30 de junho de 2010

NÓS E OS BICHOS (5)


 BICHO TEM DIREITO À MORADIA



Por Darci Bergmann

 
A expansão das atividades humanas é outro fator de redução das áreas de procriação. E talvez o pior deles. Lembro-me de um documentário alemão que assisti na ETA - Escola Técnica de Agricultura, em Viamão, lá por 1969. O título do filme já dizia tudo: Kein Platz für wilde Tiere, ou Não há Lugar para Animais Selvagens. O documentário mostra a expansão da agricultura no continente africano e os impactos sobre a fauna selvagem. Situações semelhantes já tinham ocorrido em outras regiões do Planeta. No Brasil, tal expansão se deu em todo o domínio da Mata Atlântica e depois no Cerrado, Pampa e a última fronteira, a Floresta Amazônica, já está em processo de devastação. Em grande escala, a redução dos locais de procriação foi e continua sendo brutal. Até o plantio de árvores e arbustos deve ser pensado no interesse da diversidade de espécies. Plantios homogêneos e limpos reduzem a possibilidade de sobrevivência de muitas espécies. Moradia de bicho pode ser um toco, uma toca, uma fenda na rocha, uma moita ou um arbusto sem valor econômico. Até as folhas sobre o solo conferem proteção e alimento para muitos deles.

A maternidade em ambientes naturais é um direito das outras espécies



Ainda existem muitos preconceitos no inconsciente coletivo. Um deles se refere à vegetação espontânea que surge em áreas destinadas à regeneração natural. As macegas e arbustos são vistos como sujeira e na concepção de pessoas e autoridades devem ser extirpadas. Essas mesmas pessoas talvez tenham um especial carinho pelo seu cão ou gato de estimação e dispensam-lhes uma série de regalias. Mas esquecem que os matos e as capoeiras são abrigos para muitas espécies de bichos. Os bichos na Natureza apenas querem um espaço próprio livre da interferência humana. Para citar um exemplo, a maioria das aves faz seus ninhos acima do solo, entre um e quatro metros de altura. Para isso, as macegas e arbustos são fundamentais. Plantas espinhosas, impenetráveis para os humanos, constituem abrigos excelentes para algumas espécies de aves e mamíferos. Fazendo um paralelo, as pessoas isolam as suas casas dos possíveis larápios com grades de ferro, cercas elétricas e outras defesas, mas querem negar o direito de proteção aos animais num ambiente mais natural. Essa visão distorcida também impede a regeneração natural de algumas áreas degradadas. Lavouras e pastagens já degradaram muitas áreas de terras produtivas. Em alguns casos, a melhor solução é deixá-las em repouso para que a Natureza ali recomece um trabalho de regeneração. Isto pode levar muitos anos. Num primeiro momento aparecem algumas espécies vegetais rasteiras. Com o tempo arbustos e árvores. Nesses casos, algumas espécies animais já se associam ao processo e enriquecem o ambiente. Também nós humanos podemos participar, ali jogando sementes de espécies nativas da região. Aos poucos, vai se formando um ambiente mais complexo e uma verdadeira maternidade para muitos animais. Num ambiente equilibrado plantas e bichos dependem uns dos outros. Há quem afirme que uma área degradada nunca mais terá a mesma diversidade de espécies, mesmo ocorrendo a regeneração natural. Algumas espécies talvez não mais retornem a esses locais porque podem ser endêmicas de uma pequena área. Mesmo assim é preciso fazer a reversão de áreas degradadas para áreas de regeneração espontânea. Os benefícios são muitos, desde a a conservação do solo, recarga dos aqüíferos, retenção de CO² , procriação de animais silvestres, entre outros. Essa reversão será sempre mais rápida se nas proximidades ainda existirem remanescentes de vegetação natural. A maternidade em ambientes naturais é um direito das outras espécies.

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