolvidos em parte à camada superficial quando da queda das folhas. Estas, por sua vez, servem de alimento a uma infinidade de seres vivos, como minhocas, fungos e bactérias, num trabalho de equipe impressionante e a matéria orgânica é transformada em húmus. Uma única árvore já é uma maravilha da natureza. Que dirá uma floresta inteira, onde outras espécies vegetais e animais interagem formando um laboratório mais complexo ainda.
As florestas constituem ecossistemas de grande valor e prestam inestimáveis serviços ambientais, também no que se refere à qualidade da água. Numa floresta ou capoeira ela é retida pela estrutura de solo e matéria orgânica, é filtrada e alimenta as vertentes ou olhos d’água. Parte dessa água volta à atmosfera pela evapotranspiração e parte é acumulada nas camadas profundas do solo. É um ciclo vital para todos os seres vivos. Por desconhecimento desses serviços ambientais, nós humanos já degradamos muitos ecossistemas, a começar pelas derrubadas de matas ciliares nas margens de rios e vertentes ou mesmo no topo de montanhas e encostas íngremes. Sim, precisamos de terras para a agricultura, pastagens e expansão das cidades que parecem não ter mais limites. Mas sem água a vida não é possível.
Pois esses serviços ambientais podem se transformar em nova fonte de renda para os proprietários rurais que zelam pela Natureza. Nada mais justo. Em artigo anterior falei que os proprietários deveriam receber incentivos do Estado para a demarcação da reserva legal. Ainda deveriam receber remuneração pelos serviços ambientais que essas áreas, mais aquelas de preservação permanente (APP) prestam a toda a humanidade. Parte do que falei já vem ocorrendo em vários países do mundo. No Brasil já existem iniciativas semelhantes. Em reportagens recentes o programa Globo Rural mostrou um projeto em implantação na Serra da Mantiqueira, em Minas Gerais. Nessa área localizam-se nascentes importantes e que alimentam os rios que formam o complexo da Cantareira que abastece parte da região metropolitana de São Paulo. Os pequenos proprietários rurais demarcam e isolam áreas em torno de nascentes e rios e recebem um pagamento anual por hectare preservado. A água de boa qualidade já é uma commodity, isto é, uma matéria prima de alto valor em qualquer parte do mundo. A prefeitura de Nova York paga aos proprietários rurais que preservam os mananciais de água que abastecem a cidade. Esta água chega pura, sem nenhum tratamento nas torneiras dos nova-iorquinos.
Em Santa Catarina, havia um programa de incentivo ao reflorestamento. O governo fornecia as mudas de espécies florestais nativas e os proprietários rurais ganhavam um determinado valor em dinheiro para cada hectare cultivado. Muitas encostas íngremes que foram desmatadas e queimadas foram dessa forma recuperadas. Várias cidades no mundo já adotam incentivos a pessoas que tem responsabilidade ambiental. Em Lajeado, por exemplo, quem preserva as árvores nos terrenos recebe um abatimento no IPTU. Em São Paulo, apesar da especulação imobiliária, faz-se campanha permanente pelo verde com incentivos de toda a ordem. Quanto aos resíduos sólidos (lixo), a taxa é cobrada de acordo com o volume produzido por cada contribuinte. Esta é a cobrança justa, pois o lixo é produzido por pessoas não pelo terreno. O consumidor entra nessa cadeia, porque os seus hábitos de consumo podem influir na maior ou menor produção de lixo. O consumo responsável ambientalmente, resulta em economia de água, energia elétrica, papel, combustíveis, etc. Em todo o mundo forma-se uma tendência de incentivar as pessoas e empresas que tem compromissos com sustentabilidade ambiental. De outro lado, é punido quem degrada o meio ambiente.
Pelo que já se descortina no cenário mundial, os produtores de alimentos ou mesmo de matérias primas para a indústria que o fizerem sem o uso de agrotóxicos e com a preservação do solo e dos mananciais de água terão não só o reconhecimento da humanidade, mas igualmente serão remunerados pelos serviços ambientais que oferecerem.
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* Artigo Publicado in: Revista O Produtor, edição 04/Novembro de 2008, pg.33.
**A exemplo deste artigo que defende e mostra possibilidades de como os serviços ambientais podem se tornar fontes de renda, temos a ação política do Município de Campo Grande/MS que incentiva os moradores a adotarem medidas de proteção ambiental, concedendo-lhes descontos no IPTU e no ISS. Mais informações: Blog Antes que a Natureza Morra.
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